ESPECIALISTAS TEMEM GRAVES CONSEQUÊNCIAS COM A CRISE NA PRODUÇÃO DE RADIOISÓTOPOS E GOVERNO VÊ SOLUÇÃO SÓ NA SEMANA QUE VEM
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
A comunidade de profissionais da saúde está muito preocupada com o que a próxima segunda-feira (20) reserva. Como o Petronotícias tem alertado ao longo da semana, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) deve interromper temporariamente a produção de radioisótopos e radiofármacos no início da semana que vem por falta de recursos financeiros. Com isso, clínicas e hospitais de todo o país poderão ficar de mãos atadas a partir de então, já que o instituto é o único fornecedor de diversos tipos desses produtos. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTIC), que é responsável pelo IPEN, só vê uma solução para a questão orçamentária a partir da próxima semana. Diante do impacto iminente, centros de saúde de referência, como o Instituto Nacional do Câncer (INCA), já apontam para as possíveis graves consequências para a saúde de pacientes por conta dessa crise.
A chefe do serviço de medicina nuclear no INCA, Priscilla Pujatti, afirma que a interrupção da produção dos radioisótopos e radiofármacos do IPEN vai paralisar 70% dos procedimentos diagnósticos. Isso significa que exames importantes para o diagnóstico e monitoramento de pacientes com câncer, como a cintilografia do miocárdio e a cintilografia óssea, além de procedimentos essenciais à cirurgia oncológica, como a linfocintilografia, serão severamente impactados. Do ponto de vista do tratamento, o INCA deve sofrer a interrupção de 100% dos procedimentos terapêuticos, com efeitos já na próxima semana.
“Em números, teremos pelo menos 70 pacientes deixando de ser atendidos por semana no INCA”, lamentou Priscilla. Olhando para o Brasil como um todo, a estimativa total é que cerca de 10 mil pacientes por dia em todo o país devem ser prejudicados com a crise no fornecimento de radiofarmacos e radioisótopos. “Hoje nós temos trabalhos científicos publicados mostrando que as terapias de medicina nuclear correspondem de 5% a 10% do total de abordagens terapêuticas no câncer. Então, dependendo do tempo que essa interrupção se mantenha, teremos um cenário complicado para o Brasil como um todo, não somente para o INCA. Esperamos que esse problema seja rapidamente solucionado”, completou a especialista.
As preocupações do INCA são compartilhadas por outros centros de saúde espalhados pelo país. O diretor-executivo da Clínica Núcleos, Gustavo Gomes, reforça que o Brasil possui diversos pacientes que dependem dos procedimentos de medicina nuclear. Ele lembra ainda que o IPEN é o único produtor nacional de vários radiofármacos e radioisótopos por conta do monopólio da União e, por isso, não existem alternativas para contornar o problema. “É realmente uma situação grave”, disse o diretor da clínica, que fica em Brasília. “A medicina nuclear é a especialidade médica que dá suporte a diversas outras, entre elas a oncologia e a cardiologia, com pacientes graves que precisam de bastante precisão e tratamentos que são únicos”, completou.
Segundo Gomes, que também é primeiro secretário da diretoria da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), pacientes com câncer de tireoide que precisam de tratamento com radioiodo; e pacientes com tumores neuroendócrinos que dependem de lutécio serão alguns dos mais prejudicados. “Além disso, ficaremos com uma carência muito grande na realização de diagnósticos precoces de vários tipos de câncer e doenças cardiológicas, principalmente no diagnóstico da isquemia miocárdica”, completou.
Os serviços de medicina nuclear também estão preocupados com o cenário que se avizinha a partir da próxima segunda-feira. A executiva chefe da Uddo Diagnósticos Médicos, Beatriz Leme, alerta que esse quadro deve frear a recente retomada do tratamento de vários pacientes no país. Isso porque muitos brasileiros deixaram de buscar tratamentos e diagnósticos durante a pandemia de covid-19. Justo agora, no momento em que essas atividades estavam voltando a patamares maiores, esse novo baque causado pela crise orçamentária do IPEN deve causar um novo freio na realização desses procedimentos médicos. “Os pacientes, na grande maioria, tratam problemas cardiológicos ou oncológicos. A situação está extremamente crítica. É muito desconcertante isso o que estamos passando”, alertou.
Beatriz também lamentou o fato desse episódio já ter ocorrido em outras ocasiões no passado e, novamente, assolar os serviços de saúde no país. “Posso dizer que sempre é dessa forma. Somos avisados de que isso vai acontecer sempre no último minuto. Se fôssemos avisados antes, estaríamos tomando as atitudes que estamos tomando agora”, disse.
Para lembrar, o anúncio de que o IPEN deixaria de produzir os radioisótopos e radiofármacos foi realizado somente na terça-feira (14), em uma triste ironia do destino – já que era o dia em que se celebrava o Dia do Médico Nuclear. Sem recursos financeiros para importação de insumos do exterior e do mercado nacional, o IPEN avisou aos serviços de medicina nuclear que irá suspender temporariamente a produção dos geradores de molibdênio-99/tecnécio-99 e dos radiofármacos provenientes de iodo-131, gálio-67, tálio-201 e lutécio-177, dentre outros. Essas substâncias são usadas por médicos nucleares no diagnóstico e tratamento de doenças do coração e do câncer.
MERCADO APELA POR SOLUÇÕES PARA A CRISE, MAS GOVERNO VÊ SOLUÇÃO SÓ NA PRÓXIMA SEMANA
O Petronotícias também noticiou ontem que a Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (ABDAN) e a SBMN publicaram uma carta conjunta sobre a crise. O texto foi endereçado ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e aos ministérios da Saúde; da Economia; e da Ciência, Tecnologia e Inovações. “Nós estamos direcionando nosso apelo aos três ministérios para que entrem em campo de uma forma ágil para resolver o assunto. A população não pode pagar esse preço. É inadmissível isso”, afirmou o presidente da ABDAN, Celso Cunha.
Para o presidente da associação, infelizmente o país sentirá alguns efeitos da interrupção temporária da produção do IPEN e a situação só deve se normalizar completamente em um intervalo entre 15 e 20 dias. “O impacto virá. O IPEN já soltou um comunicado formal para o mercado, dizendo que não vamos ter matéria-prima. Ou seja, o dano já está causado. Agora, devemos minimizar o estrago”, declarou.
Na noite de ontem, o MCTIC enviou uma nota ao Petronotícias com seu posicionamento em relação a essa crise. Para o IPEN voltar a produzir os radioisótopos, o instituto precisa receber uma verba de R$ 89,7 milhões nos próximos dias. O montante, quando depositado, garantirá a manutenção de sua produção de radiofármacos até dezembro de 2021. Uma parte do valor (R$ 34,6 milhões) virá por meio de Projeto de Lei do Congresso Nacional n°. 16, enquanto que a fatia restante R$ 55,1 milhões será repassada pelo MCIT. De acordo com a pasta, os parlamentares devem apreciar o tema na próxima semana. Leia abaixo o comunicado na íntegra:
O MCTI – Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações esclarece que desde junho de 2021 vem trabalhando com o Ministério da Economia para a maior disponibilização de recursos para a produção de radiofármacos pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), vinculado a esta pasta por meio da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN/MCTI).
Para a recomposição do orçamento do Instituto, o Governo Federal por meio do MCTI está sensibilizando o Congresso Nacional pela votação e aprovação do PLN 16/2021 prevista para a próxima semana.
Quando o ministro da saude faz outras coisas, acontece que nao faz o que deveria fazer.
Vai morrer muita gente.
O único atraso que vejo é o da aprovação da PLN 16/2021 pelo nosso ineficiente congresso nacional