IPEN INTEREDITA SUAS LINHAS DE PRODUÇÃO DE RADIOFÁRMACOS POR FALTA DE PESSOAL
A direção do IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares – divulgou nota oficial sobre a interdição na produção de kits liofilizados e radiofármacos produzidos com Flúor-18 no Centro de Radiofarmácia. O grande desafio é a necessidade de pessoal. Já foram mais de dois mil servidores e hoje tem pouco mais de setecentos. Pesquisadores, técnicos e demais servidores se aposentaram e não houve renovação por falta de concursos públicos para repor as vagas. O cenário parece ser bem grave. Veja a nota oficial na íntegra, assinada por Wilson Calvo(foto), Superintendente do IPEN:
“ Iniciada há 60 anos, a produção de radiofármacos no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), do MCTIC tem papel decisivo no desenvolvimento da Medicina Nuclear no Brasil, o que é amplamente reconhecido nacional e internacionalmente. A produção de radiofármacos pelo IPEN-CNEN/SP contempla 38 produtos, responsáveis por 1,6 milhão de procedimentos em diagnósticos e terapias anuais, os quais são distribuídos aos serviços de Medicina Nuclear, em mais de 430 centros diagnósticos (clínicas e hospitais) de todo o País. Estimam-se 40 milhões de procedimentos já realizados no País, com radiofármacos fabricados no Instituto. Uma característica particular das instalações do Instituto é a produção de um grande número de radiofármacos distintos, em quantidades necessárias ao atendimento da demanda nacional. Essa diversidade resultou do dinamismo no provimento à Sociedade Brasileira dos radiofármacos já utilizados nos países mais desenvolvidos, o que permitiu à Medicina Nuclear do País uma posição destacada internacionalmente.
Após a publicação das Resoluções RDC 63 e RDC 64 de 2009 da ANVISA, que tratam, respectivamente, das Boas Práticas de Fabricação (BPF) e Registro de Radiofármacos, o IPEN-CNEN/SP concentra esforços e compromisso institucional na obtenção da Certificação em BPF, das linhas de produção dos radiofármacos. O planejamento envolve 2 (dois) desafios principais, relacionados à reforma das instalações de produção e ao provimento de funcionários capacitados para a implantação e manutenção do Sistema de Garantia da Qualidade e todos os requisitos de BPF.
Nos últimos anos, o IPEN-CNEN/SP tem passado por inspeções sanitárias regulares para verificação das BPF, em atendimento à RDC 63 de 2009 e RDC 17 de 2010, das quais participam as 3 (três) instâncias sanitárias: COVISA, CVS-SP e ANVISA. Duas linhas de produção de radiofármacos foram foco das inspeções. A linha de produção de “componentes não radioativos para marcação com componente radioativo”, representada por pós liófilos para uso injetável, conhecidos como “kits liofilizados para marcação com tecnécio-99m”, sendo que o Instituto produz 14 produtos nesta categoria. A segunda linha inspecionada corresponde à de produção de moléculas marcadas com flúor-18, incluindo os radiofármacos fluordesoxiglicose (18F-FDG) e fluoreto de sódio (18F).
Na última inspeção, ocorrida de 29 a 31/01/2018, a equipe inspetora considerou “a inefetividade das medidas envolvendo contratação de funcionários para o Instituto, mesmo após todas as tentativas e orientações anteriores, sendo que este quesito é um item basal para as demais atividades e efetivo cumprimento das BPF”, e intimou o IPEN-CNEN/SP a apresentar uma ação efetiva e concreta, referente à composição do corpo técnico capacitado de trabalho, bem como uma estrutura mínima que tenha capacidade de executar e fazer cumprir as BPF, estabelecendo um prazo de 90 dias. Decorrido este prazo, o Instituto protocolou junto à COVISA em 27/04/2018 documentação que traduzia os esforços do Instituto para mitigar a falta de mão de obra qualificada
Em 18/05/2017 representantes do IPEN-CNEN/SP foram convocados a comparecer à sede da COVISA, para tomar posse do Relatório SIVISA 3667/18 e Ata da Reunião, além dos seguintes termos: a) Auto de imposição de penalidade série H/no 014371; b) Auto de imposição de penalidade série H/no 014372 e Termo de Interdição de Estabelecimento Parcial Série E/no 03343, por meio dos quais determinou-se a interdição para a fabricação das linhas de produção dos kits liofilizados e das moléculas marcadas com flúor-18, para fins comerciais.
Diante de tal situação, cumpre ao IPEN-CNEN/SP alertar a ANVISA sobre o grave risco iminente de desabastecimento do mercado, principalmente no caso dos kits liofilizados e, principalmente, a falta de atendimentos à população Brasileira. Dos 14 (quatorze) produtos desta linha, 9 (nove) são produzidos exclusivamente pelo Instituto. Ressalte-se, adicionalmente, que a demanda dos clientes pelo Kit liofilizado MDP (aplicação diagnostica em cintilografia óssea), apresentou um incremento significativo nas últimas semanas, tendo em vista que outro fornecedor privado do mercado nacional foi impedido de comercializar este produto. Neste sentido, o Instituto ampliou nas últimas semanas o número de lotes produzidos do MDP e estudava a possibilidade de discutir com a ANVISA alternativas para evitar o desabastecimento do mercado, tal como, a obtenção de autorização para importação emergencial e temporária deste produto, até que o IPEN-CNEN/SP pudesse absorver toda a demanda do mercado.
A recente interdição da linha de produção de kits liofilizados do IPEN-CNEN/SP potencializou este problema e sinaliza para o desabastecimento do mercado nacional, não somente do produto MDP, mas também daqueles 9 (nove) produzidos exclusivamente pelo Instituto. O IPEN-CNEN/SP possui estoque limitado destes reagentes liofilizados, para atendimento da demanda dependendo do produto. Especificamente quanto ao produto MDP, o Instituto possui uma demanda reprimida de pedidos de mais de 900 kits.
Informações fornecidas pelo Dr. Juliano J. Cerci – Presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN): “estima-se que no Brasil a economia da medicina nuclear gire ao redor de R$ 1 bilhão ao ano e sejam realizados 1,6 milhões de procedimentos de cintilografias anualmente, sendo destes 450 mil dedicados a pacientes do sistema único de saúde (SUS) e outros 1,2 milhões para pacientes da saúde suplementar. Ainda segundo a SBMN, a iniciativa privada corresponde a uma pequeníssima parcela (menor de 10%) do mercado brasileiro de medicina nuclear, não tendo condições de suprir minimamente a demanda nacional de radiofármacos”.
Em 2017, o IPEN-CNEN/SP comercializou 19.119 kits liofilizados, distribuídos entre os 14 (quatorze) produtos. A comercialização dos geradores de molibdênio-99/tecnécio-99m (99Mo-99mTc) produzidos no Instituto, carro-chefe da produção de radiofármacos e da rotina diária dos serviços de Medicina Nuclear, está diretamente relacionada à utilização dos reagentes liofilizados, já que a grande maioria dos procedimentos diagnósticos em Medicina Nuclear utilizando o radionuclídeo tecnécio-99m, prevê a marcação de kits liofilizados, disponibilizando radiofármacos para diferentes aplicações diagnósticas. Desta forma, o desabastecimento do mercado dos reagentes liofilizados deverá refletir na comercialização dos geradores de 99Mo-99mTc.
Com relação à linha de produção de radiofármacos de flúor-18, também interditada, o IPEN-CNEN/SP reconhece a existência de outros fornecedores, tanto da própria CNEN (CDTN/Belo Horizonte) como da iniciativa privada (diversas unidades de produção no País), que poderiam absorver a demanda do Instituto para o radiofármaco fluordesoxiglicose (18F). Mas, espera retomar o convênio com a Secretaria de Estado da Saúde para fornecimento deste produto, de forma subsidiada, para atendimento exclusivo de pacientes do SUS, fato que reforça a importância da retomada da produção deste produto por parte do IPEN. Entretanto, atualmente, o IPEN-CNEN/SP é o único produtor do radiofármaco fluoreto de sódio (18F). O Instituto distribui este radiofármaco para 10 (dez) serviços de Medicina Nuclear localizados em São Paulo, Campinas, Porto Alegre e Goiânia. Em 2017, o IPEN-CNEN/SP distribuiu 527 doses deste radiofármaco (1 dose/procedimento diagnóstico). A interrupção da linha de produção de moléculas marcadas com flúor-18 acarretou o imediato desabastecimento deste radiofármaco, a partir de 21/05/2018, tendo em vista a característica de meia vida curta do radioisótopo flúor-18 (110 minutos), que impõe a produção diária do produto, não havendo, portanto, lotes em estoque.
Conforme manifestação do presidente da SBMN, Dr. Juliano J. Cerci, com relação à qualidade dos produtos fornecidos, “o IPEN ao longo de muitos anos foi único fornecedor de matérias primas e insumos para toda medicina nuclear brasileira e ainda exerce um papel essencial, sendo o único produtor e fornecedor da grande maioria destes liofilizados. Durante todo esse tempo sempre prestou excelentes serviços à população brasileira, sem que houvesse sequer um registro de intercorrências, de quaisquer natureza, envolvendo seus produtos. Esses liofilizados, juntamente com os geradores de tecnécio e os isótopos de meia vida curta baseados em flúor-18 constituem a espinha dorsal dos insumos necessários a realização da quase totalidade dos procedimentos na vasta maioria dos serviços de medicina nuclear por todo país”.
Recentemente, em reunião com a Direção (Dra. Daniela Marreco Cerqueira – Assessora do Gabinete do Diretor Presidente/GADIP) e as Gerências da ANVISA no MCTIC, coordenada pela Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento da CNEN, em 24/04/2018, acordou-se firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MCTIC e o MS. A proposta do TAC está em elaboração no IPEN-CNEN/SP e será encaminhada à CNEN, com a maior brevidade possível, em atendimento ao prazo acordado na reunião com a ANVISA, de 15/06/2018.
Ainda com relação às reformas para adequação da infraestrutura de produção, necessárias ao registro dos 38 produtos e obtenção do Certificado de Boas Praticas de Fabricação (CBPF) para as linhas de produção de radiofármacos do IPEN-CNEN/SP, há investimento orçamentário da CNEN/MCTIC e, principalmente, do MS (Secretária de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos) com R$17,6 milhões aportados e previsão de mais R$50 milhões na modernização de 3 (três) alas de produção, além dos R$13,6 milhões já aprovados pela FAPESP para P&D em novos radiofármacos.
No que diz respeito à contratação de funcionários para o Instituto, quesito considerado “um item basal para as demais atividades e efetivo cumprimento das BPF”, de acordo com a COVISA, o IPEN encaminhou à CNEN e ao MCTIC demanda de 465 para concurso público. Também está em avaliação o “Novo Modelo de Gestão” para o Centro de Radiofarmácia, imprescindível à manutenção da produção de radioisótopos e radiofármacos no IPEN.
Diante deste quadro, e com o histórico de sucesso da produção e distribuição de radiofármacos pelo IPEN-CNEN/SP, associado aos esforços reais que vêm sendo realizados para adequação de infraestrutura e procedimentos, bem como para composição do quadro de servidores e colaboradores, o IPEN-CNEN/SP acredita e busca sensibilizar fortemente a autoridade sanitária, no sentido de conceder autorização para retomar a produção das linhas interditadas, principalmente para aqueles radiofármacos que são de produção exclusiva do Instituto.”
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