VENINA VELOSA CONVOCA FUNCIONÁRIOS DA PETROBRÁS A DENUNCIAR IRREGULARIDADES NA EMPRESA
Uma coisa é certa, quando os participantes da comissão que está apurando irregularidades na Petrobrás decidiram afastar a ex-gerente Venina Velosa envolvendo seu nome em irregularidades, não imaginavam a confusão que iriam criar. A conhecida “comissão do terror”, como está sendo chamada internamente, deve estar arrependida. Depois da sinceridade de Venina exposta na entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo, na noite deste domingo (21), todos devem estar se sentindo envergonhados. Se tem alguém que mentiu, depois da entrevista de hoje, se viu claramente que não foi Venina.
A Petrobrás continua no trabalho de desconstruir a imagem de Venina Velosa, desde que as denúncias surgiram. Ao chamá-la de “empregada”, revela um claro sinal de tentar desmerecê-la e desprestigiá-la. Até mesmo a própria Presidente Graça Foster, até então amiga de Venina, disse para jornalistas, num café da manhã realizado na semana passada, que não entendeu a mensagem de Venina quando ela falou sobre “esquartejamento de contratos”. Sobre isso, a resposta de Venina à repórter Glória Maria foi cabal: “Como gestora ela deveria, pelo menos, me questionar sobre o que era esquartejamento de contrato”. Venina Velosa disse que vai até o fim em suas denúncias e que todas as provas do que disse, todos os documentos, inclusive seu computador, já estão com o Ministério Público e convidou seus colegas na companhia a denunciarem tudo o que sabem sobre o que está errado na empresa.
Veja a reprodução completa da entrevista:
O COMEÇO DAS DENÚNCIAS
“Desde que eu percebi que havia irregularidades na minha área. Isso aconteceu em 2008. Desde 2008, eu venho reportando esses problemas aos meus superiores, o que culminou agora eu estar levando essa documentação toda ao Ministério Público”.
TIPOS DE IRREGULARIDADES
“São vários tipos. Irregularidades de pagamento de serviço não prestado de contratos que, aparentemente, estavam superfaturados; de negociações que eram feitas onde eram solicitadas comissões para pessoas que estavam negociando e uma série de problemas que feriam o código de ética e conduta da empresa”.
COMUNICAÇÃO AOS SUPERIORES
“Informei à todos os meus superiores. Informei ao gerente executivo, aos diretores e até a presidente da empresa. Num primeiro momento, em 2008, como gerente executiva, eu informei ao então diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa. Informei a outros diretores como a Graça Foster e, em outro momento, como gerente geral, eu informei aos meus gerentes executivos, José Raimundo Brandão Pereira executivo, e o Abílio Paulo Pinheiro Ramos, gerente executivo. Informei ao diretor José Carlos Cosenza. Informei ao presidente Sérgio Gabrielli. Informei a todas a pessoas que eu achava que podiam fazer alguma coisa para combater aquele processo que estava se instalando dentro da empresa”.
CONHECIMENTO DE GRAÇA FOSTER
“Eu estive com a presidente pessoalmente quando ela era diretora de Gás e Energia. Naquele momento, nós discutimos o assunto. Foi passada a documentação para ela sobre processo de denúncia na área de comunicação. Depois disso, ela teve acesso a essas irregularidades nas reuniões da diretoria executiva. Eu era responsável, como gerente executiva corporativa, pelo orçamento. O que significa isso? Esse projeto vai dar lucro ou prejuízo? No final das contas, é isso que a empresa quer”.
DIFICULDADE DE COMPREENSÃO
“Se isso não está suficientemente claro, eu, como gestora, buscaria uma explicação, principalmente de uma pessoa que eu tinha muito acesso. Nós tínhamos muito acesso, éramos próximas. Então ela teria toda liberdade de falar: Venina, o que está acontecendo? ”.
ESQUARTEJAMENTO
“Você tem uma refinaria. São várias unidades que são construídas. Então, você tem várias formas de fazer a contratação. Você facilita ou dificulta a fiscalização. Em nenhum momento, se não houve a compreensão do que eu estava falando, fui chamada a dar esclarecimento sobre o assunto. Então, teve esse momento, e teve agora, no fim da minha gestão em Cingapura que eu fiz relatório em toda minha área de gestão, resultados bons”.
PAULO ROBERTO
“Esse evento aconteceu quando eu fui apresentar o problema que ocorreu na área de comunicação. Eu cheguei na sala dele e falei: olha, aqui tem só uma amostra do que está acontecendo na área. Eram vários contratos de pequenos serviços onde nós não tínhamos conhecimento do tipo de serviço, mostrava esquartejamento do contrato. Naquele momento, eu falei: eu nunca soube, estou sabendo isso agora e acho que é muito sério e temos que tomar atitude. Aí, ele pediu que eu procurasse o gerente responsável e pedisse para que ele parasse. Eu falei: ele já fez, não tem como eu chegar agora e falar vamos esquecer o que aconteceu e vamos trabalhar diferente’. Existe um fato concreto que tinha que ser apurado e investigado. Nesse momento ele ficou muito irritado. A gente estava sentado na mesa da sala dele. Ele apontou para o retrato do Lula, apontou para direção da sala do Sérgio Gabrielli e perguntou: você quer derrubar todo mundo?. Eu fiquei assustada e disse: olha eu tenho duas filhas, tenho que colocar a cabeça na cama e dormir e no outro dia eu tenho que olhar nos olhos delas e não sentir vergonha ”.
PRESSÃO NO TRABALHO
“Durante esse processo todo da comunicação, eu fui muito assediada, fui muito pressionada. O tempo todo havia assistentes do presidente, assistentes dos diretores na minha sala falando: Tem muita gente envolvida, você não pode tratar essa questão dessa forma. Então, quando a gente conduziu todo o processo, eu tinha que formatar, fazer um documento final para que ele fosse encaminhado para as áreas que teriam que tomar as ações e, na verdade, o que estava ocorrendo era uma pressão grande para que isso não fosse feito. Eu fui lá não pra pedir para formatar. Foi pra falar o seguinte: o que que eu faço? Para quem que eu mando? Diretor? Na verdade, era para pedir conselho. O que eu fiz foi emitir um documento para a diretoria que é quem teria que tomar as ações, copiando o Jurídico e o diretor de abastecimento”.
EXÍLIO EM CINGAPURA
“Depois que eu apurei essa questão da área de comunicação, depois desse processo todo da área de comunicação, a gente recebeu várias ameaças por telefone. As minhas filhas deveriam ter 5 e 7 anos. Eram bem novas. Tiveram outros momentos mais difíceis. A opção que eles fizeram em 2009 foi me mandar para o lugar mais longe possível, onde eu tivesse o menor contato possível. Aparentemente, eu estaria ganhando um prêmio indo pra Cingapura, mas o que aconteceu realmente foi que, quando eu cheguei lá, me foi dito que eu não poderia trabalhar, que eu não poderia ter contato. Quando me foi informado que seria afastada da minha função, o que foi dito pela Petrobras é que não existia claramente nenhum dolo, nenhum problema. Quando me foi informado, primeiro eu fiquei sabendo pelos jornais, depois o gerente executivo me ligou e eu perguntei: quais as razões? O que ele me respondeu foi o seguinte: estou passando o recado do diretor. Ai eu disse: então, por favor, me passa o telefone do diretor que eu vou perguntar as razões. O diretor me ligou dizendo que eu estava sendo afastada por falhas em procedimentos administrativos, mas que ele não tinha lido o relatório direito, mas que ia conversar e me dar uma resposta. Eu vendo que não tinha clareza nos motivos, como não sabia o motivo, não me foi dado direito de defesa e não foi me dada informação. Foi aí que eu encaminhei relatório para a presidente Graça perguntando o que estava acontecendo. Para a minha surpresa, na sexta de manhã eu recebo um documento com a minha saída e, na parte da noite, eu recebo um e-mail da presidente pedido para que o diretor jurídico verificasse as providências”.
CONTRATOS
“Nenhuma área de negócio, não só a minha, nenhum gerente executivo, não só eu, assinam contratos ou aditivo. Todos os contratos ou aditivos são negociados e assinados pela área de serviço”.
SEM ENVOLVIMENTO
“Eu trabalhei junto com Paulo Roberto, isso eu não posso negar. Trabalhei na diretoria de Abastecimento a partir de 2005. Eu diria que, de 2005 a 2006, foi um trabalho muito voltado para melhoria da gestão de abastecimento que culminou no prêmio nacional de responsabilidade. Eu trabalhei com Paulo Roberto. Esse documento se refere à época desse problema da comunicação que eu falei. Quando começamos a trabalhar, eu falo isso para todos que sou subordinada: eu só trabalho mediante os procedimentos e código de ética. Não trabalho se tiver que contrariar isso. Então, quando começou a acontecer, foi o caso do desvio da comunicação. Então, o que eu quis dizer foi: você está me assediando, eu não vou fazer isso, e o desgaste foi muito grande e a história toda já foi contada. Em momento nenhum eu cedi. Se eu tivesse participado de algum esquema, eu não estaria aqui hoje. Eu não teria feito a denúncia. Não teria ido ao Ministério Público e entregue o meu computador com todos os documentos que eu tenho desde 2002”.
DENTRO DA ÉTICA
“Na verdade, as atitudes não foram fora da ética, nem fora da norma. Foram atitudes pouco corriqueiras para um empregado que quer ver as coisas sendo feitas da forma correta, por um empregado que quer denunciar as coisas escrevendo. Eu escrevi. Eu não entrei na sala e falei, eu registrei. Quando eles falam que eu estou fazendo uma coisa fora do código de ética… Denunciar irregularidade é fora do código de ética?”.
EX-MARIDO
“Na verdade, foram dois contratos, um em 2004 e outro em 2006. Eu me casei em 2007 e a condição para assumir o relacionamento era que o contrato fosse descontinuado. No momento que a gente assumiu a relação, a condição foi: vamos interromper porque tem conduta de ética dentro da Petrobras e minha de que eu não posso continuar. E isso foi feito com parecer jurídico. Agora, só posso dizer que a empresa dele é muito competente. Não fui só eu que fiz. A atual presidente, quando trabalhava na diretoria de Gás, também assinou contrato com ele e depois, em 2008, também assinou contrato com a empresa para fazer integração dos modelos de gestão das termoelétricas. Ela fez isso com base nas características técnicas”.
COM MEDO, MAS ATÉ O FIM
“Eu vou até o fim, sim. Eu também tenho muito medo. Eu não posso falar que eu não tenho, porque no momento que você denuncia, ao invés de ver respostas para as denúncias, você vê, simplesmente, a empresa tentando o tempo todo falar: ‘você não é competente, fez um monte de coisa errada’. O tempo todo as pessoas tendo que responder, mostrando documentos, que aquilo não é verdade. É uma máquina que passa por cima da gente. Eu tenho medo? Eu tenho, mas eu não vou parar. Eu espero que os empregados da Petrobrás — porque eu tenho certeza que não fui só eu que presenciei — criem coragem e comecem a reagir. Nós temos que fazer isso para poder, realmente, fazer a nossa empresa ser de volta o que era. A gente tem que ter orgulho. Os brasileiros têm que sentir orgulho dessa empresa. Eu vou até o fim e estou convidando vocês para virem também”.
EMPRESA LIMPA
“O que eu quero é uma empresa limpa. O que eu quero é que os funcionários da Petrobras possam sentir orgulho de trabalhar nessa empresa. O que eu não quero é ouvir o que a gente ouve quando entra no táxi e fala assim: o senhor pode me deixar ali na Petrobrás?. Aí vem a brincadeira: ‘Você vai lá pegar seu trocado?’. Eu não quero isso. O corpo técnico não merece isso. Por isso é que eu estou aqui passando por todo esse desgaste que não é pequeno para gente conseguir reerguer essa empresa novamente”.
Ou o Brasil salva a Petrobras ou a Petrobras vai levar literalmente o Brasil para o fundo do poço…