PRESIDENTE DA ENBPAR APONTA OS NOVOS DESAFIOS DA EMPRESA E FALA DOS PRÓXIMOS PASSOS PARA RETOMADA DE ANGRA 3
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
Nascida em um momento de transformação do setor elétrico nacional, a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBPar) tem alguns poucos dias de vida, mas já carrega nas mãos grandes desafios. A companhia, oficialmente ativada no início deste mês, será responsável por assumir aquelas atividades da Eletrobrás que não poderão passar para as mãos da iniciativa privada. O escolhido para guiar a empresa nesses primeiros passos foi o vice-almirante Ney Zanella dos Santos, nosso entrevistado de hoje (18). O diretor-presidente da ENBPar cita quais serão os próximos desafios, como o estudo e a análise de uma série de documentos que estão sendo produzidos a partir da privatização da Eletrobrás. “A ENBPar vai fazer muitos contratos com a Eletrobrás. A modelagem desses contratos, acordos de acionistas, estatutos e a governança fazem parte dos nossos próximos passos”, declarou. Zanella falou também que a nova estatal está preparando-se para atuar como holding da Eletronuclear e ajudar no reinício das obras de Angra 3. “A conclusão da usina deve acontecer dentro de um prazo de 60 meses. É fundamental cumprir o cronograma de entrada da planta, já que cada ano de atraso no projeto representa um custo adicional de R$ 1 bilhão”, afirmou. O diretor-presidente da companhia também comentou sobre as políticas públicas que serão geridas pela ENBPar e disse que a ideia é que a empresa tenha um escritório operacional no Rio de Janeiro.
Para começar nossa entrevista, o senhor pode relembrar aos nossos leitores o contexto da criação da nova estatal?
A ENBPar foi concebida dentro do conceito que nasceu no processo de capitalização da Eletrobrás. Como já é de conhecimento do mercado, será realizada uma oferta de ações para diluir a participação do governo na Eletrobrás. A modelagem desse processo está sendo feita pelo Ministério da Economia, pelo BNDES e pelo Programa de Parcerias para Investimentos (PPI). Durante esse processo de privatização, algumas situações se apresentaram. Isto porque alguns setores que estavam debaixo do guarda-chuva da Eletrobrás não poderiam ser privatizados. A Lei 14.182/2021, que trata da desestatização da Eletrobrás, autorizou a União a criar uma empresa para assumir as tarefas que são típicas de Estado.
Assim, a ENBPar assumirá a Itaipu Binacional, que não é uma empresa clássica, pois se trata de uma companhia resultante de um tratado entre dois países. A nova empresa também fará a gestão da geração nuclear, que está sob monopólio da União. A ENBPar fará ainda a gestão de políticas públicas que até então vinham sendo realizadas pela Eletrobrás.
Após a ativação da empresa, no início deste mês, qual será o próximo passo dentro da ENBPar?
Basicamente, nossa primeira demanda agora é estudar a documentação sobre a privatização da Eletrobrás que está sendo produzida pelo BNDES. O processo de capitalização da Eletrobrás não se trata apenas da passagem das ações para as mãos de investidores privados. Existe uma série de cláusulas e requisitos que definem que a ENBPar será sócia da Eletrobrás. Isso porque a Eletrobrás vai continuar com algumas ações da Eletronuclear, uma vez que já investiu muito na construção das usinas nucleares. Esse financiamento que foi feito ainda está sendo pago.
A ENBPar vai fazer muitos contratos com a Eletrobrás. A modelagem desses contratos, acordos de acionistas, estatutos e a governança fazem parte dos nossos próximos passos. Todos esses documentos que o BNDES está produzindo têm que ser analisados pela ENBPar, pela Eletrobrás e pelo próprio Tribunal de Contas da União (TCU).
Qual será o papel da ENBPar na retomada das obras de Angra 3?
A Eletrobrás já adiantou muitos recursos para a retomada da construção de Angra 3. Foram estabelecidas duas etapas para o reinício das obras da usina. A primeira delas é o chamado Plano de Aceleração da Linha Crítica, que abrange toda a parte de infraestrutura e a obra civil. Em seguida, vem a parte da montagem eletromecânica e entrada em operação do reator. Será ainda necessário atualizar os sistemas de segurança para alcançarmos o licenciamento ambiental. Então, a ENBPar estará focada na Eletronuclear e na retomada de Angra 3 para adicionar mais 1,4 GW de geração nuclear na região Sudeste. A conclusão da usina deve acontecer dentro de um prazo de 60 meses. É fundamental cumprir o cronograma de entrada da planta, já que cada ano de atraso no projeto representa um custo adicional de R$ 1 bilhão.
Como será a estruturação da empresa?
A empresa está muito enxuta e pequena. E assim permanecerá. Como holding que seremos, assumiremos uma parte da gestão de Itaipu e Eletronuclear. Isso deve ocorrer após aprovação do TCU e da conclusão de todos os estudos, o que deve acontecer em meados de março, possivelmente.
Hoje, estamos incubados no Ministério de Minas e Energia. Ficaremos assim por um período inicial até a situação ficar mais definida. Após a aprovação do TCU, a ENBPar vai incorporar a Itaipu e a Eletronuclear e, logo depois, iremos organizar a estrutura da empresa. A tendência é a companhia ter um escritório operacional no Rio de Janeiro, junto da Eletronuclear. Algo muito pequeno. Nada comparado à dimensão da Eletrobrás.
O capital social da nossa empresa já foi integralizado, conforme estava no Orçamento da União. São, ao todo, R$ 4 bilhões. Esse dinheiro será usado para a ENBPar comprar da Eletrobrás a parte que lhe cabe de Itaipu e Eletronuclear.
O senhor tem frisado bastante a ideia de que a ENBPar será uma empresa bem enxuta. Já existe uma previsão mais concreta em relação ao tamanho da companhia?
A ENBPar terá um diretor-presidente e três outras diretorias: financeira, comercialização e gestão. Por uma questão de economia, estamos apenas com dois diretores atualmente. Só teremos a equipe da diretoria executiva completa no momento da capitalização da Eletrobrás. Quando chegar esse momento e o trem estiver andando, os passageiros vão entrando nos vagões. Com relação a número de pessoas, temos uma autorização nesse momento de 27 funcionários, no máximo.
Como todos sabem, a empresa pública tem por obrigação ter transparência, ouvidoria, sustentabilidade, gestão de risco, planejamento estratégico, relações institucionais, secretaria da governança, conselhos e comitê de auditoria. Todo esse complexo de uma estrutura funcional é exigida por lei para uma empresa pública. É isso que estamos fazendo nesse momento. Por isso temos esse número estimado pelo Ministério da Economia em até 27 pessoas. A orientação do governo é que a ENBPar seja uma empresa enxuta. Então, a ideia é investir em uma governança digital em alto estilo. Tudo isso bastante focado em uma demanda de poucas pessoas.
É importante levar essas informações para o público de modo a desconstruir esse conceito de que está criando-se mais uma estatal. Na verdade, o que está sendo feito é a redução do tamanho do Estado no setor elétrico. A privatização da Eletrobrás representa isso. Sabemos que nem tudo que a Eletrobrás faz atualmente pode ficar na mão do setor privado. Por isso, é importante que o Estado tenha o controle de políticas públicas. Inclusive, poderão vir outras políticas públicas daqui em diante, com certeza, principalmente quando se fala na área ambiental e energia limpa. Isso vai ajudar o país em seus compromissos de redução de emissões.
Aproveitando o gancho das políticas públicas, poderia mencionar rapidamente quais delas estarão sob a responsabilidade da ENBPar?
Sobre as políticas públicas, vale lembrar que o programa Luz para Todos já está quase no final. Mas ele se desdobrou em outro programa, que ainda está incipiente – o Mais Luz para a Amazônia. Estamos falando de um universo de até 300 mil pessoas sem acesso à energia elétrica. Além disso, existem outras demandas do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (PROCEL) e do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfra). A ENBPar também será responsável por bens da União sob administração da Eletrobrás (BUSA) e contratos do Fundo Reserva Global de Reversão (RGR), assinados antes de 17 de novembro de 2016.
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