MARCO LEGAL BRASILEIRO ABRE AS PORTAS PARA A PARTICIPAÇÃO DA FONTE NUCLEAR NA PRODUÇÃO DE HIDROGÊNIO NO PAÍS
A Política Nacional de Hidrogênio de Baixo Carbono do Brasil demorou a ser lançada, mas chegou com maturidade, incorporando lições globais e alinhada com as tendências internacionais. Essa é a avaliação de especialistas ouvidos pelo Petronotícias, que ressaltam que o texto abre portas para diversas fontes de energia no processo de produção de hidrogênio limpo. A indústria nuclear, em especial, está bastante otimista com essa nova oportunidade, uma vez que experiências e pesquisas no exterior indicam que o custo é um ponto forte, favorecendo sua aplicação.
Estudos empíricos realizados no Idaho National Lab, nos EUA, comprovaram que a fonte nuclear aplicada a um eletrolisador de alta temperatura pode gerar hidrogênio de baixo carbono a custos muito menores do que se tem conseguido até mesmo usando fontes renováveis – ou seja, um custo comparável àquele obtido em projetos que utilizam fontes fósseis -, devido à escala e à altíssima eficiência desses sistemas quando operam em conjunto.
“Nos EUA, dois dos sete hubs de hidrogênio financiados pelo governo são nucleares. Há também o exemplo do projeto de geração de hidrogênio para autos suprimento das usinas da Constellation, em Nova York. A empresa decidiu investir quase 1 bilhão de dólares para expandir o projeto em outras usinas nucleares, após o sucesso do piloto”, conta a consultora e especialista em energia Karla Kwiatkowski.
Ela aponta que o Brasil tem um grande potencial para produzir hidrogênio a partir de usinas nucleares. Por exemplo, Angra 1 e 2 utilizam água do mar para resfriar os condensadores, e, como parte desse processo, há a necessidade de produzir hipoclorito de sódio, gerando hidrogênio de forma completamente sustentável, sem qualquer contato com material radioativo. “Basta implementar um sistema para capturar e aproveitar esse hidrogênio, que pode ser usado para abastecer uma pequena cidade, como a Vila de Mambucaba, que abriga os funcionários da Eletronuclear, ou na produção de combustível de baixo carbono”, projetou.
A especialista destaca também a chegada dos Pequenos Reatores Modulares (SMRs) ao mercado, que prometem gerar energia nuclear a preços mais baixos e demandando menores investimentos. Para Karla, alguns modelos de SMRs serão ideais para integrar hubs industriais, melhorando muito o business case para geração de hidrogênio devido à sua versatilidade em termos de aplicações, segurança, dimensão e potência, viabilizando projetos desse tipo tanto técnica quanto economicamente.
MOBILIZAÇÃO PARA A INCLUSÃO DA NUCLEAR NA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
Durante os debates para a elaboração da Política Nacional de Hidrogênio de Baixo Carbono, a indústria nuclear brasileira se posicionou a favor de uma alteração no texto, para garantir que essa fonte de energia não ficasse de fora desse novo mercado. Inicialmente, o marco legal estava redigido de forma a englobar apenas projetos que utilizassem fontes renováveis, como a eólica e a solar. No entanto, a redação final da lei passou a citar o “hidrogênio de baixa emissão de carbono”, o que também permite a participação de projetos que utilizam energia nuclear.
De acordo com a legislação aprovada, o hidrogênio de baixa emissão de carbono é aquele cujo ciclo de vida do processo produtivo resulte em um valor inicial menor ou igual a 7 quilos de dióxido de carbono equivalente por quilograma de hidrogênio produzido (7 kgCO2eq/kgH2). Além de regulamentar a produção de hidrogênio considerado de baixa emissão de carbono, o marco legal também oferece incentivos tributários.
“A lei vai incentivar, inicialmente, a produção de hidrogênio em Angra 1 e Angra 2, e futuramente em Angra 3. A legislação contém uma série de medidas voltadas para atrair investimentos na produção de hidrogênio. Sem contar que outras instalações no Brasil, como as que utilizarão os SMRs, também poderão produzir hidrogênio”, disse o presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN), Celso Cunha.
O dirigente da associação destaca que é fundamental que as políticas públicas brasileiras para a transição energética sejam inclusivas, especialmente em um país com um amplo mix de fontes na matriz energética. “A nossa mobilização é ampla e atinge várias frentes. Além de termos defendido a mudança no texto do marco legal do hidrogênio de baixa emissão, também estamos trabalhando junto ao Congresso Nacional nas discussões sobre o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten). O pedido do setor nuclear é por inclusão. Não queremos ser excluídos do processo de transição energética”, afirmou o presidente da associação.
Já o Diretor Técnico da ABDAN, Leonam Guimarães, enfatiza que a energia nuclear é uma fonte capaz de operar de forma contínua e confiável, garantindo a produção sustentável de hidrogênio em larga escala, independentemente das condições climáticas. “Ao incluir a energia nuclear no marco legal do hidrogênio, o Brasil não só diversifica suas opções energéticas, como também promove uma transição energética mais segura, sustentável e alinhada com as metas de desenvolvimento de longo prazo. A sinergia entre os projetos de lei em tramitação e os programas governamentais em execução será decisiva para o sucesso dessa estratégia, garantindo que o Brasil possa aproveitar plenamente o potencial do hidrogênio como combustível do futuro”, avaliou.
Por fim, Guimarães acrescentou que programas governamentais, como o Rota 2030, voltado para a indústria automotiva, e o Programa Nacional de Hidrogênio, que visa posicionar o Brasil como líder na produção e exportação de hidrogênio, podem se beneficiar enormemente da integração da energia nuclear. Ao assegurar uma fonte estável de energia de baixo carbono, o Brasil pode aumentar sua competitividade no mercado global de hidrogênio, ao mesmo tempo em que avança em seus compromissos climáticos internacionais.
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