JEAN PAUL PRATES INDICA MUDANÇA NA PARIDADE DE IMPORTAÇÃO, RECUO NA VENDA DE ATIVOS E MAIS ATENÇÃO PARA RENOVÁVEIS
No primeiro encontro com investidores, o novo presidente da Petrobrás, Jean Paul Prates, deixou seus primeiros recados ao mercado na manhã desta quinta-feira (2), durante teleconferência com analistas financeiros. Uma das falas mais importantes do presidente da empresa diz respeito à política de preços de combustíveis. Como tem feito rotineiramente, Prates diz que política de preços é “assunto de governo”. Paralelamente, cabe à Petrobrás definir o que chamou de “política comercial”, pela qual vai buscar o melhor cliente nas melhores condições. O presidente indicou que espera ver mudanças na regra do Preço de Paridade Importação (PPI). “Nós tivemos ainda uma política de preços interna, que não é da Petrobras, mas sim do governo brasileiro, em que foi instituído o preço de paridade de importação – que é o preço do nosso concorrente, não necessariamente é o nosso preço”, declarou. “O indicativo do governo [anterior], interferindo diretamente na Petrobrás, nesse sentido, era de que a empresa deveria, de fato, abrir espaço para a concorrência do importado. E isso, provavelmente, vai mudar”, acrescentou Prates. O presidente disse também que a empresa não irá vender “ativos por decisões governamentais, como foi feito antes”, indicando um recuo no programa de desinvestimentos. Por fim, Prates reforçou o interesse em energias renováveis, mas sem perder o foco em óleo e gás. O Petronotícias publica a seguir as principais falas do presidente da empresa durante o evento.
O que julga ser uma politica de dividendos equilibrada e sustentável para a Petrobrás?
Eu acho que distribuição de dividendos equilibrada é justamente aquela que o conselho, a Assembleia e a diretoria decidirem, em prol de investir bem, não prejudicar o investimento em bons projetos e, ao mesmo tempo, remunerar o acionista. Eu acho que todos nós aqui estamos diante de uma situação de trade-off. As empresas e as gestões propõem constantemente aos acionistas e aos investidores uma uma relação de trade-off. Cabe ao investidor decidir se quer estar conosco ou se quer estar com cash certo do dividendo de curto prazo. Essa relação de trade-off vai mudando. Eu chego até a ter dúvidas se há necessidade de ter regras muito rígidas internas em relação à percentuais de distribuição de dividendos. As circunstâncias mudam, a conjuntura muda e os projetos mudam. Vamos compondo essa relação conjuntamente, e cada vez mais com diálogo com os investidores.
Eu disse aos grupos de investidores com os quais me encontrei, antes mesmo de assumir a posição [de presidente da Petrobrás], que teríamos muito diálogo. Eu acho que é ruim quando conversamos sobre os projetos, ao invés de decretá-los de cima para baixo, para depois de sofrer reações e antipatias. Hoje em dia, com todos os canais de comunicação e com todas as regras, é possível dialogar antes de tomar decisões que, eventualmente, os investidores não gostam.
Agora, evidentemente, uma empresa importante como a Petrobrás para o setor de petróleo e para a economia brasileira também tem que levar isso em conta. Nós temos que ter isso como um benefício e não como uma desvantagem. O investidor precisa ver vantagens em ser sócio do Estado brasileiro. Se alguém ainda tem dúvidas disso, cabe a nós nessa nova gestão, provar que é diferente. Tem que ser bom ser sócio do Estado brasileiro. Não pode ser um ônus, tem que ser um bônus e é isso que levaremos adiante.
Sobre a transição energética, o Brasil tem muito potencial para hidrogênio verde. O país deveria ter uma política pública para esse energético? A Petrobrás poderia contribuir para subsídio de hidrogênio no Brasil?
Eu não vejo com muita boa vontade esse tipo de subsídio em relação ao hidrogênio tão cedo. Acho que podem existir políticas de governo, e aí não me diz respeito aqui comentar, porque eu estou na presidência da Petrobrás, e não numa entidade política-pública. Acho que se tiver incentivos e induções para que a transição, no caso de hidrogênio, aconteça mais rápido, serão todas bem vindas.
Eu não diria que hidrogênio é o carro-chefe aqui da nossa análise de transição energética de curto/médio prazo. O hidrogênio é uma coisa que requer responsabilidade na hora de conceber projetos. Certamente, a Petrobrás não vai engajar-se em projetos de hidrogênio sozinha. Ela vai fazer isso com congêneres, com empresas que conhecem esse negócio tanto quanto ou mais que a Petrobrás. Hidrogênio é uma fronteira muito nova, muito desafiadora e que provavelmente vai ter que contar com políticas públicas.
Como a Petrobrás deve posicionar-se no ambiente de transição energética? Devemos esperar um aumento da atenção para energias alternativas?
A resposta é sim. Devemos esperar um aumento de atenção para energias alternativas. E eu não considero isso [eólica e solar] como energias alternativas. Energias alternativas são aquelas que ainda estão buscando viabilidade. A fonte eólica, por exemplo, já é a segunda mais importante do país e deixou de ser alternativa. A solar também.
A Petrobrás já tem grande evidência em descarbonização. Nós lançamos e temos o maior programa de carbonização do mundo. A Petrobrás vai manter seu foco em upstream e no pré sal por várias razões. Primeiro, porque é a nossa atividade principal mesmo e ninguém se transforma de um dia para o outro. Em segundo, porque a atividade no upstream é importante justamente para financiar, em parte pelo menos, a transição energética.
Há atividades que são tão próximas da nossa atividade de petróleo e gás, com os mesmos fornecedores e os mesmos prestadores de serviço. Por exemplo, a injeção e o armazenamento de carbono precisam de sísmica, busca de lugares de espaços vazios na geologia do subsolo, tecnologias de perfuração de poços, reinjeção, etc.
Não exploramos ainda sequer metade do potencial que o gás natural tem como combustível de transição para a transição energética. Queimar gás natural é menos intenso em carbono do que queimar óleo diesel. Então, quando você migra para o gás natural, você está fazendo transição energética. Alguns não consideram isso porque tem uma visão mais radical do que a transição energética. Gaseificar o transporte rodoviário é uma opção para sair do diesel. Isso ajudaria a descarbonizar e a reduzir a dependência do Brasil em relação à importação de diesel.
Existem várias formas de costurar a transição energética, sem necessariamente tirar o foco do pré sal e da exploração e produção como elemento principal do investimento da Petrobrás.
Qual legado gostaria de deixar na Petrobrás?
A Petrobrás vai fazer 70 anos no mês de outubro. [O legado que quero deixar] é mais 70 anos produzindo valor para o Brasil, para o acionista e para os trabalhadores da Petrobrás. Uma empresa que demonstre, como eu disse, que ser sócio do governo brasileiro não é mau negócio. Pelo contrário, é uma vantagem.
Quero também preparar a empresa para o futuro e contribuir, de fato, para essa transição energética brasileira. Que ela seja uma transição justa, que não deixa as pessoas para trás. Que o petroleiro consiga fazer também a sua própria transição profissional, se for necessário e quando for necessário. E, claro, como qualquer outra empresa, queremos contribuir para o desenvolvimento sustentável em todos os sentidos – ambientalmente, socialmente e economicamente. Acho que não são metas ousadas nem descabidas para uma empresa como a Petrobrás.
Quando haverá uma definição do que será a política de dividendos para 2023?
Teremos uma robustez de dividendos, porque pretendemos ter lucros à altura do lucro auferido agora em 2022, embora eu imagine que devam ser circunstâncias diferentes. Portanto, o desafio é bem maior. Nós tivemos circunstâncias importantes e definidoras nos últimos dois anos, que tiveram a ver com o pós-covid, a retomada da economia mundial e da própria economia brasileira, que fizeram um ramp-up do preço de petróleo e uma aceleração na demanda em geral pelos produtos derivados de petróleo.
Nós tivemos ainda uma política de preços interna, que não é da Petrobras, mas sim do governo brasileiro, em que foi instituído o preço de paridade de importação – que é o preço do nosso concorrente, não necessariamente é o nosso preço. Apesar de estarmos hoje com o fator de capacidade de refinarias bem mais alto, até por conta da demanda e de novos direcionamentos, tivemos momentos com capacidade de refino muito baixa. E o indicativo do governo [anterior], interferindo diretamente na Petrobrás, nesse sentido, era de que a empresa deveria, de fato, abrir espaço para a concorrência do importado. E isso, provavelmente, vai mudar.
Não é que iremos fazer a política de preço do Brasil. Eu insisto em dizer que isso é questão de governo. Não é questão de Petrobrás. A empresa tem a sua política comercial, e vai buscar o melhor cliente nas melhores condições e vai dar a esses clientes as melhores condições para que não perca uma proposta de venda de combustível ou de derivado de petróleo em geral. A Petrobrás vai defender-se quando for acusada de que está tirando esse ou aquele concorrente, coisa que não aconteceu antes.
Então, são circunstâncias diferentes. É um desafio maior. Até porque nós não vamos necessariamente sair vendendo ativos por decisões governamentais, como foi feito antes. Nós não vamos nos desfazer de refinarias ou de regiões inteiras do país, simplesmente porque o governo quer. Vamos fazer decisões de empresa. Onde houver oportunidades no território brasileiro ou até no exterior, nós vamos perseguir. E quem vai decidir isso não é um imperador, não é uma pessoa só, mas sim o conselho de administração, a diretoria executiva, com um diálogo aberto com investidores e pessoas que acreditam na Petrobrás. Dialogar antes faz parte do nosso projeto.
Como pretende equilibrar política de dividendos, investimentos e saúde financeira?
Escolhendo bons projetos, bons sócios e bons parceiros. Além disso, vamos manter a responsabilidade financeira na gestão como um todo. Eu acho que é um passo natural e normal de qualquer empresa, principalmente uma companhia grande como a nossa. A Petrobrás tem responsabilidade social a cumprir no Brasil, como muitos dizem. A minha interpretação disso é que esse papel existiria em qualquer empresa que tivesse o tamanho e a importância que a Petrobrás possui. Se a Petrobrás tem o governo como acionista principal e controlador, então, maior ainda é essa responsabilidade.
Nós também temos a responsabilidade de dizer ao acionista controlador que, eventualmente, há opções melhores do que diretamente a atuar como um agente de política setorial. Ou quando essa atuação pode pesar muito mais na rentabilidade ou até afugentar investidores. Nossa responsabilidade é discutir isso e buscar alternativas várias vezes. Isso já aconteceu antes e, mesmo agora, nesse pequeno período que eu estou na presidência, já também ocorreram diálogos nesse sentido e prevalecemos com entendimento tranquilo, sem absolutamente nenhuma resistência do outro lado.
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