DEPOIS DE MUITO DEBATE O T20 ESTABELECE ESTRATÉGIAS PARA O MULTILATERALISMO NAS RECOMENDAÇÕES AOS LÍDERES DO G-20
A diplomacia internacional tem como premissa que a cooperação mais estreita entre os países é a base para a superação de problemas como a fome e a pobreza e para o avanço do planeta rumo a uma nova economia de baixo carbono. Essa série de recomendações de políticas públicas divulgada pelo Comitê organizador do T20 Brasil, um dos grupos de engajamento do G20, que reúne influenciadores dos países membros. As sugestões ao bloco são o resultado do trabalho de seis forças-tarefa, ao longo dos últimos meses, envolvendo temas da agenda global como mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável, redução das desigualdades, transições energéticas e transformação digital, comércio internacional e reforma das instituições multilaterais. As conclusões serão entregues aos líderes do G20, para que possam subsidiar novas políticas públicas e decisões, fortalecendo a presidência brasileira do bloco.
O texto do “Communiqué”, documento que será entregue aos líderes do G20, diz que “A cooperação internacional para intensificar a luta contra a fome e a pobreza, acelerar transições energéticas justas, abordar a estabilidade financeira e o fardo da dívida, apoiar o espaço fiscal para investimentos relacionados ao desenvolvimento sustentável e fomentar a transformação digital inclusiva será um motor chave para o desenvolvimento econômico e social no século XXI, contribuindo para combater as desigualdades estruturais.”
A partir de agora, essas recomendações serão disseminadas, em eventos e artigos, com colaboração dos parceiros internacionais, para garantir a continuidade da abordagem dessa agenda estratégica em outros fóruns multilaterais, especialmente a COP30, no próximo ano. A hospedagem desses dois eventos é uma oportunidade para a inserção internacional do Brasil e para trazer impactos positivos e duradouros para o desenvolvimento do país. O trabalho do T20 Brasil foi coordenado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), pela Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). As recomendações baseiam-se em mais de 300 propostas por 121 influenciadores que foram analisadas, revisadas por pares e aprovadas pelas Forças-Tarefa. José Pio Borges, presidente do Conselho Curador do CEBRI, dsse que as conclusões do trabalho do T20 Brasil devem ter sinergia com as prioridades estabelecidas pelo governo brasileiro no comando do G20. “Acreditamos que promover o crescimento econômico é a estratégia mais eficaz para combater estruturalmente a pobreza e a fome a longo prazo. A necessidade de promover a descarbonização econômica e as transições energéticas deve ser vista como oportunidade, em vez de um fardo que pode potencialmente prejudicar a atividade econômica.”
Para Julia Dias Leite, diretora presidente do CEBRI, o setor privado terá papel fundamental nos investimentos em energia renovável e infraestrutura sustentável. Atrair esses investimentos depende de políticas públicas que criem um ambiente de negócios seguro. “O CEBRI espera colaborar com o debate público para que a presidência brasileira no G20 traga resultados concretos aos desafios da agenda global.” A presidente do Ipea, Luciana Mendes Santos Servo, afirmou que a alta qualidade do Communiqué é fruto de um trabalho intenso de seis meses e reflete a capacidade técnica e competência política dos especialistas que enviaram recomendações de políticas públicas: “O T20 Brasil destaca-se pela representatividade de gênero, com três mulheres na liderança do Comitê Organizador e mais de 60% das co-lideranças das forças-tarefas. Acrescenta-se a isso incluir, pela primeira vez, um subtópico de igualdade étnico-racial, entendendo assim que o combate às discriminações e desigualdades é um desafio, mas também uma oportunidade para o desenvolvimento do Brasil e do mundo.”
A embaixadora Márcia Loureiro, presidente da FUNAG, afirmou que buscaram assegurar a coerência entre os temas sob exame no T20 e a agenda mais ampla em discussão nos foros multilaterais. As instituições participantes têm presente que as deliberações do G20, que representa 85% do PIB mundial e 75% do comércio internacional, têm impacto também sobre os países não pertencentes ao grupo. A embaixadora destacou expressões que se repetem nos textos produzidos pelas forças-tarefa e que refletem questões emergentes: policrise, neoprotecionismo, finanças sustentáveis, justiça climática, saúde única, conectividade significativa, inteligência artificial centrada no ser humano: “É um vocabulário em evolução nas relações internacionais. São as novas complexidades, os nossos novos desafios.”
Helena Tenório, diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), lembrou a importância da presidência brasileira do G20 e do trabalho do T20 por apresentarem um olhar do Sul Global, dando voz a economias que normalmente são pouco ouvidas em fóruns internacionais: “O BNDES pode ser uma ponte entre a academia, os think tanks, o setor financeiro, o governo e o setor privado e é um grande executor de ideias e políticas públicas.”
No primeiro painel, “Ação Climática Sustentável e Transições energéticas” o embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima e Energia do Ministério das Relações Exteriores, chamou a atenção para os dados da Agência Internacional de Energia que mostram que os recursos necessários para o financiamento climático vão muito além dos cerca de US$ 100 bilhões anuais que vêm sendo discutido nos fóruns mundiais: “Precisamos de trilhões todos os anos. Esse alto custo não pode representar uma piora na qualidade de vida das populações.”
Céline Kauffmann, diretora de programas do Instituto para o Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (IDDRI), afirmou que a liderança do G20 abre oportunidades para debater uma taxação dos super ricos e uma reforma de bancos multilaterais e instituições financeiras, com padronização de critérios para empréstimos aos países baixa renda. Chrstian Perrone, diretor de assuntos governamentais da Microsoft, disse que a recomendação básica que o G20 pode garantir é a de criar situações onde seja possível encontrar alinhamento entre os países para uma governança, com arranjos que promovam o desenvolvimento e a inovação responsáveis e reduzam os potenciais riscos que possam existir nessa agenda.
No debate sobre Comércio Internacional e Investimento, Elisa Fraga, secretária de comércio internacional do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, afirmou que a adoção de regulamentações verdes é uma das prioridades do grupo de trabalho de comércio e investimento da pasta. Segundo ela, é uma orientação explícita da presidência brasileira trabalhar com os grupos de engajamento, sobretudo B20 e T20. Entre as prioridades, está mapear os desafios que as mulheres enfrentam no comércio internacional.mMaarten Smeets, do World Trade Institute (WTI) ressaltou as dificuldades em lidar com questões como o neoprotecionismo, que deve ser combatido. Ele afirmou que é preciso haver uma revisão dos subsídios, no nível da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Izabella Teixeira, conselheira emérita do CEBRI, participou do painel sobre o fortalecimento do multilateralismo e da governança global. Para ela, quando se discute a ordem internacional, para reformar e renovar instituições que entendem melhor como o sistema multilateral deve avançar, é preciso entender que hoje as condições são diferentes. “Não só porque o mundo mudou, mas porque a mudança climática está acontecendo. Quando discutimos esses acordos globais, era para discutir sobre as consequências no futuro. Um dos aspectos-chave do debate hoje é que colapsamos a ideia de futuro com a mudança climática. A ideia de que podemos resolver tudo acabou, porque precisamos gerenciar e consertar as coisas com a mudança climática acontecendo.”
Flora Myamba, Diretora Executiva do Women and Social Protection Tanzania (WSP), disse no painel sobre combate à pobreza, à fome e às desigualdades, que na África, a maioria das políticas e programas ainda dependem de doadores, e há vontade limitada dos governantes em comprometer recursos. “Infelizmente, raramente os países se comprometem a alocar recursos financeiros de forma sustentável para a proteção social.” Rafael Osório, do IPEA, defendeu maior investimento na qualidade dos dados em pesquisas. “Muitos países têm esses problemas [diferenças étnicas, preconceito racial e discriminação] e isso não se reflete nos inquéritos aos agregados familiares. Então são essas as desigualdades que não estamos vendo e que devemos começar a ver. Temos de começar a promover esta agenda a nível internacional.”
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