ELETRONUCLEAR PLANEJA ASSINAR EM 2025 O CONTRATO PARA RETOMAR ANGRA 3 E ESTÁ PERTO DE CONSEGUIR EXTENSÃO DE ANGRA 1
O grande dia D do setor nuclear brasileiro está cada vez mais próximo. A data 4 de dezembro está grifada na agenda de todos os executivos e profissionais do segmento, à espera de uma decisão aguardada há quase 10 anos: a retomada das obras de Angra 3. Será nesse dia que o destino do empreendimento será selado em uma reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Aguardando esse desfecho, a Eletronuclear já adiantou tudo o quanto pôde para que, após a decisão do CNPE, possa reiniciar o quanto antes a obra – paralisada desde 2015. Em entrevista exclusiva ao Petronotícias, o presidente da empresa, Raul Lycurgo, lembra que serão necessários R$ 23 bilhões para concluir a planta – sendo que 90% desse valor virá de um financiamento de um consórcio de bancos. Caso o CNPE decida pela continuidade de Angra 3, a Eletronuclear prevê realizar, no primeiro semestre do ano que vem, a licitação internacional para contratar o consórcio EPCista responsável por finalizar a obra. Já a assinatura com o vencedor da concorrência deverá ocorrer no segundo semestre de 2025. Assim, será possível entregar a usina até o início de 2031. Lycurgo também explica os riscos e prejuízos de abandonar a construção de Angra 3 e defende a elaboração de um novo marco legal que permita a entrada de parceiros privados em futuras novas usinas. Por fim, o entrevistado traz atualizações sobre a extensão da operação de Angra 1 por mais 20 anos, cuja licença pode ser emitida até meados de dezembro.
Vamos começar nossa entrevista falando sobre Angra 3. O CNPE deve decidir em dezembro sobre a continuidade ou não da obra. Gostaria que relembrasse aos nossos leitores os custos previstos para concluir o projeto.
O recente estudo entregue pelo BNDES apontou que o custo para concluir a usina será de R$ 23 bilhões. Deste total, cerca de 10% – aproximadamente R$ 2,3 bilhões – serão pagos com equity, ou seja, capital dos acionistas. Os outros 90% serão financiados por um consórcio de bancos, composto por instituições nacionais e internacionais. O modelo proposto pelo BNDES deixa claro que não será um único banco responsável pelo financiamento, mas sim um pool de instituições financeiras. Esse financiamento será diluído ao longo de um período entre 16 e 20 anos, começando a partir do início da operação do empreendimento, previsto para o final de 2030 ou início de 2031.
Em contrapartida, segundo o BNDES – que é o maior especialista em projetos complexos no Brasil –, abandonar Angra 3 resultaria em um custo estimado de R$ 21 bilhões.
Ou seja, uma leitura desses números indica que a melhor escolha para o país seria a conclusão da obra…
Exatamente. Optar pela conclusão da usina terá um custo de R$ 23 bilhões, que será pago pela Eletronuclear por meio de um financiamento de longo prazo. Nesse cenário, Angra 3 vai gerar receita com a venda de energia e contribuirá para a resiliência do sistema elétrico brasileiro, adicionando 1,4 GW de energia firme na base.
Já no segundo cenário, caso a obra seja descontinuada, o país não terá esse 1,4 GW de energia firme, que terá de ser substituído por uma fonte térmica mais poluente. Além disso, os R$ 12 bilhões já investidos pela Eletronuclear no projeto entre 2009 e 2023 serão enterrados. Não para por aí: como mencionei antes, ainda haverá o custo de R$ 21 bilhões, que não trará qualquer retorno para a sociedade. Infelizmente, como não existem recursos na Eletronuclear para arcar com valor, mesmo que no curto ou médio prazo, essa dívida inevitavelmente recairá sobre os acionistas – ou seja, a União, que é o acionista controlador da empresa. Esse é o cenário que queremos evitar.
Muitos opositores em relação ao projeto apontam para o custo de terminar Angra 3 ou alegam que a usina estaria obsoleta. Como o senhor rebate essas críticas?
De forma alguma a usina será obsoleta. Hoje, há mais de 12 mil equipamentos no sítio prontos para instalação, todos submetidos a um rigoroso controle de manutenção. Além disso, os sistemas de controle, supervisão e monitoramento, que ainda não foram adquiridos, serão de última geração, alinhados às tecnologias mais modernas disponíveis no mercado. Eles serão comprados conforme avançarmos na obra da usina.
Por conta disso, embora Angra 2 e Angra 3 sejam usinas quase gêmeas univitelinas, o operador de Angra 2 não poderá operar Angra 3 sem passar por um treinamento específico. O objetivo inicial da empresa era construir duas usinas idênticas, com o mesmo centro de controle, o que permitiria maior otimização de recursos. No entanto, isso não foi possível. Mesmo assim, esperamos que quando for necessário estender a vida útil de Angra 2, seja possível ter as duas usinas operando exatamente iguais.
Imaginando que a reunião do CNPE decida pela continuidade das obras de Angra 3, quais seriam os próximos passos?
Estamos adiantando algumas etapas importantes. Como é de conhecimento do mercado, publicamos as minutas do edital e do contrato e as submetemos à audiência pública no primeiro semestre de 2024. Essa preparação é essencial para que, assim que o CNPE conceder o seu aval, a Eletronuclear possa encaminhar as minutas ao Tribunal de Contas da União (TCU), que será responsável por validar todo o processo.
Com isso, estaremos prontos para realizar, ainda no primeiro semestre de 2025, a licitação internacional para contratar o consórcio EPCista responsável por concluir a obra. Nossa expectativa é assinar o contrato com esse consórcio no segundo semestre de 2025 e, em seguida, retomar as obras, que deverão durar cerca de cinco anos. Dessa forma, projetamos que a usina esteja pronta entre o final de 2030 e o início de 2031.
Agora, gostaria de mudar de assunto e falar sobre Angra 1. Como está o andamento do processo para prorrogação da licença da usina por mais 20 anos?
O processo de prorrogação da licença de Angra 1, como você sabe, é complexo e envolve investimentos ao longo de quatro anos. Não faremos toda a modernização de uma só vez; ela será realizada de forma escalonada, durante as paradas programadas entre 2025 e 2028. Por exemplo, em 2025 teremos uma parada de aproximadamente 70 dias, que ocorrerá entre março e maio. Para essa primeira fase de modernização, todos os investimentos necessários já foram contratados em 2024. Conseguimos garantir os recursos realizando uma captação bem-sucedida no mercado.
Até o momento, tanto o Ibama quanto a CNEN têm feito sinalizações positivas. Há cerca de 40 dias, a CNEN sinalizou de forma extremamente favorável, indicando que a licença para a extensão da operação de Angra 1 por mais 20 anos deve ser concedida em dezembro, considerando todo o programa de investimentos apresentado pela Eletronuclear. Ainda existem trâmites internos na CNEN a serem cumpridos, mas essa sinalização foi muito importante. Tudo está bem encaminhado e isso nos permite avançar na captação de recursos de longo prazo para financiar as etapas seguintes.
Por fim, quais são suas expectativas com o setor nuclear brasileiro?
O Brasil possui a sexta ou sétima maior reserva de urânio do mundo, considerando os estudos realizados na década de 1970, com apenas um terço do território nacional prospectado. Imagine as novas reservas que podemos identificar hoje, utilizando tecnologias mais avançadas. Isso evidencia o enorme potencial que temos para explorar essas riquezas.
Atualmente, diversos países estão anunciando planos de expansão da energia nuclear. Esse movimento vai gerar uma demanda crescente por combustível nuclear. O Brasil, com suas vastas reservas de urânio, não pode se limitar a exportar apenas commodities. Precisamos trabalhar para nos tornarmos exportadores de combustível nuclear, um produto de alto valor agregado. Essa é uma nova fronteira que devemos explorar.
Além disso, o Plano Nacional de Energia (PNE) projeta a construção de 8 GW a 10 GW de novas usinas nucleares até 2050. Isso significa multiplicar por cinco a nossa capacidade atual (2 GW), considerando Angra 1 e Angra 2. Vale lembrar que cada usina nuclear leva cerca de sete anos para ser construída, e temos apenas 25 anos para alcançar essa meta. Para viabilizar essa expansão, será indispensável a criação de um novo marco legal que permita atrair investimentos e estruturar melhor o setor.
Por quê?
A Eletronuclear estará comprometida com Angra 3, tanto em termos de pessoal quanto financeiramente. Por isso, acredito que, sendo intelectualmente honesto, se queremos atingir a meta de 8 GW a 10 GW de novas usinas até 2050, é indispensável a criação de um novo marco legal, com a participação da iniciativa privada para auxiliar nesse esforço.
Os investimentos em infraestrutura nuclear são significativos e demandam volumes altíssimos de recursos. Cumprir as metas do PNE 2050 exige planejamento, compromisso e, sobretudo, um ambiente regulatório adequado para atrair capital. Como gestor, não aceito que o PNE seja tratado como uma peça de ficção. Ele precisa ser uma diretriz real que devemos mirar para garantir a segurança energética do Brasil.
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