RELEMBRE OS PRINCIPAIS FATOS DO ANO MAIS DESAFIADOR PARA A INDÚSTRIA DE ÓLEO, GÁS E ENERGIA NO BRASIL
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –
Quando o relógio marcou 0h do dia 1º de janeiro de 2020, o mundo não poderia imaginar que começava ali o ano mais desafiador dos últimos tempos para a humanidade. A pandemia de Covid-19 colocou o planeta de pernas pro ar e as indústrias de óleo e gás, mineração e energia não escaparam da crise. Para muitos, 2020 é digno de ser riscado do mapa. Mas, na verdade, é um ano que não pode ser esquecido jamais. Na Ciência, uma corrida desenfreada de pesquisas e estudos em busca da cura para a Covid-19. Na relação entre as pessoas, aprendemos a trabalhar de uma forma diferente, usando a tecnologia a nosso favor. Paradoxalmente, nunca estivemos tão unidos. Foi um ano sem os famosos eventos presenciais. Um ano sem OTC Houston, uma espécie de Olimpíada da indústria do petróleo. Quem poderia imaginar? Foi algo que aconteceu uma vez só, em 1984. Ainda assim, o setor não parou. Webinars e eventos online pipocaram aqui e ali. Empresas cortaram gastos, passaram a encarar a crise e, felizmente, muitas conseguiram sair de um ano turbulento ainda mais fortes. A criatividade e resiliência do empresário brasileiro falou mais forte. E por isso, 2020 será lembrado não só pela pandemia, mas pela superação da indústria. Hoje, nas últimas horas desse período tão desafiador, convidamos nossos leitores a relembrarem os principais fatos que marcaram nosso setor, já na expectativa de um 2021 com águas mais calmas, maré mansa e muita saúde para os brasileiros.
JANEIRO: Um início de ano promissor atingido por um inimigo invisível
Enquanto o governo chinês ainda escondia do mundo o surgimento de uma doença respiratória desconhecida, o setor de óleo e gás brasileiro começou o ano de 2020 com as expectativas lá em cima. Havíamos acabado de encerrar um ano repleto de leilões importantes, como o da Cessão Onerosa. A indústria dava claro sinais de retomada para, enfim, deixar para trás a crise de 2015. O preço do petróleo começou 2020 a todo o vapor, depois de uma alta valorização ao longo do ano anterior. O preço do barril Brent estava em US$ 66, enquanto que o WTI batia na casa dos US$ 61.
Ironias do destino, naquela altura, o governo brasileiro trabalhava em medidas para minimizar os efeitos da alta do petróleo. O motivo da valorização da commodity era a morte do general iraniano Qassem Soleimani.
Ainda em janeiro, o Brasil comemorava outra marca histórica alcançada em 2019. Durante o período, o país conseguiu pela primeira vez ultrapassar a marca de 1 bilhão de barris produzidos em um único ano. O volume total extraído foi de 1,018 bilhão de barris – valor 7,78% maior em relação ao produzido em 2018. No cenário regulatório, mudanças: o então diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, renunciou ao comando do órgão regulador antes do fim do seu mandato, que terminaria em dezembro.
No setor elétrico, a boa novidade era o recorde de geração de energia de Angra 1, que produziu 5.546.164 megawatts-hora (MWh) em 2019, superando sua melhor marca, obtida em 2012 (5.395.561 MWh). Já no campo da pesquisa e da ciência, o ano começou com uma nota triste: a morte do engenheiro Antonio Ricardo Droher Rodrigues, líder da equipe de engenharia que desenvolveu a construção do acelerador Sirius (que seria inaugurado meses depois).
Na Petrobrás, a notícia da vez era a chegada do navio-plataforma P-70 ao Rio de Janeiro, que seria instalado depois em Atapu. Durante o transporte do FPSO, um trabalhador morreu e outros cinco precisaram de atendimento médico após a ingestão acidental de álcool etílico. Outra petroleira, a Equinor, instalou a sua nova plataforma no campo de Peregrino, na Bacia de Campos.
Tudo pareceria ir bem quando 2020 botou as garras de fora e já mostrou que seria um ano daqueles. Primeiro, o ciclone subtropical Kurumí colocou em alerta as plataformas de petróleo na costa brasileira. Depois, uma forte chuva trouxe mais um incidente para o histórico da P-70, que ficou à deriva e foi bater nas praias de Niterói (RJ). Enquanto isso, a tal doença desconhecida na China se revelava para o mundo: era um novo coronavírus, que já em janeiro reduziu o ritmo da indústria no país asiático.
Diante da ameaça, a Petrobrás e a Vale decidiram repatriar seus funcionários que estavam trabalhando em Cingapura, China, Indonésia e Japão. E como se não bastasse, na Oceania, um incêndio devastador na Austrália chocava o mundo e lançava toneladas de dióxido de carbono na atmosfera.
A maratona de desafios e obstáculos só estava começando.
FEVEREIRO: Coronavírus coloca a economia mundial em xeque e a greve dos petroleiros
Já em fevereiro, os efeitos de um vírus ainda pouco conhecido e as medidas de isolamento e restrições de deslocamento bateram forte no preço do barril de petróleo, que caiu naquela altura para o menor nível desde dezembro de 2018. Aqui no Brasil, o inimigo invisível também começou a trazer impactos na economia em fevereiro. Do outro lado do mundo, na China, o processamento diário de óleo despencou pelo menos em três milhões de barris de petróleo por dia.
Enquanto o coronavírus dava suas primeiras cartadas lá na Ásia, aqui no Brasil estourou uma greve de petroleiros, reivindicando contra o fechamento da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen/ANSA). Foi um enredo cheio de emoções, com direito a ocupação de uma sala na sede da Petrobrás por parte dos grevistas – o espaço teria até a energia desligada pela estatal e religada novamente por determinação da Justiça.
Os grevistas não arredaram o pé e reivindicaram a suspensão das demissões na Fafen/ANSA. O presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, também não quis dar o braço a torcer em um primeiro momento, dizendo que a estatal “estaria pronta para enfrentar uma longa greve”. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) fez o papel do deixa disso e tentou intermediar. Primeiro, declarou o movimento grevista como ilegal. Depois, ajudou a costurar um acordo de conciliação entre as partes. Passados 20 dias, os grevistas decidiram suspender a paralisação e iniciar uma rodada de negociações.
Na política energética, o Ministério de Minas e Energia lançou o Plano Decenal de Energia (PDE) 2029. O documento trouxe a previsão de que a frota nacional de FPSOs cresceria em mais 42 unidades até 2029. Além disso, a produção de petróleo foi estimada em 5,5 milhões de barris por dia naquele ano. Outra novidade do PDE 2029 foi, pela primeira vez, a inclusão do indicativo de novas usinas nucleares. A propósito, fevereiro também teve o Fórum de Energia Brasil-Estados Unidos, com a presença do Secretário de Energia dos EUA, Dan Brouillette. Durante o evento, foi assinado um Memorando de Entendimento que amplia a cooperação bilateral entre a Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN) e o Instituto de Energia Nuclear (NEI, na sigla em inglês).
Por fim, mais dois marcos importantes. Enquanto o país brincava o carnaval, a Petrobrás começou o Teste de Longa Duração (TLD) de Farfan, localizado a aproximadamente 70 quilômetros da costa do Sergipe, em lâmina d’água de aproximadamente 2.500 metros. Trata-se do poço mais profundo que a estatal já colocou para produzir no Brasil. Além disso, outra excelente notícia: a produção brasileira ultrapassou a barreira dos 4 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boe/d).
Porém, um complicado mês de março nos aguardava.
MARÇO: Bolsas e petróleo em queda livre e petroleiras acusam o golpe
Em março, quando o mundo viu a Itália cair de joelhos diante da agora já batizada Covid-19 (nome da doença causada pelo coronavírus Sars-Cov-2), o pânico tomou conta dos investidores. Ainda era domingo no Brasil quando o mercado asiático iniciava seus trabalhos no dia 9 de março. Foram apenas alguns minutos de pregão para presenciarmos uma queda brusca e assustadora nos preços do barril de petróleo.
O valor do insumo chegou a recuar 31%, ficando na casa dos US$ 30 por barril. Mas não era só o coronavírus o pivô do salseiro. A falta de acerto entre a Organização dos Países Exportadores do Petróleo (Opep) e a Rússia, que não chegaram a um acordo para diminuir a produção da commodity, completou o quadro. Pronto. Estava formada a tal da tempestade perfeita.
Enquanto as bolsas de valores sofriam, o medo do contágio pela Covid-19 começou a afetar os eventos. A OTC Houston foi adiada para o terceiro trimestre do ano. Já naqueles dias, os Estados Unidos sofriam com seus milhares de casos da enfermidade. O adiamento era uma tentativa de salvar a edição do evento de 2020, que acabou não acontecendo.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, viajou naquele mês aos EUA e sua comitiva voltou de lá com alguns infectados. Bolsonaro, por sua vez, escapou da doença naquela ocasião. Seria contaminado mais adiante, em julho, e passou pela doença sem complicações. O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, também foi contaminado pelo vírus. Sem sintomas, ficou isolado por alguns dias despachando de casa e voltou a Brasília no final de março.
As segundas-feiras de março não foram nada fáceis. No dia 16, os preços de barril despencaram de novo, com cotação a US$ 29 e desvalorização de 10%. Na Bolsa de Valores B3, em São Paulo, o nervosismo dos investidores fez os papéis desvalorizarem 12%. A crise já estava instalada quando as petroleiras anunciaram as primeiras medidas de contenção. Afinal, quem não muda de caminho é trem.
A Saudi Aramco anunciou redução nos seus investimentos para 2020. A Chevron decidiu cortar em US$ 4 bilhões o seu CAPEX previsto para o ano. Já a ExxonMobil declarou que iria cortar custos para encarar um “ambiente sem precedentes”. A Petrobrás também se preparou para a guerra. Primeiro, decidiu suspender suas viagens no Brasil e no exterior e adotou medidas de prevenção em plataformas. Depois, anunciou que iria reduzir o efetivo em suas unidades offshore para o mínimo necessário. Por fim, a estatal também cortou investimentos, postergou pagamentos e hibernou plataformas em águas rasas.
O enredo de março teve ainda dois acidentes: um incêndio na sonda semissubmersível Alpha Star, que pertence à Constellation, e um choque entre a embarcação Batuira e o navio-plataforma P-77.
Em Brasília, duas novidades no tabuleiro da regulação brasileira de óleo e gás. A primeira foi a escolha de José Mauro Ferreira para assumir a Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia. Depois, foi a vez do ministro Bento Albuquerque anunciar o almirante Rodolfo Saboia como novo diretor-geral da ANP. Ele só assumiria o cargo em dezembro.
ABRIL: Fundo de poço – o barril com cotação negativa
O noticiário continuava pesado. O Brasil já era afetado em cheio pela Covid-19, com números de mortos em elevação, cidades esvaziadas, indústrias paradas e muitos desafios à frente. A Petrobrás foi categórica e disse que essa seria a pior crise dos últimos 100 anos no setor de óleo e gás. Além disso, as dificuldades logísticas com as suspensões dos voos vindos de Rússia, Holanda e África do Sul para o Brasil trouxe dificuldades de abastecimento de radiofármacos usados no combate e diagnóstico de câncer.
Nessa hora, começou a brotar a solidariedade. As empresas Chevron, Ipiranga, Raízen, Repsol Sinopec Brasil e Shell, juntamente com o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), fizeram uma doação para construção de um hospital de campanha no Rio de Janeiro. A Petrobrás também fez diversas doações. No exterior, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) despachou um lote de equipamentos e kits, utilizados em uma técnica derivada de tecnologia nuclear para diagnosticar a Covid-19.
Em meio ao cenário econômico difícil, o governo resolveu suspender a 17ª Rodada de Licitações, que estava prevista inicialmente para este ano. O leilão seria adiado definitivamente tempos depois. O governo também decidiu adiar a privatização da Eletrobrás para 2021. Nos EUA, a organização da OTC Houston finalmente deu o braço a torcer e cancelou o evento. Ainda em território americano, a ExxonMobil anunciou ao mercado que iria reduzir seu investimento de 2020 em US$ 10 bilhões, saindo de US$ 33 bilhões para US$ 22 bilhões.
Voltando ao Brasil, as obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) tiveram ritmo reduzido em 70% devido à pandemia. Além disso, a Petrobrás iniciou também a hibernação de 62 plataformas em águas rasas. A boa notícia do mês ficou com o acerto entre a Organização dos Países Exportadores de Petróleo, a Rússia e outros grandes produtores de petróleo. reduzir a oferta do produto no mercado internacional. como forma de ajudar a equilibrar o mercado e elevar novamente os preços da commodity.
O mês de abril já ia chegando ao fim quando os preços do barril viveram um dia que ficou marcado na história. Os contratos de maio do barril de petróleo (WTI), negociados nos EUA, mergulharam na maior desvalorização da história, chegando a despencar cerca de 300%, cotado a – US$ 37. Era o resultado de uma demanda em queda livre e excesso de oferta.
MAIO: Apesar de desafios, setor nuclear reage
A pandemia ainda avançava, mas já em maio era possível ver a indústria brasileira esboçando uma reação após o susto inicial causado pela Covid-19. O setor nuclear, por exemplo, fez alguns avanços importantes. A Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), por exemplo, reuniu um grupo de figuras centrais do segmento para formar o seu Conselho Curador. O presidente escolhido para o grupo foi o almirante Marcos Sampaio Olsen, que é o Diretor-Geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha.
Enquanto isso, a Nuclebrás Equipamentos Pesados (NUCLEP) completou 40 anos de existência, com importantes entregas para o setor nuclear e se movimentando também para diversificar sua atuação para óleo e gás, transmissão e defesa. Enquanto isso, a Eletronuclear apresentou ao mercado o plano de aceleração da linha crítica das obras de Angra 3, para garantir que a planta entre em operação em 2026. Outra novidade importante foi o anúncio de um novo curso de engenharia nuclear em 2021 na Universidade de São Paulo (USP).
Pelas bandas do setor de óleo e gás, a situação ainda era complicada. A Equinor, por exemplo, amargou um prejuízo líquido de US$ 710 milhões no primeiro trimestre. Nas prestadoras de serviço, as dificuldades eram igualmente grandes. A Halliburton cortou mais de mil empregos e a redução na sua força de trabalho batia quase 5 mil pessoas.
Aqui no Brasil, a Petrobrás decidiu desmobilizar as atividades de manutenção em plataformas, atingindo 4.500 funcionários. Ainda em abril, a estatal registrou um prejuízo de R$ 48,5 bilhões referente ao primeiro trimestre do ano.
JUNHO: A maré começa a virar para o setor de óleo e gás
Ainda longe de uma normalidade, a indústria de óleo e gás teve um junho mais ameno e sem tantos problemas. A taxa de utilização das refinarias no Brasil já estava retomando aos patamares de pré-pandemia, enquanto que o Ministério de Minas e Energia apresentou um cronograma indicativo para os leilões de Sépia e Atapu, na Cessão Onerosa.
O IBP, por sua vez, anunciou a criação da Associação Brasileira de Downstream (ABD), priorizando a garantia do abastecimento no país e propondo uma profunda revisão do modelo tributário de toda a cadeia de valor de óleo e gás. Ao mesmo tempo, a Petrobrás colocava em operação mais uma de suas plataformas: a P-70, em Atapu, no pré-sal da Bacia de Santos. A petroleira anunciou também em junho que voltaria com a sua jornada de oito horas e que teve um recorde de produção no campo de Búzios.
JULHO: O plano de expandir a produção de Búzios e as vendas de refinaria são contestadas
A Petrobrás seguia normalmente com seu plano de vender até oito de suas refinarias para a iniciativa privada, quando foi pega de surpresa por um questionamento feito pelas Mesas da Câmara e do Senado. O pedido feito pelo Congresso para barrar os desinvestimentos em refino dividiu opiniões no mercado.
Dias depois, o governo apresentou a primeira versão do Plano Nacional de Energia 2050, que trouxe alguns indicativos importantes. Para o setor nuclear, o documento apontou a expansão do parque de geração da fonte no Brasil em volume entre 8 GW e 10 GW. Já em óleo e gás, o plano disse que a produção deveria subir para 5,5 milhões de barris diários em 2030 e permanecer nesse patamar até 2050.
Voltando a falar da Petrobrás, a empresa decidiu, preventivamente, interromper o fornecimento de um lote de gasolina de aviação importada após testes realizados em seu centro de pesquisas (Cenpes). A companhia identificou que este lote apresentou um teor de compostos aromáticos diferente dos lotes até então importados, embora de acordo com os requisitos de qualidade exigidos pela Agência Nacional de Petróleo (ANP).
Ainda sobre a estatal brasileira, o mês de julho foi bem dourado para a joia da coroa da empresa – o campo de Búzios. Primeiro, porque o ativo voltou a bater um novo recorde de produção, registrando 674 mil barris de óleo por dia e 844 mil barris de óleo equivalente por dia. Depois, a petroleira anunciou que uma nova fase do campo seria iniciada em 2024. A ideia da Petrobrás é contratar três novos FPSOs para o campo, sendo dois deles próprios e um afretado. Até 2030, Búzios deve demandar um total de 12 novas plataformas e assumirá o posto de maior ativo da estatal, com uma produção de mais de 2 milhões de barris de óleo equivalente por dia. No segundo semestre do ano, a estatal amargou um prejuízo de R$ 2,7 bilhões.
Para fechar julho, a Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia elaborou um novo conjunto de metas e ações para o setor brasileiro de mineração para o período de 2020 a 2023. Ao todo, o Programa Mineração e Desenvolvimento (PMD) totaliza 108 metas, que estão espalhadas dentro de 10 projetos.
AGOSTO: A indústria de energia brasileira já dá sinais de recuperação
O mês de agosto continuou demonstrando que o setor de óleo, gás e energia do Brasil ainda sofria com a crise da pandemia, mas já dava sinais de recuperação em relação ao início do ano. A Omega Geração, por exemplo, investiu R$ 1,5 bilhão na aquisição da totalidade da participação da Eletrobrás no Complexo Chuí, localizado no Rio Grande do Sul, um dos maiores projetos eólicos do Brasil, que soma capacidade total de 582,8 MW e está operacional desde 2015.
O campo de Búzios da Petrobrás voltou a brilhar mais uma vez e conseguiu novos recordes de produção. Outra novidade importante da indústria nacional foi o lançamento de uma tecnologia genuína do Brasil, o drone ATOBÁ, da Stella Tecnologia, o maior VANT do hemisfério sul, com 11 metros de envergadura, 500 quilos e capaz de voar 28 horas ininterruptas.
Ainda falando de notícias boas, agosto teve ainda a cerimônia de inauguração da Termelétrica Porto de Sergipe I. A planta tem potência de 1,5 GW com consumo de 6 milhões de metros cúbicos por dia de gás. Pode atender 15% da demanda do Nordeste – o equivalente a 16 milhões de cidadãos. No pré-sal, os campos da camada conseguiram pela primeira vez alcançar os 70% de participação na produção nacional de óleo e gás do Brasil.
Em Brasília, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) bateu o martelo e aprovou a realização da 17ª e 18ª rodadas de licitação nos anos de 2021 e 2022, respectivamente. Os leilões seriam realizados neste ano e no próximo, mas foram adiados por conta da crise desencadeada pela Covid-19 e pela queda na demanda mundial de petróleo.
O lado negativo de agosto ficou por conta dos problemas ambientais e fenômenos naturais. Primeiro, o navio petroleiro MV Wakashio derramou óleo na costa das Ilhas Maurício. Depois, uma onda de calor intenso fez passar sufoco o sistema elétrico da Califórnia, que quase vivenciou um apagão. E ainda o furacão Laura assustou os Estados Unidos e chegou a reduzir em 80% a produção de óleo e gás no Golfo do México.
SETEMBRO: Nova Lei do Gás, primeiro voo do caça Gripen e aumento no preço do aço
O mês de setembro começou com a tão aguardada aprovação da Nova Lei do Gás pela Câmara dos Deputados. O objetivo da nova legislação é implantar o regime de autorização em vez de concessão para o transporte de gás natural e estocagem em jazidas esgotadas de petróleo. A expectativa de ver a matéria aprovada também no Senado e seguindo para sanção presidencial seria frustrada mais adiante. O início de setembro trouxe mais uma perda para a engenharia nacional com a morte do professor Pedro Carlos da Silva Telles, de 95 anos. Como legado, ele deixou escrito 13 livros de engenharia e foi responsável pela formação de centenas de novos engenheiros.
A temporada de furacões no Oceano Atlântico seguia intensa. Em setembro, foi a vez de Sally causar o fechamento de plataformas no Golfo do México. Enquanto isso, aqui no Brasil, os petroleiros aprovaram o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) com a Petrobrás para o período 2020-2022. Entre os principais pontos do novo acerto, a empresa se comprometeu a não promover demissões sem justa causa até agosto de 2022.
O mês teve também um susto para os trabalhadores da plataforma P-69, no então campo de Lula (que voltaria a se chamar Tupi logo depois). Um princípio de incêndio em um dos transformadores da unidade chegou a paralisar a produção, que foi retomada em seguida.
Os problemas e desafios para a indústria não pararam por aí. No momento de retomada das atividades, diversos setores começaram a sentir a falta de um insumo primordial: o aço. Além da escassez, os aumentos no preço do produto deixaram empresários de todo o país com o cabelo em pé. Naquela altura, uma elevação de até 80% no preço do aço colocava a economia do Brasil em risco.
Mas nem tudo foi crise em setembro. A Força Aérea Brasileira (FAB) teve seu dia de celebração com o primeiro voo no país do caça Gripen E Brasileiro. Em óleo e gás, a Petrobrás anunciou que o campo de Tupi bateu um novo recorde de produção acumulada, ao atingir a marca de 2 bilhões de barris de óleo equivalente (fato que ocorreu em julho e só foi divulgado em setembro). Por fim, a estatal assinou contratos de compartilhamento de suas infraestruturas de escoamento e processamento de gás natural com os sócios nos gasodutos offshore do pré-sal da Bacia de Santos: Petrogal Brasil, Shell Brasil e Repsol Sinopec Brasil.
OUTUBRO: Julgamento da venda das refinarias e a inauguração do Sirius
Um dos pontos altos de outubro foi, sem dúvida, o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o processo de venda das refinarias da Petrobrás. A votação terminou em 6 a 4 a favor da continuidade dos desinvestimentos. Como se sabe, o julgamento sobre o tema na Corte foi originado após as mesas do Senado e da Câmara dos Deputados questionarem a forma como está sendo conduzida a alienação das refinarias. Durante seu voto, o ministro Ricardo Lewandowski citou partes da entrevista publicada pelo Petronotícias com o engenheiro Ricardo Maranhão, um crítico à venda das refinarias.
Ainda falando sobre Brasília, o Ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, declarou em outubro que o Brasil está avançando no estudo do potencial da regulamentação e dos mercados de hidrogênio. Na ocasião, ele disse que o país tem o potencial de gerar hidrogênio verde de forma competitiva e eficaz, tanto para consumo doméstico quanto para exportação.
Na Petrobrás, a novidade da vez era a inauguração de um centro de excelência em Analytics e Inteligência Artificial (IA). Com a nova unidade, a petroleira pretende garantir que o volume de informações gerado, diariamente em suas operações seja processado de forma mais inteligente e segura. Ainda em outubro, a estatal resolveu cancelar a licitação para contratação de um novo navio-plataforma para o campo de Itapu, dentro da Cessão Onerosa da Bacia de Santos. Ao mesmo tempo, a petroleira anunciou que a unidade que produzirá na área será o FPSO P-71. A companhia ainda divulgaria um prejuízo de R$ 1,5 bilhão no terceiro trimestre.
No campo da ciência e pesquisa, um marco para o Brasil. O presidente Jair Bolsonaro inaugurou a primeira linha de luz do acelerador de partículas brasileiro, o Sirius. O equipamento científico será usado para gerar um tipo especial de luz, a síncrotron, usada em aplicações variadas, desde saúde e medicamentos até a exploração de petróleo, bioquímica e energia. O Petronotícias publicou uma entrevista especial com a pesquisadora Nathaly Archilha, que detalhou as aplicações do projeto para o mercado de O&G. Já a Amazul anunciou o seu plano de desenvolver centros de irradiação no Brasil para esterilização de produtos de diversos setores. As tecnologias nucleares podem ser usadas para irradiação de alimentos, medicamentos, cosméticos, insumos para a área médica e outras indústrias.
Nos Estados Unidos, mais um furacão chegou assustando, o Zeta. A temporada de tormentas em 2020 foi tão intensa que acabaram os nomes na lista criada pela Organização Meteorológica Mundial. Por isso, os furacões ganharam nomes de letras do alfabeto grego.
NOVEMBRO: O Amapá às escuras e a ascensão de Joe Biden ao comando dos EUA
O ano de 2020 já tinha aprontado das suas, mas ainda tinha mais surpresas desagradáveis na manga. Era dia 3 de novembro. O que era pra ser mais uma terça-feira comum na vida dos amapaenses se tornou um martírio que durou 20 dias. Um apagão jogou o estado na escuridão após um incêndio danificar os transformadores da subestação Macapá.
A energia no estado só começou a voltar cinco dias depois. Mas de forma parcial. O caminho para restabelecer a energia no estado exigia uma verdadeira operação de guerra, envolvendo transporte de geradores pela FAB, deslocamento de transformadores substitutos e envio de suprimentos para a população do estado. A energia só voltou plenamente na manhã do dia 24 de novembro.
Enquanto isso, os Estados Unidos estavam passando por um momento de mudança. O republicano Joe Biden venceu o democrata Donald Trump e se tornou o novo presidente da maior potência do planeta. A ascensão de Biden representa também uma mudança nos rumos da política energética dos EUA. Além disso, Biden garantiu que iria colocar o país novamente no Acordo de Paris, que havia sido abandonado por seu antecessor. A vitória do democrata também pode representar o fim do projeto de oleoduto Keystone XL.
Voltando ao Brasil, uma tendência que pegou forte no setor de energia no país foi a realização de eventos virtuais, diante da impossibilidade das reuniões presenciais. A Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (ABDAN) elevou essa prática para um outro nível e realizou o Nuclear Trade and Technology Exchange (NT2E) em uma plataforma exclusiva, com estandes virtuais, palestras online e transmissão a partir de estúdios.
O ministro Bento Albuquerque esteve na abertura do evento e anunciou que o governo vai desenvolver uma política de incentivo para a formação de um cluster nuclear. Além disso, o ministro também revelou que o Brasil vai retomar as pesquisas sobre potenciais sítios que podem receber eventuais novas centrais nucleares.
No setor de óleo e gás, a Petrobrás aprovou seu novo plano de negócios, com investimentos de US$ 55 bilhões para os próximo cinco anos. O volume de recursos é 27,4% menor na comparação com a versão inicial do planejamento estratégico anterior, anunciado em novembro de 2019, que apontava para investimentos de US$ 75,7 bilhões. Enquanto isso, um atentado no Irã matou o principal cientista nuclear do país, Mohsen Fakhrizadeh.
Novembro trouxe ainda mais uma perda para a engenharia brasileira. O fundador da TR Consultoria, Tadeu Maia, se tornou mais uma vítima da Covid-19.
O mês teve também dois importantes eventos: a Mossoró Oil & Gas, no Rio Grande do Norte; e a abertura da Rio Oil & Gas 2020, que foi realizada totalmente no formato digital.
DEZEMBRO: A despedida de um ano desafiador
O ano de 2020 se aproximava do fim quando a Indústrias Nucleares do Brasil (INB) retomou a produção de urânio, com o início da lavra a céu aberto da Mina do Engenho, localizada na Unidade de Concentração de Urânio de Caetité, na Bahia. Quando alcançar sua capacidade plena, o empreendimento poderá produzir 260 toneladas de concentrado de urânio por ano.
Na esfera governamental, a ANP realizou o segundo ciclo da Oferta Permanente, único leilão de áreas de petróleo e gás do ano. Durante a licitação, o governo federal falou da possibilidade de incluir áreas do pré-sal nesse tipo de certame em um futuro próximo. Além disso, está em estudo a inclusão de sítios para captura de carbono e estocagem de gás natural durante os leilões da ANP. Ainda falando em leilões, o Ministério de Minas e Energia publicou no Diário Oficial da União os calendários de leilões para contratação de energia elétrica ao longo período entre 2021 e 2023.
No noticiário da Petrobrás, a venda das refinarias ia muito bem, com a previsão de conclusão do processo para o primeiro semestre de 2022. Aliás, a estatal concluiu em dezembro a fase de negociação com o Grupo Mubadala no âmbito do processo para venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia. A Petrobrás também ganhou as manchetes por ter cancelado duas importantes licitações: a do projeto de adequação de infraestrutura da Unidade de Tratamento de Gás Monteiro Lobato (UTGCA) e das 92 Estacas Torpedo de 120 toneladas. Nos dois casos, o mercado reagiu com indignação por conta da forma como a petroleira conduziu a situação.
A Marinha do Brasil teve uma manhã de glória, com o lançamento ao mar do submarino Humaitá, o segundo da série do Programa de Submarinos da Marinha (PROSUB). A cerimônia para festejar o marco histórico aconteceu no Complexo Naval de Itaguaí (RJ), mas os motivos de celebração não pararam por aí. O evento também teve a operação de integração final das seções do submarino Tonelero, a terceira unidade prevista dentro do PROSUB.
Em Brasília, um banho de água fria em quem esperava a aprovação da Nova Lei do Gás. Os senadores mexeram no texto, que voltou para a Câmara dos Deputados. Sanção presidencial agora, só em 2021.
A japonesa Modec movimentou o mercado com o anúncio de que estima abrir 600 novos postos de trabalho entre as áreas onshore e offshore, até 2024. Apenas para o ano que vem, 85 novas vagas são projetadas.
A Retrospectiva 2020 vai chegando ao fim lembrando de novas figuras que despontaram no setor de óleo e gás brasileiro. Após uma espera de alguns meses, Rodolfo Saboia finalmente tomou posse na direção geral da ANP. Na ExxonMobil, o executivo Juan Lessmann foi escolhido para ser o novo presidente da companhia no país. Já a norueguesa Equinor escolheu Veronica Rezende Coelho como sua nova presidente para o Brasil.
Em um balanço de fim de ano, o ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque destacou alguns dos principais marcos de 2020, como a operação da usina nuclear Angra 2, que completou um ciclo de geração de energia de 13 meses de forma contínua, com fator de capacidade de 99,43%. Em energias renováveis, a geração eólica conseguiu o recorde de 12.229 MW de geração em outubro, o suficiente para abastecer 32 milhões de pessoas.
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