GOVERNO ESPERA CUMPRIR AGENDA DE LEILÕES EM 2017 E VÊ QUEBRA DO CONTEÚDO LOCAL COMO BENÉFICA PARA O PAÍS
Por Daniel Fraiha e Davi de Souza –
Uma das mudanças importantes recentes no setor de óleo e gás é o direito de a Petrobrás ter a preferência na escolha de áreas do pré-sal. O presidente da estatal, Pedro Parente, disse esta semana que a empresa vai exercer essa prerrogativa nos próximos leilões. Agora, o governo discute a regulamentação do tema, conforme explicou o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), Paulo Pedrosa, em conversa com jornalistas após evento no Rio de Janeiro. Segundo ele, o direito de preferência deve ser respeitado, mas ao mesmo tempo sem prejudicar o interesse das receitas do governo nos leilões. Sobre a questão do conteúdo local, Pedrosa disse que a decisão do governo de diminuir as exigências foi pensando no “interesse na coletividade do País“, mesmo que a posição escolhida pelo Planalto tenha contrariado toda a cadeia nacional de fornecedores, favorecendo apenas um pequeno grupo de petroleiras representadas pelo Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP). O secretário ainda afirmou que a expectativa do governo é de cumprir integralmente seu cronograma de licitações deste ano. Pedrosa também revelou que os ministérios de Minas e Energia e da Fazenda estão finalizando o decreto que irá detalhar a visão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) sobre a revisão dos cálculos dos royalties.
Sobre o setor elétrico, o membro do MME destacou que o BNDES está trabalhando para fazer a modelagem da privatização das empresas distribuidoras da Eletrobrás. “Essa não é uma venda que tem objetivo de arrecadar. Objetivo de arrecadar é absolutamente secundário. O objetivo é tirar o problema da Eletrobrás e melhorar a qualidade de atendimento“, afirmou. O Petronotícias traz os destaques da conversa do secretário com jornalistas.
CONTEÚDO LOCAL, RODADAS DA ANP E ROYALTIES
O presidente da Petrobrás, Pedro Parente, disse que a estatal pretende exercer o direito de preferência nos leilões de partilha da produção no pré-sal. Como o governo encara isso?
Primeiro, a legislação deu à Petrobrás essa prerrogativa. Agora, a lei do direito de preferência precisa ser regulamentada. Não há clareza absoluta de como seria esse direito de preferência. Então o governo está discutindo essa regulamentação.
E como seria essa regulamentação? Haveria um limite de áreas onde a Petrobrás poderá ter direito de preferência?
No extremo de maior limitação, a Petrobrás teria que exercer o direito uma única vez e antes das definições finais. Na prática isso limitaria muito o direito de preferência.
Antes de quais definições finais?
De preço. O bônus de assinatura. A Petrobrás pode, nesse caso, dizer que não pode preferir algo se não souber o resultado final. Ela vai saber de que áreas está tratando, mas a discussão é: como lidar com o direito de preferência? Há interpretações de que o direito de preferência fica muito reduzido e limitado e há outras interpretações que o direito de preferência possa ser usado pela Petrobrás em todos os casos e depois a estatal pode “deixar de preferir”, em ordem de rentabilidade, para ficar com os projetos mais rentáveis. Esse seria o extremo oposto, algo que a Petrobrás nunca teve.
A linha é explorar essas possibilidades. Como tudo na vida, o governo vai ter que encontrar nesse processo, e em um prazo curto, como será regulamentado o direito de preferência da Petrobrás. Primeiro, temos que reconhecer que a lei deu um direito de preferência e que deve ser respeitado. Ele não pode ser neutralizado na regulamentação. Mas, de outro lado, entendendo que esse direito não poderia ser algo que prejudique o próprio interesse das receitas do governo nas licitações.
Mas em cima de uma fala do Parente, onde ele diz que vai exercer, em tese, o direito de preferência em todas as áreas, como o governo vai lidar com essa posição?
O presidente da Petrobrás, dentro das regras do modelo de governança, vai exercer o direito dele no que for melhor para a empresa. E o governo vai criar as regras de forma que a Petrobrás tenha o direito dela reconhecido, mas ao mesmo tempo que os interesses da União sejam levados em conta.
Sobre as mudanças no conteúdo local, foi uma visão predominante de oito ou nove petroleiras, diante de 200 mil empresas que estavam unidas querendo garantir um fornecimento mínimo de bens. Quais foram os argumentos que levaram o governo a tomar a decisão da quebra de conteúdo local?
Eu acompanho isso no plano geral, não participei dos detalhes. Mas a visão estratégica do governo é clara. Não se trata de uma escolha que o governo fez entre um grupo e outro. O governo está olhando para o país como um todo e a área de óleo e gás, se o Brasil for competitivo frente aos outros países que estão oferendo áreas aos investidores globais, vai ser importante para a retomada de investimentos e geração de emprego no Brasil. A visão do governo é de interesse na coletividade do País. E não de um segmento ou de outro. Uma visão muito clara é de que, até mesmo para os fornecedores, você ter um percentual muito menor de um negócio muito maior será melhor.
Mas em alguns casos será 0% de participação. A Petrobrás pediu isenção de 100% de conteúdo local para o FPSO de Libra…
Não é a visão do governo. A solução que foi apresentada teve a participação do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), Ministério da Fazenda e da Casa Civil. E na visão do governo, essa solução representa o melhor para o País e para o segmento produtor.
Todas as entidades de classe e federações das indústrias de diversos estados se uniram com o movimento sindical, algo inédito, se posicionando contra a quebra do conteúdo local. E só quem era favorável era o IBP e as petroleiras…
Os segmentos se articulam e atuam para buscar seus interesses. Por exemplo, o produtor de eólica quer que o governo faça um leilão de 3.000 MW por ano, o que para o segmento é muito bom. Agora, o governo, como governo, tem que olhar para a economia como um todo. As decisões não são fáceis. É o interesse localizado de curto prazo e o interesse distribuído de longo prazo. Esse é o choque geral e as decisões de governo se tomam como base, arbitrando entre essas duas condições. O governo entende que tomou a melhor decisão possível no equilíbrio desses interesses.
Dentro desse debate, os únicos que defendiam a forma como foi feita a mudança no conteúdo local eram as petroleiras e o IBP. Então, o governo entende que a posição das petroleiras e do IBP era mais em prol da macroeconomia e da sociedade brasileira do que a visão das 200 mil empresas reunidas em associações?
O governo tomou a decisão como governo, ouvindo o governo, conforme ficou registrado e conforme está colocado ao mercado. Essa é a visão de governo. Se no momento isso se aproximou de um ou outro lado, não é esse o fator da tomada de decisão. Nós temos confiança de que os próximos leilões trarão investimentos importantes para o Brasil e que a recuperação da economia brasileira passa muito pela área de energia. A gente já tem para entregar à sociedade o resultado dos leilões da Celg e o leilão de transmissão, que foi um grande sucesso. A valorização das empresas de energia na bolsa representa a confiança do mercado no trabalho que está sendo feito.
O governo espera realizar todos os leilões de óleo e gás previstos para este ano ou teme por atrasos?
Em relação aos leilões de óleo e gás, a equipe do secretário de Petróleo e Gás no MME, Márcio Félix, junto com a ANP, está focada. E não senti deles nenhum sinal de que não iremos cumprir o cronograma desse ano. Não apenas de 2017, mas também a perspectiva para 2018 e 2019 da clareza em relação a leilões que serão feitos.
O senhor acha que haverá interesse pelos quatro leilões?
Acho. Da mesma forma quando me perguntaram dos leilões de transmissão, e eu disse que confiava que daria certo. E a última licitação teve 92% de sucesso.
No que diz respeito à metodologia de cálculo de royalties, a ANP ainda aguarda o CNPE passar as diretrizes…
O CNPE já consolidou sua visão e os ministros de Minas e Energia e da Fazenda já estão ultimando o decreto que vai detalhar a recomendação do CNPE. Isso está na fase final e nos próximos dias isso estará pronto.
O processo da ANP está avançando. O entendimento que existe muito claro é de que está pacificada a questão das atribuições. Isto é, será a ANP que terá de decidir, tecnicamente, os critérios para o preço mínimo. Em compensação, o governo, como formulador de política, estabelece os parâmetros para isso. Ou seja, pesando de um lado a qualidade técnica da ANP e de outro a previsibilidade da mudança daquele número. Se tivéssemos a ANP fazendo a cada momento uma mudança para ter o número ideal, você teria uma grande percepção de risco pelo segmento investidor e dos estados e municípios. A fronteira está definida. A União vai estabelecer esses critérios de previsibilidade e transição e a ANP vai definir o número técnico.
ANGRA 3 E PRIVATIZAÇÕES
Com relação a Angra 3, já existe alguma solução?
A Eletrobrás está concluindo os estudos para apresentar ao CNPE em abril. Angra é um daqueles projetos em que há uma conjunção de interesses empresariais da Eletrobrás com uma obra que representa de certa forma um interesse de política pública. A Eletrobrás já nos informou que, para a empresa, parece fazer sentido concluir a obra. Estamos com cerca de 60% de conclusão da obra. Mas o custo de não concluir a obra para a Eletrobrás será maior do que o de concluir. Agora, como concluir e refazer o equilíbrio dessa obra é o grande desafio. A conclusão ainda é significativa para a Eletrobrás. Não fazer a obra traria um impacto ainda maior.
Em tese, tomada a decisão de conclusão pelo CNPE, haverá a modelagem de como fazer a conclusão. Nós gostaríamos muito de que houvesse um processo competitivo para isso, para trazer um parceiro privado internacional. A China tem conversado, mas outros players internacionais, como a Rússia, tem conversado com a Eletrobrás. A expectativa é de que, ao definir o modelo de conclusão da obra, haveria ainda um ano para licitar. Você precisar valorar os investimentos feitos, definir o modelo de escolha de um novo parceiro e aí avançar num processo competitivo para que alguém conclua a obra. Essa modelagem é complexa e pode ser com a maior participação acionária ou da menor fração da tarifa a ser paga.
No caso da participação acionária, precisaria de mudança da Constituição…
A mudança na Constituição, no momento, não está nas conversas. A Eletrobrás sempre seria a responsável pelo empreendimento e a operadora da usina. Não está na agenda do governo, nesse período curto, discutir uma mudança constitucional na área nuclear.
O governo tem negociações com a Cemig para que a empresa mantenha as concessões de usinas devolvidas?
Não há negociações com a Cemig. Essa decisão foi tomada pelo governo. Os recursos dessa licitação foram incluídos no orçamento, estão considerados na programação orçamentária do governo nesse ano. Então, não há negociações. Até mesmo porque a proposta que a Cemig trouxe exigiria uma mudança na constituição do estado de Minas, o que não é muito compatível com os prazos dos processos que estão em curso. Existe uma decisão do ministro Dias Toffoli no Supremo que suspendeu o encaminhamento do processo. Sob o ponto de vista do governo, não há negociação. Esse é um processo que passa pelo Judiciário, a quem devemos respeitar. Mas o Executivo já se manifestou em relação a esse processo a sua visão de governo, que é de fazer ainda esse ano o leilão.
E como está o processo de privatização de distribuidoras da Eletrobrás?
Em relação ao setor elétrico, o BNDES contratou agora uma consultoria que fará a modelagem das empresas distribuidoras, que serão vendidas até o final do ano. A modelagem, que ainda não está definida, vai procurar maximar a venda das empresas. Essa não é uma venda que tem objetivo de arrecadar. Objetivo de arrecadar é absolutamente secundário. O objetivo é tirar o problema da Eletrobrás e melhorar a qualidade de atendimento. Alagoas, no réveillon do ano passado, teve falta de energia no litoral norte. Pode ser que seja feito um modelo que permita combinações. O BNDES que vai definir a modelagem, que pode permitir até mesmo as ofertas combinadas. Isso está sendo estudado. A venda das distribuidoras é importante para o Brasil inteiro. Porque essas empresas, com má gestão, puxam a média das distribuidoras do Brasil para baixo. Então elas puxam os padrões regulatórios da Agência Nacional de Energia (Aneel) para baixo. Na medida em que essas distribuidoras melhorem, a média da regulação melhora e todos os consumidores serão beneficiados.
ENERGIA RENOVÁVEL E ABENGOA
Como o Brasil vai resolver o subsídio da energia renovável?
O compromisso do Brasil com energias renováveis decorre da nossa vocação. Os ventos no Brasil são extremamente favoráveis e a nossa insolação é extraordinária. A pior área de sol do Brasil é melhor que a região com mais insolação da Alemanha, que é um país líder em renováveis. A vocação brasileira em renováveis nos dá essa prioridade. Nós somos líderes no mundo na presença de renováveis na matriz. Então o o compromisso do governo é avançar no uso desse recurso. Até porque as soluções históricas do Brasil, como por exemplo as hidrelétricas com reservatório, hoje a sociedade entende que essa solução precisa de um conjunto de reavaliações. Não só solar e eólica, mas também a biomassa. Existe um potencial gigantesco de produção de biomassa ainda não explorado no Brasil. E ainda têm as pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Essas energias vão ocupar um espaço muito grande. Mas precisamos reordenar a lógica sob o ponto de vista dos consumidores. Não é que não se queira comprar energia renovável. O que se quer é comprar pelo preço efetivo que ela representa. Nós precisamos discutir uma agenda moderna de integração das renováveis pelo custo efetivo dela.
Como será feito?
Isso não pode ser feito sem diálogo com o setor. Nós estamos conversando. E isso não pode ser feito como uma ameça ou que quebre direitos ou afete contratos. Nós temos que discutir algo com agenda de futuro. E só depois desse amadurecimento com a discussão com o setor que a gente estará pronto para levar isso para uma alteração legal. Nós fizemos no ministério uma consulta sobre o mercado livre. Essa consulta trouxe muitos elementos para a equipe interna da pasta avaliar. Nós acreditamos muito no mercado livre. Na Inglaterra, por exemplo, todos os consumidores são livres. para comprar energia de quem quiserem. Agora para chegar nisso é preciso desmontar uma série de mecanismos, porque não podemos fazer um processo em que alguns consumidores vão ter um ganho de competitividade em detrimento de outros consumidores. Principalmente se esse movimento estiver sendo feito no sentido do consumidor de alta renda ser subsidiado por um consumidor de baixa renda.
O senhor falou que o volume de subsídios para essa área seria um terço do PIB da área mineral. Esse volume é de quanto, aproximadamente?
Na verdade, o raciocínio embute não só os subsídios, mas também os impostos que incidem sobre o subsídio. Então, os subsídios diretos e indiretos avançam para algo como R$ 25 bilhões, os subsídios mais os impostos passam de R$ 30 bilhões. E o PIB mineral brasileiro é da ordem de US$ 30 bilhões. Então é uma relação de três para um. É claro que não é uma coisa que se encerre de um dia para outro. Mas muitos desses subsídios são importantes para o país. Eles atendem consumidores carentes.
Os subsídios mais pesados de hoje são os de baixa renda, energia nos sistemas isolados… o atendimento, por exemplo, da cidade de Manaus, que chega a custar R$ 3 bilhões por ano. Deve-se repensar o modelo de subsídios para fazer o que deve ser feito com mais eficiência. O atendimento ruim de Roraima, por exemplo: a capital Boa Vista teve 41 blecautes no ano passado. A sociedade em Roraima está padecendo por uma energia sem qualidade. Ao mesmo tempo, o custo adicional da energia de Roraima para o resto do País foi R$ 1 bilhão em 2016. Nós precisamos enfrentar os problemas, fazer as interligações, fazer as gerações mais eficientes, avançar no consumo, discutir o subsídio das renováveis para cumprir o compromisso de diminuir essa conta.
No caso dos subsídios das renováveis, essa política de leilões nos moldes atuais não funciona?
A política de leilão trouxe uma série de resultados. Nós temos que reconhecer que o modelo dos leilões do Brasil para atender o mercado regulado ofereceu aos geradores o contrato de longo prazo, com correção da inflação. Isso trouxe muito investimentos e permitiu o desenvolvimento da indústria. Não se trata de uma crítica ao passado, mas agora nós temos um conjunto de outros mecanismos. Não temos mais a facilidade do dinheiro barato do BNDES. Nós precisamos combinar com o que houve de bom com o modelo de leilão e pensar em mecanismos novos para que esse mercado se torne mais eficiente. Não é uma discussão simples. Isso passa muito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), pela Secretaria de Planejamento Energético do MME. Nessa discussão do Reino Unido com a Alemanha, nós temos a oportunidade de aprender com a experiência dos países que estão convivendo com esse problema há muito tempo.
Qual a visão do governo em relação à judicialização do caso da Abengoa?
Existe um problema grave no setor que é o problema da judicialização. Talvez, esse seja o maior problema do setor elétrico hoje, porque traz insegurança e incerteza para o mercado. Parte desses problemas está sendo reconhecida pelo governo, que precisa rever processos, mas tem outro conjunto de problemas que vamos enfrentar. Esse da Abengoa é um desses problemas. As decisões judiciais têm um custo muito grande para a sociedade, à medida que atrasam o desenrolar normal de um processo. Entendemos o seguinte: somos um governo pró-mercado, e entendemos que o País precisa do capital privado e do investimento no atual momento. Mas os riscos do negócio tem que estar aplicados aos agentes do negócio. Se alguém entrou em um leilão e deu um ágio de metade do valor do leilão e depois teve problemas, não podemos via legislativo tentar socializar uma perda de um agente específico. Esse movimento explicou, ao longo do tempo, muitos dos problemas que tivemos no setor elétrico.
A não disponibilidade das linhas da Abengoa encarecem a energia no Brasil, porque elas impedem que o sistema seja otimizado. Se elas estivessem disponíveis, estaríamos usando melhor nossos recursos e a energia seria mais barata.
Parabéns ao Petronoticias por ser incisivo à respeito da questão do conteúdo local. Infelizmente o secretário é o típico político, especialista em desviar de questões objetivas respondendo com platitudes e generalismos.
É obvio que a questão do conteúdo local foi decida de forma exatamente contrária à descrita. Foram levados em conta somente interesses imediatistas, ou seja, ajudar a garantir o sucesso da próxima rodada de leilões e lustrar a imagem do governo, isso se não soubermos mais para a frente que influíram também outros interesses, menos “republicanos”.
Lobby $$$$$$$$$$$$$$$$$$$$, nada mais que isso, o resto é conversa pra boi dormir.