CONCORRÊNCIAS SUSPEITAS DE DIRECIONAMENTOS ENVOLVEM DATAPREV E O INPI
Parece que as lições dadas a cada dia pelo juiz Sérgio Moro e pela Operação Lava Jato tem surtido pouco efeito em alguns setores da administração pública. A audácia de alguns chama a atenção tanto da Polícia Federal quanto do Ministério Público Federal. Em duas concorrências para a contratação da manutenção de salas cofre, uma na Dataprev e outra no INPI, o sinal amarelo foi aceso. Há fortes indícios de irregularidades e direcionamento dos resultados para uma mesma empresa. O direcionamento vem desde a confecção dos editais para a licitação. No caso do INPI, mesmo depois da licitação impugnada, o órgão simplesmente renovou o contrato com a empresa prestadora de serviços e, apesar da licitação em andamento, fez um acordo com ela, alegando ter conseguido um desconto de 23% no preço que vinha apresentando pelos serviços. É praticamente uma confissão de superfaturamento, já que a mesma empresa estava contratada há três anos. E ainda ganhou um novo contrato por mais cinco anos, mesmo com a licitação em curso. Um show de irregularidades.
A empresa vencedora é a Aceco TI, que já estava sendo beneficiada pelo edital direcionado. Na confecção do edital de licitação, usou-se uma manobra inteligente para isso. Os seus autores lançaram mão de um sofisma extremamente sofisticado. Apenas a Aceco TI possui a certificação da ABNT NBR 15.247. O edital não exigia que a empresa participante da licitação tivesse esta certificação, mas que a empresa tivesse experiência comprovada em manutenção de salas cofre com esta certificação. No caso, a sala cofre é quem deveria seguir esta normatização. Por curiosidade, a Aceco TI é a única empresa no Brasil a ter este documento e também é quem detém o poder de autorizar que outra empresa seja capacitada a ter esta certificação. Como a empresa não autorizou ninguém, apenas ela detém este poder.
No caso da Dataprev, é ainda mais grave. Os contornos das irregularidades chamam mais a atenção, porque a Dataprev já tinha conhecimento prévio de que só a Aceco TI possuía esta documentação. Isto é comprovado no próprio processo administrativo para a escolha da empresa vencedora. Na folha 1081 do processo está um documento oficial da ABNT, datado de 9 de dezembro de 2014, assinado pelo Gerente de Certificação de Produto, Sergio Pacheco. O documento foi autenticado como verdadeiro no dia 10 de abril de 2015, num reconhecimento do 1º Tabelião de Notas de Osasco, em São Paulo.
A declaração 8279/14 tem o seguinte teor:
“Declaramos para fins de atendimento às exigências de Órgãos da Administração Pública que, até a presente data, a empresa ACECO TI S/A, inscrita no CNPJ sob nº 43.209.436/0001-06, é a única empresa certificada pela ABNT para a instalação de um ambiente protegido, Sala Cofre, conforme a norma ABNT NBR 15247:2004, e o procedimento de certificação PE 047.07 comprovado pelos Certificados de Conformidade nº 113.001/05 – validade: 07/03/2013 a 18/05/2015 e 113.001/09 – validade: 07/12/2014 a 07/12/2017.
Tal certificação abrange também o serviço de manutenção preventiva ou corretiva em sala-cofre, sendo necessária para a permanência da certificação do produto que esta atividade seja realizada pela empresa supracitada ou por autorizada desta.”
Mas há ainda outras complicações, pois o Tribunal de Contas da União, considerado como um guardião da correção, jogou um véu de insegurança jurídica com a decisão do Ministro Relator do caso, Vital do Rêgo. Em junho deste ano, o Ministro concedeu uma medida cautelar suspendendo o pregão que escolheu a empresa vencedora da licitação. Dois meses depois, uma nova decisão do mesmo ministro mudou os rumos da licitação. Ele não levou em consideração nem o parecer da área técnica do tribunal, que apontava diversas irregularidades, passando por cima das observações dela, mesmo reconhecendo uma falha nas ações da Dataprev quando relata que: “A resposta da Dataprev não foi apta a justificar todas as irregularidades apontadas em relação ao pregão eletrônico 357/2015″.
O Ministro Vital do Rêgo escreveu também que reconhece que há um monopólio da empresa Aceco TI, que só ela detém a certificação NBR 15.247 e que a proposta indicada vencedora no pregão estava fora das especificações pedidas, agravada pela cláusula em que a Aceco TI prevê um BDI de 27,5% ao invés de 25%, como é exigido pelo edital. Só por isso, de acordo com as regras, a empresa deveria ter sido desclassificada, mas, ao contrário disso, foi instruída pelo Ministro a se adequar ao que o edital exigia, numa decisão questionável, já que as outras empresas participantes não tiveram o mesmo direito.
No INPI, o Sr. Luiz Otávio Pimentel (foto), assumiu recentemente a presidência do instituto, nomeado pela presidente Dilma Rousseff e, ao que parece, pegou o processo já em andamento. Mas, mesmo provocado, não quis se pronunciar, segundo a assessoria de imprensa do instituto. Diante dos questionamentos, o INPI emitiu uma nota oficial com um teor que comprova os indícios de direcionamento do resultado e praticamente se revela em uma confissão de que estava pagando um sobrepreço de 23% há três anos:
“De acordo com informações colhidas junto à Diretoria de Administração (Dirad), o INPI informa que:
I) Adquiriu, em 2010, uma sala-cofre para garantir a segurança de seus dados. Esta sala tem seus requisitos técnicos baseados em padrões internacionais, definidos no Brasil pela NBR 15.247, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), e usados em outros órgãos públicos e empresas nacionais.
II) Em 2012, o INPI realizou licitação para contratar empresa de manutenção da sala-cofre. A licitação não exigiu que a empresa fosse certificada pela NBR 15.247, mas sim que tivesse capacidade de fazer manutenção em salas baseadas naquela norma.
III) Em 2015, após constatar que a média atual de contratações públicas para este serviço estava abaixo do valor previsto no contrato do INPI, o Instituto decidiu realizar nova licitação. Houve uma impugnação que não foi aceita pela razão descrita no parágrafo acima – o INPI não exigia a certificação da empresa, mas sim capacidade técnica de fazer manutenção em salas certificadas. A decisão sobre a impugnação será publicada em breve.
IV) Como a empresa contratada para a manutenção aceitou reduzir o valor em 23%, ficando na média de mercado, o INPI, baseado em parecer da área técnica, decidiu renovar o contrato, como permite o Item II, Artigo 57, da Lei de Licitações, em vez de seguir com um novo processo licitatório.”
O Tribunal de Contas da União foi procurado para esclarecer todos esses questionamentos e o direcionamento mas, até agora, não recebemos nenhuma resposta às razões que levaram à decisão do Ministro Vital do Rêgo. Buscamos também um posicionamento oficial da Dataprev, mas até o fechamento desta edição também não recebemos nenhuma resposta.
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