ESPECIALISTA APONTA OS REATORES MODULARES COMO SOLUÇÃO PARA TRANSIÇÃO JUSTA EM REGIÕES CARBONÍFERAS DO BRASIL
Conforme noticiamos recentemente, uma proposta que prevê a substituição das termelétricas a carvão no Brasil por Pequenos Reatores Modulares (SMRs) é atualmente a mais votada na elaboração do Plano Clima – que reunirá estratégias nacionais para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e promover a adaptação aos impactos das mudanças climáticas. Para conhecer mais sobre a ideia, conversamos hoje (12) com o autor da proposta, o consultor técnico da Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN), Leonardo Paredes (foto). O especialista defende que seja realizada uma transição justa para minimizar o impacto na vida das pessoas que vivem há décadas na esteira da indústria carbonífera. “A instalação de um reator modular, além de preservar os empregos diretos e indiretos existentes, cria novos postos de trabalho com salários substancialmente mais altos, reaproveitando a mão de obra e a cadeia de suprimentos provenientes do setor de carvão”, apontou. Paredes cita também que os benefícios dos SMRs vão além da produção nucleoelétrica. “Essa tecnologia pode ser usada como fonte energética para o desenvolvimento de uma indústria carboquímica verde local – que aproveite os recursos das regiões mineradoras para produzir, por exemplo, amônia, fertilizantes e produtos químicos de um modo geral”, projetou.
Para começar nossa entrevista, gostaria que explicasse aos nossos leitores como a fonte nuclear pode contribuir com a descarbonização do setor energético.
A produção de energia elétrica a partir de fontes fósseis provoca emissões dos gases do efeito estufa (GEE), em decorrência das elevadas emissões de CO2 e particulados – como os óxidos de enxofre e nitrogênio. O seu uso vai na contramão da meta global de redução de emissões para limitar o aumento da temperatura do planeta em 2ºC. Além disso, essas fontes sofrem diretamente o impacto do preço do petróleo e das oscilações dos cenários geopolíticos. Diante do atual cenário mundial, a energia nuclear retoma seu protagonismo, por ser considerada uma fonte sustentável e confiável, que, embora não renovável, possui índices de emissão de CO2 praticamente nulos, garantindo também base e segurança energética ao sistema elétrico.
E já há, efetivamente, um reconhecimento internacional do papel da fonte nuclear para a descarbonização?
Atualmente, a fonte nuclear é responsável por 11% da oferta global de energia elétrica e, segundo a ONU, será indispensável no combate ao aquecimento global e no alcance das metas globais de redução de emissões fixadas para 2050. Nesse contexto, França e Reino Unido estão relançando seus programas nucleares. China e Rússia mantêm seus investimentos, assim como os EUA. Como resultado, atualmente estão em construção e planejamento mais usinas nucleares do que nos últimos 50 anos.
Junto à retomada da importância nuclear, destaca-se uma importante inovação tecnológica: os Small Modular Reactors (SMRs). Por serem reatores modulares e com potências mais baixas (máximo de 300 MW), possuem instalações bem menores do que as plantas convencionais e com garantias de retorno do custo de capital mais rápido, sendo assim, mais atrativos ao capital privado.
Falemos então agora especificamente sobre os SMRs. Quais são as grandes vantagens dessa tecnologia?
Os SMRs podem ser conjugados com fontes intermitentes, sendo que a maioria dos projetos em vigor hoje pelo mundo contempla tecnologias que garantem flexibilidades operacionais que os tornam mais adequados para atender às demandas dinâmicas do Sistema Interligado Nacional (SIN). Em termos de localização, os SMRs também são bastante competitivos, uma vez que podem ser instalados próximos aos centros consumidores, principalmente por serem reatores nucleares intrinsecamente seguros, com sistemas de segurança passiva e análises probabilísticas de risco incrivelmente baixas.
Para além da questão energética, quais são os outros benefícios que os SMRs podem trazer dentro do contexto da transição energética brasileira?
Em janeiro de 2022, o governo brasileiro sancionou a Lei 14.299, que limita até 2040 a contratação de energia gerada por termelétricas movidas a carvão mineral. A legislação instituiu ainda o Programa de Transição Energética Justa (TEJ), com o objetivo de promover uma transição energética mais equitativa para as regiões carboníferas do Brasil.
As usinas térmicas a carvão possuem uma infraestrutura ampla, que inclui desde proximidade com a rede de transmissão, estruturas de transporte, pessoal e gestão do conhecimento, até arranjos completos de edificações e cadeias de suprimentos locais. Todas essas características indicam o alto potencial do setor para a implementação da tecnologia SMR (Small Modular Reactors), por meio da conversão de suas unidades termelétricas em plantas nucleares.
Ao seu ver, qual seria o impacto dessa conversão?
A instalação de um reator modular, além de preservar os empregos diretos e indiretos existentes, cria novos postos de trabalho com salários substancialmente mais altos, reaproveitando a mão de obra e a cadeia de suprimentos provenientes do setor de carvão. Os benefícios ambientais também são significativos, otimizando o uso do solo e reduzindo os impactos no lençol freático e na atmosfera.
Por isso, apresentamos na primeira etapa do Plano Clima Participativo uma proposta para aproveitar a infraestrutura existente nas usinas a carvão mineral do Brasil para a implantação da tecnologia de SMRs, com a inserção do setor privado brasileiro nas atividades nucleares.
Portanto, os SMRs então seriam uma alternativa para uma transição justa em regiões carboníferas do Brasil?
Acredito que a substituição das termelétricas a carvão do Brasil por SMRs seja, de fato, a forma mais coerente e justa para a transição energética da cadeia carbonífera brasileira. Essa alternativa não despreza os recursos que ainda podem ser extraídos do carvão, tampouco suas reservas minerais que ainda serão abundantes em 2040. Além disso, também amplia os recursos de inúmeras famílias, que por anos vivem da cultura carbonífera.
Os benefícios desse SMR vão além da produção nucleoelétrica. Essa tecnologia pode ser usada como fonte energética para o desenvolvimento de uma indústria carboquímica verde local – que aproveite os recursos das regiões mineradoras para produzir, por exemplo, amônia, fertilizantes e produtos químicos de um modo geral.
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