PRODUÇÃO DE HIDROGÊNIO A PARTIR DE RENOVÁVEIS NO BRASIL ENFRENTA DESAFIOS ECONÔMICOS, AFIRMAM PESQUISADORAS
Considerado um elemento decisivo na transição energética, o hidrogênio verde é um dos combustíveis que mais tem ganhado destaque no Brasil e no mundo, por ser uma fonte limpa e de excelente potencial energético. Contudo, viabilizar a produção desse combustível ainda é um desafio em termos econômicos. Essa é uma das considerações de um artigo científico produzido pelas pesquisadoras brasileiras Drielli Peyerl (foto) e Sabrina Fernandes Macedo, que foi publicado recentemente na “International Journal of Hydrogen Energy” – considerada uma das principais revistas acadêmicas voltadas ao estudo dessa fonte. No trabalho, as autoras chegam a conclusão de que sistemas híbridos eólico e solar fotovoltaico para produção e armazenamento de hidrogênio conectados ao Sistema Interligado Nacional (SIN) ainda não são economicamente viáveis para o setor elétrico do país.
Um dos pontos investigados pelo estudo foi a viabilidade econômica de se produzir e armazenar hidrogênio verde no Brasil em sistemas híbridos, por meio da energia de restrições de rede em usinas renováveis existentes conectadas ao SIN. “As restrições de rede (curtailment events) ocorrem quando o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) solicita que plantas eólicas ou solares parem de gerar energia caso haja, por exemplo, algum processo de interrupção de rede ou então de geração acima da carga. Em tese, essa energia excedente poderia ser utilizada para geração de hidrogênio verde”, detalhou Sabrina.
Contudo, o estudo identificou que os períodos de restrições de rede seriam insuficientes para viabilizar a produção de hidrogênio verde. Isso porque, atualmente, cerca de 93% da energia eólica e solar produzida é utilizada no SIN. Assim, com um excedente anual na faixa de 3%, uma planta poderia dedicar-se à geração de hidrogênio apenas por 700 horas ao longo do ano. “Quando montamos o modelo econômico, com todos os custos da cadeia de produção de hidrogênio verde e também com esse número de horas, percebemos que o atual sistema híbrido é inviável do ponto de vista econômico”, concluiu Sabrina.
No artigo, as pesquisadoras afirmam que o custo econômico só será competitivo com novos sistemas híbridos eólicos ou solares dedicados em tempo integral à produção e armazenamento de hidrogênio. “O ideal é a usina operar acima de 3 mil horas com eletrolisadores ao custo de 650 dólares por kWe. Quanto maior o número de horas que a planta estiver dedicada à produção de hidrogênio, maior é a viabilidade econômica do projeto”, acrescentou Driell.
O trabalho foi desenvolvido com base em análises sobre o funcionamento das duas maiores usinas renováveis do Brasil: o complexo eólico Baixa do Feijão, no Rio Grande do Norte, e o complexo Sertão Solar Barreiras, na Bahia. Uma das principais barreiras no Brasil para a construção de sistemas híbridos com produção e armazenamento essencialmente focada em hidrogênio verde no Brasil é o custo de eletrolisers e dos sistemas de estocagem, aponta o estudo. “Essa indústria não está desenvolvida em escala mundial. Mas a previsão de agências como a Irena [sigla em inglês de Agência Internacional para as Energias Renováveis] é que o custo de produção desses equipamentos comece a cair por volta de 2030. O crescente interesse de empresas nacionais e internacionais na construção de plantas voltadas para a produção de hidrogênio verde deve contribuir para a redução de preços desses itens”, previu Sabrina.
Por sua vez, Drielli ressalta que o hidrogênio verde poderia contribuir para a segurança energética e trazer equilíbrio à rede elétrica por meio do armazenamento de energia. Porém, o processo completo da fonte não seria o mais lucrativo do ponto de vista econômico, já que a última etapa – a transformação desse hidrogênio verde de volta em energia – implica na adoção de sistemas a célula combustível, encarecendo o processo. “Comercializar hidrogênio verde é mais lucrativo do que transformá-lo novamente em energia. Ele pode ser vendido para setores como transporte ou indústria, a exemplo da siderúrgica e de fertilizantes. No caso, essa estratégia contribui não apenas para a mitigar os gases de efeito estufa, bem como favorece nossa competitividade industrial e o crescimento econômico”, finalizou Drielli.
O trabalho realizado pelas duas pesquisadoras está diretamente conectado ao Programa Jovem Pesquisador da Fapesp. Além desse programa, Drielli está vinculada ao IEE-USP e ao Research Centre for Greenhouse Gas Innovation (RCGI), centro de pesquisa financiado pela Fapesp e pela Shell.
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