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ARGUS AVALIA QUE PROGRAMA DE INCENTIVOS PRESIQ PODE SER TÁBUA DE SALVAÇÃO E ALAVANCA DE CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA QUÍMICA DO BRASIL

Argus_Fred_Fernandes_Foto_Wanezza_Soares-3530 copiarA implementação do Programa Especial de Sustentabilidade da Indústria Química (Presiq), atualmente em discussão na Câmara dos Deputados (PL 892/2025), tem atraído a atenção do mercado por seu potencial de alavancar o setor químico brasileiro. A proposta surge como substituta do Regime Especial da Indústria Química (Reiq), cujo fim de vigência está previsto para 2027. Na avaliação de analistas e representantes da indústria, o Presiq é considerado uma ferramenta crucial para evitar o colapso do setor. Essa percepção é compartilhada por Frederico Fernandes, editor de polímeros da consultoria Argus e entrevistado desta segunda-feira (16). “De certa forma, o Presiq representa uma tábua de salvação para a indústria química brasileira. O setor vem enfrentando um longo período de sucateamento, com poucos investimentos e uma taxa de operação em torno de 60% da capacidade total“, afirmou. O especialista acredita que, ao estimular investimentos em novas capacidades produtivas, os setores químico e petroquímico poderão iniciar um novo ciclo de crescimento. “Acho que o Presiq seria a principal alavanca de sustentação do crescimento que a indústria tanto quer alcançar“, avaliou.

Para começar, seria importante fazer uma breve diferenciação entre o Reiq e o Presiq.

ISI-QuímicaVerde-BioMolvinícius-maglahães_4057Existe uma diferença fundamental entre as duas ferramentas. O Reiq, que ainda está em vigor, tem como foco principal a redução da carga tributária da indústria química. Já o Presiq, por sua vez, está mais voltado à agenda de sustentabilidade. A proposta do governo com o Presiq é utilizar parte dos recursos das próprias empresas do setor e direcioná-los a investimentos sustentáveis — seja na cadeia produtiva, seja em novas instalações menos poluentes, entre outras iniciativas.

Um exemplo prático disso foi o anúncio recente da Braskem, a maior companhia petroquímica do país. A empresa revelou planos de investir no polo petroquímico do Rio de Janeiro, substituindo a atual matriz baseada em nafta por etano derivado do gás do pré-sal. Esse movimento já prevê o uso de recursos do Presiq, marcando um primeiro passo para a efetiva implementação do programa.

Ao seu ver, o que Presiq pode trazer de impactos efetivos para a indústria química brasileira?

braskemDe certa forma, o Presiq representa uma tábua de salvação para a indústria química brasileira. O setor vem enfrentando um longo período de sucateamento, com poucos investimentos e uma taxa de operação em torno de 60% da capacidade total — o nível mais baixo desde o início dessa medição, por volta de 1990.

Ou seja, é urgente fazer a engrenagem girar novamente, com mais produção e maior eficiência. Mas, para isso, são necessários investimentos. Muitas plantas industriais ainda operam com tecnologias defasadas e infraestrutura antiga, o que compromete a produtividade. O Presiq surge, então, como uma ferramenta para estimular esses investimentos e, ao mesmo tempo, garantir que o governo volte a olhar com mais atenção para o setor químico.

Como vai funcionar efetivamente o Presiq a partir do fim do Reiq? O que muda para as empresas?

QUIMICAO Presiq tem como principal objetivo, dentro da agenda de sustentabilidade, ampliar as possibilidades de modernização das plantas industriais. A proposta é estimular investimentos em eficiência energética — reduzindo o consumo de energia e promovendo o uso de fontes renováveis, como hidrelétrica, solar e outras.

Outro foco importante é a gestão de resíduos. Hoje, uma parte considerável dos insumos se perde ao longo da cadeia produtiva, e o programa busca justamente reduzir essas perdas. Além disso, há uma preocupação crescente com as emissões. A imagem de chaminés lançando fumaça preta ficou no passado. Já existem tecnologias capazes de minimizar drasticamente esse impacto, e o Presiq pretende acelerar essa transição.

Mas talvez o ponto mais relevante seja o incentivo à pesquisa e inovação. Sem avanço tecnológico, profissionais qualificados e plantas mais modernas e menos poluentes, não será possível atingir as metas propostas pelo programa. E para que tudo isso aconteça, será fundamental garantir recursos e investimentos consistentes.

A indústria química vem relatando uma balança comercial desequilibrada, geralmente com exportações em queda e importações em alta. Como avalia a evolução desse quadro?

petroquimica-suapeNo centro dessa discussão — especialmente no segmento de polímeros e plásticos, que é onde atuo mais de perto — está o fato de que o Brasil não possui capacidade produtiva suficiente para atender a 100% da sua demanda interna. Mesmo com um crescimento econômico ainda tímido, o consumo segue avançando, e isso pressiona a necessidade de importações. 

Recentemente, a Braskem, por meio de lobby — o que é normal na indústria — obteve a elevação da alíquota de importação de determinados produtos, de 12,6% para 20%. Trata-se, na prática, de uma barreira comercial. Além disso, houve um aumento significativo da tarifa antidumping aplicada ao PVC importado dos Estados Unidos, que saltou de 7,8% para 43,7%. É praticamente um embargo sobre esse material.

Como principal produtora nacional, ao lado da Unipar nesse caso específico, a Braskem busca restringir a entrada de material estrangeiro como forma de recuperar participação no mercado interno. No entanto, mesmo diante dessas barreiras, é bastante provável que as importações continuem em alta, justamente porque a produção local ainda é insuficiente para atender à demanda crescente.

Não haverá mudanças mesmo após essas novas taxas?

GASMesmo com as novas taxas, o que deve ocorrer é uma realocação das origens das importações. Em vez de comprar dos Estados Unidos, os importadores passam a adquirir o material do Egito, que tem isenção tributária para esse tipo de produto. No lugar da China, que enfrenta atualmente um custo elevado de frete, entram fornecedores da Argentina ou da Colômbia, que possuem uma logística mais favorável por estarem geograficamente mais próximas. Ou seja, o material importado continua sendo necessário — especialmente no caso dos polímeros. 

Nesse contexto, o Presiq pode ter um papel estratégico, e talvez até tenha sido uma jogada genial. A Braskem atuou em duas frentes simultâneas: de um lado, conseguiu restringir a concorrência externa por meio de barreiras tarifárias; de outro, anunciou investimentos na ampliação e modernização da sua capacidade produtiva no Rio de Janeiro, com foco em sustentabilidade, utilizando recursos provenientes tanto do Reiq quanto, futuramente, do Presiq. É uma forma de reposicionar a empresa no mercado nacional, apostando em competitividade com processos mais limpos e proteção comercial ao mesmo tempo.

O senhor mencionou os futuros investimentos da Braskem em sua planta no Rio de Janeiro. Seria interessante uma leitura desse novo momento da empresa. E como esse movimento se relaciona com o Presiq?

braskem mauáEstá tudo interligado. A chegada de Roberto Ramos à presidência da Braskem, no início do ano, sinaliza um novo momento estratégico da companhia. Ao que tudo indica, sua missão principal é reposicionar a empresa no mercado e recuperar valor. Até cinco ou seis anos atrás, a Braskem chegou a valer algo em torno de R$ 20 bilhões — hoje, esse número gira em torno de R$ 4 bilhões. Houve uma perda significativa de valor de mercado. Ramos veio de outro braço da Odebrecht, com experiência na área de energia, e tem um perfil voltado à reestruturação de ativos: ele compra, organiza e vende. É exatamente isso que parece estar acontecendo agora.

Um dos grandes desafios da Braskem é o custo da matéria-prima. A empresa sempre teve a nafta como principal insumo, mas o preço desse produto está elevado globalmente. A Braskem já comprou da Petrobras, depois passou a importar dos Estados Unidos e de outras origens, mas o custo continuou alto. A alternativa, agora, é o gás. A ideia é utilizar o gás do pré-sal, transportá-lo para o Rio de Janeiro, processá-lo no cracker e transformá-lo em etano ou propano — insumos que alimentariam a produção com um custo até 50% menor. Isso permitiria alcançar um nível de competitividade mais próximo ao dos Estados Unidos, que utilizam gás de xisto (shale gas).

Uma segunda frente envolve a importação de gás da Argentina, da formação de Vaca Muerta, conhecida por sua abundância e preços mais baixos. O plano, portanto, é garantir uma matéria-prima mais barata como base para a retomada da competitividade da empresa. A terceira peça dessa estratégia é o Presiq. O programa entra como um pilar de sustentabilidade que ajuda a consolidar esse novo posicionamento. Ao adotar práticas mais limpas e alinhadas com a agenda ambiental, a Braskem se aproxima do que o governo espera da indústria e reforça seu compromisso com a inovação e a responsabilidade ambiental.

O objetivo final dessa reestruturação parece claro: valorizar a empresa novamente no mercado, torná-la mais atrativa e, eventualmente, viabilizar sua venda, retirando-a da administração dos bancos credores, mas mantendo a Odebrecht como acionista.

Por fim, quais são as perspectivas para o mercado químico e petroquímico diante de todos os assuntos que conversamos? Como a Argus está enxergando o restante do ano para esses setores?

refinaria-e-petroquimica-750x430O Brasil tem se mostrado um país bastante resiliente, mesmo diante do cenário desafiador da indústria petroquímica. Estamos atravessando aquele que talvez seja o maior ciclo de baixa da história do setor. Esse movimento começou ainda na pandemia, há quatro ou cinco anos, e segue sem sinais claros de reversão. A cada fim de ano, renova-se a expectativa de melhora no período seguinte — mas ela não se concretiza. Há um excesso global de capacidade produtiva, sem que haja mercados suficientes para absorver esse volume, o que mantém os preços pressionados para baixo.

Apesar disso, há sinais positivos no mercado brasileiro, especialmente no segmento de polímeros. A demanda interna continua crescendo, mesmo que de forma modesta. Esse crescimento contínuo, ano após ano, é um indicativo de força do setor e da economia como um todo. Se não fosse por algumas restrições macroeconômicas — como os juros elevados — o ritmo de consumo poderia ser ainda mais acelerado.

O Presiq, nesse contexto, aparece como uma peça-chave. Se o programa realmente se consolidar e for capaz de estimular investimentos em novas capacidades produtivas — mais modernas, mais limpas e com melhor gestão —, os setores químico e petroquímico poderão entrar, talvez já na próxima década, em um novo ciclo de crescimento mais sólido e duradouro. Acho que o Presiq seria a principal alavanca de sustentação do crescimento que a indústria tanto quer alcançar.

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