DE OLHO EM NOVAS USINAS, SETOR NUCLEAR BRASILEIRO ANUNCIA AÇÕES PARA TRANSFERÊNCIA DE CONHECIMENTO
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
A indústria nuclear brasileira se movimenta e dá novos passos para preservar e transferir conhecimentos fundamentais para os profissionais mais jovens do setor. O objetivo é manter vivo todo o acervo intelectual do segmento, mas vai além disso. O Brasil tem pela frente um plano de construir até 10 GW de novas centrais nucleares até 2050, fora outros projetos igualmente importantes – como a expansão da nossa capacidade de enriquecimento de urânio. As novas iniciativas de empresas brasileiras na gestão de seus recursos humanos foram apresentadas nesta semana durante o simpósio virtual organizado pela Seção Latino-Americana da Sociedade Nuclear Americana (LAS/ANS). A Eletronuclear, por exemplo, vê o tema como fundamental para dois de seus principais projetos em andamento: a retomada das obras de Angra 3 e a extensão da vida útil de Angra 1.
O presidente da empresa, Leonam Guimarães, participou do simpósio e relatou como a companhia tem vivenciado o tema da gestão de recursos humanos. Prestes a retomar as obras da usina de Angra 3, paralisadas desde 2015, a Eletronuclear acredita ser crucial a passagem de conhecimento para montar o grupo que irá operar a planta. “Dentro do tema da retomada das obras, é de fundamental a estruturação da futura equipe de operação dessa usina, que também se converte em uma questão na qual a gestão de conhecimento é de fundamental importância”, afirmou Guimarães durante o evento.
Além de Angra 3, a transferência intelectual também tem reflexos nos planos de extensão da vida útil de Angra 1. O prazo atual da licença da planta termina em 2024, mas a Eletronuclear já está fazendo o licenciamento para que esse período seja ampliado em mais 20 anos. Para o presidente da companhia, a extensão da vida útil de uma usina nuclear é um tema de grande relevância fundamentado na gestão do conhecimento. “Estamos vivendo essa gestão inserida dentro do contexto da extensão da usina de Angra 1. É um desafio bastante importante que estamos buscando vencer”, explicou.
Olhando para o futuro, a Eletronuclear também quer fazer a transferência de conhecimento entre as suas gerações de colaboradores de uma forma mais orgânica, especialmente no que se refere à extensão da vida útil da sua segunda planta na central nuclear de Angra dos Reis. “Estamos trabalhando com maior antecedência para extensão de Angra 2, para que essa transferência de conhecimento intergeracional se dê uma maneira mais sistematizada e estruturada do que tem sido feito para Angra 1”, afirmou.
Enquanto isso, em outro elo do setor nuclear, a Indústrias Nucleares do Brasil (INB) também dá seus primeiros passos no sentido de preservar todo o seu importante acervo intelectual. A companhia guarda em suas mãos uma complexidade muito grande de conhecimentos, já que atua desde a mineração até o enriquecimento de urânio e fabricação de elementos combustíveis. Por isso, desde 2018, o planejamento estratégico da companhia passou a entender toda essa riqueza de informações como um valor estratégico. Assim, a empresa montou um projeto naquele ano para elaborar uma estrutura de funcionamento da gestão do conhecimento e criar um plano de ação para consolidar essas ações.
As iniciativas da INB nesse sentido foram apresentadas durante o simpósio da LAN/ANS por Cicilia Silveira, da Gerência de Recursos Humanos da empresa. Ela explicou que foi feito um mapeamento de conhecimentos críticos, que foi divido em três etapas. Na primeira delas, foram identificados os principais processos de uma das unidades da empresa. A segunda etapa levantou os conhecimentos críticos mais relevantes para os processos verificados na etapa anterior. A terceira etapa foi a elaboração de um plano de transferência de conhecimentos.
“Identificamos que depois do desligamento de funcionários, existiam muitos empregados para serem desligados a curto e médio prazo. Isso é muito urgente para a empresa”, avaliou Cicilia. “Em algumas situações, identificamos que processos importantes ainda não tinham instruções e procedimentos bem detalhados. Identificamos também a ausência de uma política de preparação de substitutos para ocupações críticas”, acrescentou. Baseado nesse mapeamento de conhecimentos críticos, a INB estruturou o processo de transferência de conhecimento entre seus funcionários.
Cicilia citou ainda um dos exemplos de como a INB vem trabalhando essa transferência dentro da área de manutenção dos equipamentos da Fábrica de Combustível Nuclear, em Resende (RJ). “É uma área onde precisamos desenvolver muito os profissionais para atuar, porque são equipamentos super diferenciados”, frisou. “Mapeamos que o conhecimento crítico é a manutenção dos equipamentos de reconversão e pastilha. Então, durante reuniões do plano de transferência, optamos por práticas de mentoring. Foi definido que diariamente nessas práticas de mentoring seriam feitos diários da manutenção. E no final desse processo, estabelecemos que haveria a construção de uma instrução de trabalho com vídeos e fotos de passo a passo bem mais detalhados”, explicou.
A transferência de conhecimento na INB é importante porque a empresa terá pela frente importantes trabalhos. Um deles é a expansão da Usina de Enriquecimento Isotópico de Urânio. Na primeira etapa de ampliação da unidade, a previsão é que até 2021 a planta tenha dez cascatas de ultracentrífugas. Assim, a usina seria capaz de atender 80% da demanda de urânio de Angra 1.
A questão da gestão de recursos humanos dentro do setor nuclear já era uma preocupação há certo tempo dentro da indústria. Por isso, representantes desse segmento sempre apontaram que este era um tema que merecia receber atenção. O presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento para Atividades das Indústrias Nucleares (ABDAN), Celso Cunha, lembrou que a indústria nacional brasileira perdeu muitos profissionais, já que muitos se aposentaram e saíram do segmento. Ele frisou ainda que a reposição de mão de obra não aconteceu.
“Agora, temos uma sinalização de avanço de resposta rápida de crescimento do setor. Precisamos correr muito para aumentar o nível de formação de mão de obra. Isso requer fazer a transferência de conhecimento”, alertou. Para Cunha, esse não é um processo rápido, que acontece da noite para o dia. Por isso, a ABDAN apoiou o evento da LAS/ANS, que foi totalmente dedicado a esse assunto. “Sem mão de obra, não executaremos. E o Brasil está planejando muita coisa para o futuro”, finalizou.
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