CRIAÇÃO DE AUTORIDADE DE SEGURANÇA NUCLEAR TRARÁ ESTABILIDADE PARA NOVOS NEGÓCIOS NO SETOR, AVALIA ABDAN
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
O governo federal já está bem adiantado nos preparativos para a criação da Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN), órgão que assumirá as atividades de regulamentação e fiscalização do setor. Hoje, essas atribuições estão nas mãos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Há muitos anos, a indústria pedia por essa separação, já que a CNEN também possui outras atribuições. Para entender como o mercado está avaliando o nascimento desse novo agente no segmento, ouvimos o presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), Celso Cunha. Ele considera que a criação da ANSN vai retirar o sentimento de instabilidade dos investidores, trazendo mais segurança. “Os investidores não gostam de cenário de negócios confusos. Eles preferem quando há regras claras. Essa agência vem em um momento extremamente importante”, opinou. Cunha também acredita que a nova entidade reguladora poderá acelerar, no longo prazo, o andamento dos projetos nucleares do país. O presidente da Abdan também comentou sobre algumas das novas ações da associação para os próximos meses, como o estímulo à formação de uma forte cadeia local de fornecedores: “Pelo o que já sabemos, se tivermos três usinas sendo construídas simultaneamente, com características muito próximas, podemos ter até 65% da produção de componentes no país. Mas, para isso, precisamos incentivar a indústria”, disse.
Gostaria de ouvir do senhor como a criação da ANSN pode ajudar o ambiente de negócios do setor nuclear.
O principal fato é a desvinculação entre o agente regulador e fiscalizador de dentro de uma estrutura [a CNEN] que já realiza outras tarefas. Isto já demonstra para o mercado, de cara, um nível maior de estabilidade. Ou seja, o recado que se passa para o mercado é que a regulação e a fiscalização são importantes e que a meta é dinamizar esses processos sem perda de qualidade. Ao mesmo tempo, essa desvinculação atende a uma recomendação feita há mais de uma década pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que afirma ser impossível ter, dentro de uma mesma estrutura, instituto de pesquisas, regulação e fiscalização.
Se o governo quer parcerias público-privadas dentro do setor nuclear, é preciso demonstrar que existe um agente capaz e dinâmico para criar um ambiente de negócios saudável. A criação da ANSN é uma grande vitória. As pessoas que farão parte dessa autoridade irão dedicar-se exclusivamente à regulação e à fiscalização. Acho que isso é um grande passo.
No caso da geração nuclear, as usinas levam quase 10 anos para ficarem prontas. Gasta-se muito tempo com todo o processo regulatório e de fiscalização. Com a ANSN, você pode dinamizar isso sem nenhuma perda de competência. Enquanto isso, a estrutura que ficará na CNEN também poderá dedicar-se ao seu foco principal, que são os institutos de pesquisa e a formação de pesquisadores.
Ter uma autoridade exclusiva para fiscalização e regulação contribuirá até que ponto na abertura do mercado nuclear brasileiro?
Os investidores aprovam quando você sinaliza a autonomia desse órgão regulatório e fiscalizador, tornando isso cada vez mais transparente. Os investidores não gostam de ambiente de negócio confuso. Os investidores preferem quando há regras claras. Então, não podemos ter um ambiente regulatório confuso, em hipótese nenhuma. Essa agência vem em um momento extremamente importante.
Hoje, qual é o sentimento do investidor quando olha para a CNEN acumulando tantas funções?
Isso traz uma sensação de instabilidade. Vejamos o exemplo da medicina nuclear: as empresas desse setor são fiscalizadas pela CNEN que, ao mesmo tempo, também dita as regras desse segmento. Além disso, essas companhias também se adequam às regras da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]. É um processo extremamente confuso.
Olhando para o futuro, como a criação dessa nova autoridade nuclear ajudará a acelerar os projetos nucleares em andamento?
Nós esperamos que essa separação e esse ambiente mais tranquilo traga mais celeridade sim. Mas isso não acontecerá no curto no prazo. Montar todas as regras não será possível em um curto espaço de tempo. Tudo isso leva um tempo, não será do dia para a noite. Mas esperamos que, sim, com o tempo, todos os projetos aconteçam de forma mais rápida.
E quais serão as próximas ações da Abdan no sentido de ajudar o setor nuclear a superar desafios?
Estamos trabalhando muito forte no sentido de desenvolver o mercado. Ou seja, ter uma cadeia produtiva dentro da nossa indústria nacional, com empresas no país produzindo parte dos componentes. Devemos incentivar joint ventures com empresas estrangeiras. Acho isso muito importante. Não basta concluir Angra 3 e sinalizar a construção de novas usinas. É preciso construir a nossa indústria também.
Pelo o que já sabemos, se tivermos três usinas sendo construídas simultaneamente, com características muito próximas, podemos ter até 65% da produção de componentes no país. Mas, para isso, precisamos incentivar a indústria. Hoje, estamos negociando [um convênio] com a APEX-Brasil. O Sebrae-RJ também tem nos dado apoio para trazer as micro e pequenas empresas para o setor. Vamos realizar missões no exterior e trazer empresas de fora.
Além disso, vamos continuar dando apoio aos institutos de pesquisa. Não é porque está acontecendo essa separação de atribuições que nos esqueceremos deles. Isso é de suma importância. A Abdan também vai aumentar a relação com a Agência Internacional de Energia Atômica e com outras associações do setor, visando trazer conhecimento e dinamizar o mercado.
Para a medicina nuclear, acreditamos que devemos lutar pela flexibilização do mercado. Hoje, boa parte de tudo desse setor é importado. Somos altamente dependentes. Em plena pandemia, ficamos sem radioisótopos para tratamento e diagnóstico de câncer. Isso não pode acontecer, em hipótese alguma. Começamos o trabalho neste setor há um ano e vamos intensificá-lo.
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