MENOR PREÇO DO PETRÓLEO DIMINUIRÁ FATURAMENTO DA PETROBRÁS E POSTERGARÁ PROJETOS DE PETROLEIRAS INTERNACIONAIS
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
Um novo dia nasce e, com ele, vem a insegurança de tempos difíceis para a economia global, sobretudo para o setor de óleo e gás. A expectativa nesta terça-feira (10) gira em torno sobre como reagirá o mercado após uma segunda-feira caótica para as finanças em todo o mundo. Aqui no Brasil, a nova crise do preço do barril do petróleo está colocando em xeque a decisão da Petrobrás de focar seus negócios em exploração e produção. Ao concentrar esforços apenas no petróleo, a estatal parece ficar vulnerável às flutuações do produto. O geólogo e membro da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), Luciano Chagas, alerta que se os preços do barril permanecerem na casa dos US$ 31, o faturamento da estatal piorará devido aos menores valores de venda do insumo. Chagas também acredita que a nova crise vai adiar os tão aguardados investimentos das petroleiras internacionais no Brasil: “As majors, mesmo as que compraram bons ativos brasileiros a preço de banana, postergarão os seus projetos e investimentos sob o risco de aumentarem ainda mais a oferta”, projetou.
Gostaria de uma avaliação sua sobre o atual momento do setor de óleo e gás em todo o mundo, dada as circunstâncias atuais.
A tríade coronavírus, petróleo e a atual política brasileira criam e alavancam a pior crise experimentada por nós nos últimos tempos. Pior é que nos acostumamos a pouco ou a não usarmos conhecimentos históricos inclusive os das crises pretéritas, associando-as aos fatos reais, para construirmos políticas duradouras e capazes de enfrentar as imprevisíveis e recorrentes catástrofes, cíclicas mesmo, como proposto por Georges Cuvier, cientista francês nascido em 1769.
Poderia então começar falando sobre o coronavírus e seu impacto no mercado?
O coronavírus, de origem chinesa, causa pânico em todo mundo e, segundo estimativas diversas, poderá reduzir em até 20%, no curto prazo, o consumo mundial de energia. O vírus atingiu a Itália com níveis de letalidade alarmantes, terror este que se espalha por toda a Europa e que já atravessou os oceanos, atingindo todos continentes e, especificamente, a nossa a América do Sul. Não alongando, a economia global está e será severamente mais impactada com a consequente diminuição do consumo de energéticos.
Qual será a consequência prática dessa diminuição de até 20% no consumo?
Aí entramos no segundo ponto da tríade – o petróleo. O mundo consome, atualmente, cerca de 275 milhões em barris de petróleo equivalente (boe) por dia. Destes, 87% refere-se à energia fóssil oriunda de petróleo (90 milhões), do carvão (81 milhões) e do gás (75 milhões). Estes três representam, respectivamente, 33%, 27% e 29% do consumo energético diário mundial.
Uma redução no consumo dos óleo e gás da ordem de até 20%, como eu disse anteriormente, representará uma disponibilidade adicional de energia em petróleo (boe) de 12,4% ou 34,1 milhões de barris diários. Esse valor deve ser acrescido de mais 3 milhões, produto da pendenga entre a Rússia (ávida por mais dinheiro) e Arábia Saudita – com a sua produção hoje represada via cota.
Ou seja, isso significa 37,4 bilhões de boe adicionados ao mercado diário, o que faz o preço do petróleo hoje valer US$ 31 (WTI) por barril, com tendência de baixa. Assim, os preços das petrolíferas despencam, a exemplo das ações nominativas da Petrobrás, vendidas há poucos dias por R$ 30 e que hoje valem apenas R$ 16,92, com tendência de cair ainda mais.
O senhor poderia agora falar sobre os aspectos da política brasileira e como eles podem alavancar os efeitos da crise?
Sobre o aspecto da política brasileira, especialmente da gestão atual da Petrobrás, o que provavelmente ocorrerá é que a venda de ativos de up, mid e downstream continuará, pois esta será a fonte exclusiva dos lucros, com foi feito praticamente em 2019. Em outras palavras, venderemos ativos para pagar como dividendos de 25% obrigatórios, de um lucro “fictício” e relativo a apenas um ano. Em outras palavras, beneficiaremos duplamente o capital financeiro, o comprador de bons ativos e também recebedor de bons dividendos.
A exemplo da majors privadas, ficaremos menores e com dividendos pagos maiores que o próprio fluxo de caixa, excluindo o gerado pelos ativos vendidos. Também sem bons ativos, fora os de explotação e produção, que também estão sendo vendidos sob a imposição da gestão Castello Branco, o lucro deles advindos não mais existirão.
O refino, por exemplo se torna um dos melhores ativos na geração de caixa, em tempo de petróleo com preços deprimidos. Se as refinarias forem vendidos, aumentará a disputa com a concorrência, na bomba, via importação de processados por conta da PPI. Isso é justo?
As exportações de petróleo brasileiro cru e processados continuarão em volume igual, pois há contratos de fornecimento de longo prazo, principalmente com a China. O problema será o valor da receita a menor, redundo, via preços internacionais baixos nos curtos e até médios prazos.
Os preços nas bombas hoje aumentados via preço de paridade internacional (PPI) deverão diminuir substantivamente, como também as receitas decorrentes em escala federal, estadual e municipal, que cairão a níveis alarmantes, se o quadro atual for mantido. O governo tomará algumas medidas emergenciais, como as já sugeridas por alguns dos ditos “especialistas”, como aumento de impostos correlatos, de modo que o consumidor será novamente enganado pela política de preços de agora, intuo, potencialmente flutuante, mais mutável ao sabor da conveniência dos “gestores” incapazes de gerar previsibilidades indispensáveis nos negócios, via confiança no governo.
Com a redução do número de empregados desejada pelo senhor Castello Branco, teremos mais desempregos no Brasil, ausência de novos investimentos nos ativos explotatórios e de produção. O PIB brasileiro cairá e nos tornaremos exportadores de matéria prima, cujos preços flutuarão ao sabor do sistema financeiro e das catástrofes naturais ou construídas com a eleição de administradores despreparados. As naturais, por serem cíclicas, poderiam ser até previsíveis com bases em modelos que usam inteligência artificial, suportadas em documentação pretérita.
Já que o senhor falou bastante da Petrobrás na última resposta, gostaria de explorar mais as possíveis consequências para a estatal nesse cenário de barril a US$ 30.
Com o petróleo na casa dos US$ 31,00, bem próximo do breakeven do preço do petróleo do pré-sal, mantendo-se a política prevista no plano de negócios de ter igual produção à de 2019, de 2,7 milhões barris/dia, o faturamento piorará, pois os preços de venda serão bem menores. Hoje, por exemplo, esses preços são 43% inferiores.
Também tenderá a manter a suicida política do preço de paridade internacional (PPI). Esta, aliás, que torna atualmente mais caro o preço dos combustíveis processados para os consumidores, justo o contrário do que prega a atual administração da empresa. Cerca de 15% a mais relativos aos preços internacionais são pagos adicionalmente por todos nós.
De que forma?
Explico: cada unidade de refino da Petrobrás tem um preço diferente em relação aos internacionais. A PPI acrescenta aos custos finais das refinarias Petrobrás, aos de todas, os valores das cabotagens, mais os hedges (seguros) de garantia de preço e mais os custos financeiros decorrentes das operações. Tais acréscimos oneram o consumidor brasileiro e aumentam os preços nas bombas, beneficiando assim e, exclusivamente, os concorrentes da Petrobrás por ganho do mercado, antes cativo da empresa.
E quanto às demais empresas de óleo e gás que operam no Brasil?
Os investidores que compraram ativos petrolíferos e não fizeram “hedges” dos preços de venda, certamente aumentarão ou terão mais prejuízos, pelos mesmos motivos dos das privatizações dos aeroportos, alguns já devolvidos e outros em crise, por absoluta falta de demanda por ausência de viajantes.
Outros investidores independentes, médios e pequenos, que produzem energia petrolífera e a transmitem via postes, terão dificuldades financeiras para alavancar os próprios projetos e impactos negativos e significativos nos seus caixas.
As majors, mesmo as que compraram bons ativos brasileiros a preço de banana, postergarão os seus projetos e investimentos sob o risco de aumentarem ainda mais a oferta. Vale ressaltar que estas mesmas “majors”,segundo Nick Cunninghan da “Oil Price”), têm investido cada vez menos na atividade petrolífera (US$ 87,7 bilhões em 2019 contra US$ 165,9 em 2013) e vêm a cada ano pagando mais dividendos aos investidores, oriundos do capital financeiro, da ordem de US$ 536 bilhões em 2019 contra um fluxo de caixa de US$ 329 bilhões, cobrindo a diferença negativa com empréstimos de US$ 207 bilhões, e se tornam cada vez mais investimentos de risco de baixa classificação pelas empresas de ratings. Esse parece ser o caminho escolhido pela gestores da Petrobrás.
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