PROMESSA DE CONTRATAÇÕES DE NOVAS PLATAFORMAS POR DIRETOR DA PETROBRÁS É RECEBIDA COM DESCONFIANÇA PELO MERCADO
Ficou a um passo da provocação e do escárnio aos estaleiros nacionais e aos fornecedores da indústria naval brasileira a entrevista que o Diretor de Desenvolvimento da Produção e Tecnologia Petrobrás, Hugo Repsold (foto), deu ao jornal O Globo no último sábado (5), quando vislumbrou o que seria um mar de contratações com a construção de plataformas de petróleo. Ele disse que a companhia “Planeja ir às compras. Com a melhora de condições financeiras e a redução do endividamento, a estatal quer voltar a ter plataformas próprias e não mais alugar como tem feito nos últimos seis anos”. Depois de alguns anos de crise, ele diz que só agora “a Petrobrás começou a mapear a situação dos estaleiros brasileiros, que vivem hoje uma grave crise. O objetivo é programar encomendas de unidades necessárias para produção de petróleo a partir de 2022”.
Se só agora a companhia começou a mapear a situação dos estaleiros, talvez não dê tempo para salvá-los, porque as contratações só começariam a ser licitadas em 2019.
Mas, se a Petrobrás quisesse realmente resolver a situação e não criar um balão de ensaio num mercado já quase que completamente combalido, como está a indústria naval, seria fácil. Não precisa de muito estudo e nem de muito tempo. Com uns quatro ou cinco telefonemas para alguns estaleiros, para o próprio Sinaval que a todo momento chama atenção para os problemas que os estaleiros estão atravessando, ela teria esse mapeamento feito num piscar de olhos. Se ligasse, por exemplo, para o Estaleiro Brasa, em Niterói, no Rio de Janeiro, a empresa saberia os milhões de reais que foram investidos para se adequar a política de conteúdo nacional estabelecida como uma política de governo, quantas centenas de pessoas foram treinadas, quantos novos equipamentos foram comprados para modernização das operações. E com o Enseada, na Bahia, não seria diferente. Assim como no Inhaúma e no Eisa, no Rio. No Espírito Santo, no Paraná. Tudo isso jogado por água abaixo desde a entrada de Pedro Parente na presidência da companhia. A principal marca para este panorama foi o estabelecimento de sua política de beneficiar estaleiros chineses nas obras da Petrobrás, com a ajuda do ex-Ministro das Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, do IBP e com uma preciosa ajuda do atual diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, Décio Oddone.
O caso do polo naval de Rio Grande é emblemático. Mas se não estiver no mapeamento que Repsold comandará para traçar um perfil da situação, nós podemos ajudar nas memórias, repetindo o que temos dito aqui: hoje não há mais um estaleiro em funcionamento naquela região. O QGI enviou os módulos que estava fazendo para a China, onde serão montados nas Plataformas P-75 e P-77. No meio do ano, uma delas chega ao Brasil. No segundo semestre, chegará a segunda plataforma. Todos os estaleiros estão parados. O EBR entregou a P-74, demitiu todo mundo e fechou. O QGI, que mandou os módulos para integração na China, está demitindo. O Estaleiro Rio Grande é a cereja de um bolo que ainda se espera muitas explicações, mesmo que sejam na área do Ministério Público ou da Polícia Federal. A Petrobrás jamais explicou as razões de mandar cortar duas plataformas prontas e vende-las como sucata quando já estavam prontas para serem montadas no estaleiro Rio Grande. O pátio do estaleiro ainda está lá, com milhares de toneladas de aço espalhados pelo seu canteiro. Em dezembro de 2016, o estaleiro fechou e demitiu de uma vez só 4.200 trabalhadores. A cidade de Rio Grande vive um desespero. O prefeito não tem como pagar os funcionários públicos da cidade. A arrecadação da cidade já caiu mais de 50 milhões de reais. A violência está alcançando níveis quase incontornáveis. Sobra desempregados. Em uma cidade pequena, que era próspera, o risco de virar tapera é muito grande. Esse legado, essa medalha de desonra, Pedro Parente tem que que pendurar no seu paletó.
Hugo Repsold disse na matéria que ainda não há definição sobre o número de embarcações que a estatal pretende adquirir, mas a construção total ou parcial das unidades no país deve ter impacto na economia e na indústria naval: “Nossa meta é reduzir a dívida da companhia, ter um bom fluxo de caixa ano que vem e então vamos voltar a fazer unidades próprias.” O Sinaval revela que de 2014 para 2018, 20 estaleiros fecharam as portas, levando junto 50 mil empregos. Atualmente, estão em operação apenas 32 estaleiros, contra os 52 que existiam em 2014. A indústria emprega hoje 30 mil trabalhadores. Já chegou a ter 82 mil. Mesmo assim, a maior parte das instalações não sofreram um desgaste grande e novas contratações podem reavivar o setor. A mão de obra ainda não está degradada e pode ser treinada rapidamente. Esse mapeamento não será difícil nem longo e, neste aspecto, o Sinaval, sem dúvida, pode ajudar.
A chave, segundo Repsold, será a competitividade: “A Petrobrás não vai arcar com ineficiência ou pagar uma diferença para compensar ineficiência ou dificuldade que exista neste setor no país. A indústria tem de atingir um grau de competitividade para disputar em igualdade de condições com outros países”. Só não combinou com os russos. A carga tributária altíssima no Brasil, a diferença cambial, salários, garantias trabalhistas e garantias de QSMSRS que a Petrobrás não exige nas obras na China, são cobradas aqui com veemência aos empresários. O não cumprimento do menor item do contrato, mesmo que a responsabilidade maior seja da própria Petrobrás, reverte-se em multa. Muitas vezes pesadas, que inviabilizam os resultados das obras. Infelizmente esta é a realidade do mercado. Uma realidade muito dura que centenas de empresas estão enfrentando com a expectativa imediata da retomada dos negócios na indústria do petróleo. Com a tendência de alta nos preços do petróleo é quase injustificável que a Petrobrás não dê alguns passos concretos para frente. Um balão de ensaio vendendo um otimismo que não se sustenta é tudo que os empresários brasileiros não precisam neste momento de crise profunda.
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