PETROBRÁS VAI EXIGIR MAIS COMPETITIVIDADE DE ESTALEIROS E ABRE MÃO DA RESPONSABILIDADE PELO CONTEÚDO LOCAL
Com as novas metas firmadas para os próximos anos, a Petrobrás vem buscando alternativas de investimento que priorizem a obtenção de recursos e a redução de gastos em suas atividades. O objetivo é equilibrar as contas, que hoje sofrem com o peso de uma enorme dívida acumulada e dificultam a consolidação de novos empreendimentos para a empresa. É nessa perspectiva que entra a decisão da companhia por não contratar mais construções de plataformas no Brasil, dando preferência à prática de afretamento, opção tomada em conjunto com outras operadoras.
Na prática, a estatal aumenta os desafios para o desenvolvimento do setor naval e tenta se isentar de uma decisão que ela já sabe qual é: enviar para o exterior tudo o que poderia ser feito no Brasil, sob o argumento de que os nossos estaleiros não estão competitivos. Do jeito que o mercado se apresenta, as coisas estão complicadas – e muito por responsabilidade da própria Petrobrás.
O desenvolvimento do setor naval brasileiro terá uma nova prova de fogo nos anos que estão por vir, segundo o assessor da presidência da Petrobrás para conteúdo local, Paulo Alonso (foto). Para que consigam contratos com as afretadoras, afirma Alonso, os estaleiros brasileiros precisarão estar preparados e competitivos em relação às ofertas estrangeiras. Caso contrário, as empresas acabarão por optar pela construção de seus projetos em terminais fora do país:
“As afretadoras vão querer contratar no país se os estaleiros brasileiros conseguirem dar uma resposta à altura. Eles têm tempo pela frente para se preparar, porque ainda falta um tempo para chegarem essas contratações”.
Melhor do que ninguém, Alonso, como assessor e conselheiro do Presidente Bendine para conteúdo local, sabe que os estaleiros, sem apoio da estatal, não vão conseguir dar resposta às metas que as empresas contratantes estabelecerem. Na verdade, parece uma espécie de desculpa antecipada para contrariar a determinação do governo federal, ratificada pelo Secretário do Ministério das Minas e Energia, Marco Antônio Almeida, em recente palestra na Fundação Getúlio Vargas: “A política do conteúdo nacional não vai mudar.”
Ultimamente, a política de conteúdo nacional imposta ao mercado pela direção da estatal tem privilegiado mais as empresas da China do que as brasileiras. Estaleiros como os de Rio Grande, Enseada, na Bahia, e os do Rio de Janeiro têm passado por maus bocados. Não será em um futuro próximo, e sem apoio, que eles se reerguerão e se tornarão competitivos, como exige Paulo Alonso. Ao mesmo tempo em que afirma que “a Petrobrás não quer pagar multa”, o assessor da presidência da companhia diz também que “os afretadores podem querer contratar fora e pagar multa”. Se o responsável pelo conteúdo local da Petrobrás admite isso e não consegue se impor aos parceiros, mesmo o petróleo sendo explorado em águas brasileiras, os estaleiros não podem esperar muito do que virá pela frente.
A indústria naval, que aguarda ainda a resolução do acordo de reestruturação da Sete Brasil e a regularização da situação dos fornecedores da Petrobrás, vive momentos de incertezas e de grandes desafios para manter movimentado o mercado brasileiro com o ritmo em que estão os investimentos no país. Em entrevista ao Petronotícias, Paulo Alonso falou sobre a política da estatal para o setor:
Qual é a atual perspectiva quanto ao acordo com a Sete?
Vamos ver, porque isso não envolve só a Petrobrás, tem também a Sete Brasil e os bancos privados. Vamos ver se até setembro ou outubro chegamos a um acordo para que se possa finalmente resolver a equação financeira da Sete, e para que ela possa ter acesso a recursos financeiros, conseguindo, por sua vez, fazer os pagamentos aos estaleiros. Assim os estaleiros também poderão se aliviar financeiramente desses débitos que a empresa tem com eles.
Como está a definição do contrato com a QGI?
A Petrobrás chegou a um acordo com a QGI para a manutenção das plataformas P-75 e P-77 no Brasil, e agora está sendo finalizada a negociação no sentido de determinar a data em que efetivamente vai se retomar a construção dos módulos no Rio Grande do Sul. Mas agora é só um ajuste fino na negociação.
A Petrobrás retirou recentemente o bloqueio sobre contratos da TKK Engenharia. Esse processo deve se estender às outras fornecedoras?
A Petrobrás tinha 29 empresas bloqueadas, e depois chegaram a ser 33 no total. À medida que essas empresas vão resolvendo as suas questões com o TCU, com o CGU e com a própria Petrobrás, clareando a sua situação cadastral, elas vão voltando à situação original de cadastro. Então, conforme cada uma for se resolvendo com os órgãos do governo e fazendo acordos de leniência, elas voltam a ficar habilitadas com a companhia. Isso desde que elas não tenham pendências cadastrais, porque o cadastro da Petrobrás tem uma série de documentos que elas precisam apresentar para estarem ativas. Esse processo, que está sempre aberto, não fecha nunca.
O senhor afirmou que a Petrobrás dará preferência a afretamentos nos próximos anos. Já existe alguma licitação em curso?
O modelo preferencial da Petrobrás daqui para frente é afretamento, e não porque a companhia prefira isso. As decisões da Petrobrás são feitas agora com parceiros, e eles querem afretar, porque isso não envolve capital de investimento, você só paga uma taxa de utilização da plataforma lá na frente. Então, quem vai contratar construção de plataforma no Brasil não vai ser a Petrobrás, mas as empresas afretadoras.
Qual a expectativa para isso no atual cenário?
Os estaleiros têm que estar muito competitivos, preparados em termos de engenharia e celeridade no cumprimento de prazos, para que as empresas possam preferir os estaleiros brasileiros em detrimento dos estrangeiros. Caso contrário, os afretadores podem querer contratar fora e pagar multa de conteúdo local. A maior parte das empresas afretadoras do mundo já tem seus parceiros, seus estaleiros, mas o conteúdo local exigido é alto, e a multa também. Sendo operadora, recai sobre a Petrobrás o pagamento das multas de conteúdo, mas nós não vamos querer pagar. Nós vamos orientar as afretadoras a contratar no país. E elas vão querer contratar no país se os estaleiros brasileiros conseguirem dar uma resposta à altura. Eles têm tempo pela frente para se preparar, porque ainda falta um tempo para chegarem essas contratações.
Esse processo de novas contratações já começou na companhia?
Nós vamos agora ter uma contratação no campo de Sépia, que deve ir para o mercado, e vamos ter a contratação do piloto de Libra, que também vai para o mercado. São as duas primeiras.
O que a Petrobrás vê de fundamento, hoje, nas críticas à regra de conteúdo local?
A política de conteúdo local brasileira, por mais debate que exista, é considerada a mais madura do mundo atualmente. A Petrobrás não apresentou nenhuma sugestão de alteração na política de conteúdo local brasileira fora do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), porque trabalhamos em conjunto com as outras operadoras. Nós apresentamos, junto com o IBP, sugestões que foram entregues ao Ministro Eduardo Braga, no sentido de regulamentar o processo de waiver. Dentro da ANP, ele não é regulamentado. A agência fala sobre o waiver no contrato de concessão, diz que quando não se consegue cumprir o conteúdo local, e a concessionária demonstra que não conseguiu cumprir, é possível que se entre com um processo solicitando perdão pelo não cumprimento do conteúdo local. Mas, como se entra com esse pedido, que documentos devem ser apresentados? Isso é o que chamamos de regulamentação, então nós solicitamos à ANP que fosse colocada no papel a regulamentação do processo.
Houve alguma outra sugestão?
Há uma outra coisa que foi encaminhada à agência, que foi a revisão do conteúdo local global. Hoje, além do conteúdo local de todos os itens e subitens previstos na planilha da resolução 39, você também tem que atingir o conteúdo local global. E esse conteúdo que faz parte da planilha foi estabelecido lá atrás, quando não se tinha ainda a experiência de saber o que é um projeto de exploração feito no Brasil com essa política, e o que é um projeto de desenvolvimento de produção. Nós já temos hoje essa experiência, então vimos que os números estabelecidos há oito anos precisavam ser revisados. Eles foram superestimados. A agência acolheu esses pleitos do IBP, mas para a 13ª Rodada essas mudanças ainda não foram implementadas. A regulamentação de waiver também não entrou ainda, mas a ANP ficou de estudar e deve sair alguma coisa nesse sentido.
Fala-se em a Petrobras pagar multa; ANP, RFB e etc.
Mas a Petrobras aplica as multas previstas em seus contratos com rigor?
Só quem está a frente em operações/produção recebem dow time.