ANP DIVULGA PEDIDO DE WAIVER DA PETROBRÁS PARA LIBRA, MAS DOCUMENTOS NÃO DETALHAM COMPARAÇÃO DE PREÇOS DO BRASIL COM O EXTERIOR
Por Daniel Fraiha (daniel@petronoticias.com.br) –
A ANP abriu consulta pública do pedido de waiver (perdão pelo descumprimento) do conteúdo local do FPSO piloto de Libra, feito pela Petrobrás, mas o documento apresentado não detalha os valores ofertados pelas empresas afretadoras, o que seria a base da afirmação do presidente da estatal, Pedro Parente, de que a construção no Brasil seria 40% mais cara do que no exterior. Além disso, o texto apresenta dados que não levam em conta diversos fornecimentos já realizados no País com alto índice de conteúdo local, inclusive com um estudo para mostrar a situação dos estaleiros brasileiros datado de agosto de 2015, sem que essas empresas fossem ouvidas para a licitação de Libra.
O extenso processo, de 158 páginas, traz diversas argumentações da Petrobrás, inclui um estudo da DNV-GL e um relatório sobre a situação dos estaleiros nacionais, alegando que um dos problemas seria a falta de diques secos disponíveis no Brasil, apesar de citar cinco estaleiros que poderiam atender à demanda: Estaleiro Atlântico Sul, Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP), Estaleiro Inhaúma, Estaleiro Rio Grande e Estaleiro do Nordeste (ENOR).
“No entanto, ENOR e EEP não se encontram em operação, enquanto os outros estão totalmente ocupados até pelos menos o segundo semestre de 2018. Além disso, Brasfels e Mauá dispõem de diques menores, que não são capazes de receber cascos das dimensões necessárias”, afirma a Petrobrás no pedido, que foi feito ainda em 2016.
Apesar da afirmação da companhia de que os dois últimos estaleiros não teriam capacidade, o Brasfels finalizou nos últimos dias a integração do FPSO P-66, uma unidade de grande porte, com capacidade para produzir 150 mil barris de petróleo e 6 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia, uma das maiores do tipo entre as que operam no pré-sal brasileiro, ainda que um pouco menor do que a proposta para Libra, cuja capacidade prevista é de 180 mil barris de petróleo e 12 milhões de metros cúbicos de gás por dia.
O maior problema desse levantamento feito pela estatal, que inclui ainda os estaleiros Brasa, Mauá, OSX, Techint, Quip, EBR e Jurong, é o fato de o Sinaval, sindicato que representa os estaleiros brasileiros, ter afirmado que essas empresas não foram consultadas para o leilão de Libra, como o Petronotícias noticiou na semana passada.
A Petrobrás chega a alegar no documento que o Estaleiro Mauá fechou as portas em 2015, o que já foi negado pelo próprio Mauá recentemente, quando representantes do estaleiro explicaram que a empresa na verdade está tentando chegar a um acordo com a Transpetro para a finalização dos navios petroleiros que se encontram nas suas instalações. No entanto, os dados apresentados pela Petrobrás são todos baseados em um relatório da IHS concluído em agosto de 2015, quando a realidade era diferente da atual.
Essas são algumas das premissas usadas pela Petrobrás para pedir o perdão antecipado para o descumprimento do conteúdo local, sendo que apenas uma empresa, a Modec, apresentou uma proposta que atendeu às exigências da estatal – apesar de nenhuma delas ter sido detalhada no documento.
A lista de convidadas incluiu, além da Modec, a SBM, a Bumi Armada, a BW Offshore, a Bluewater, a Teekay Petrojarl e a Cenertech, que pertence à estatal chinesa CNOOC, uma das sócias do consórcio de Libra, o que mostra o aumento da atenção que tem sido dada aos chineses. Apesar de constar da lista, a empresa chinesa, que comemora em seu próprio website o fato de ter fechado o primeiro contrato internacional relativo a FPSOs em 2015 – justamente para o Brasil, para a conclusão da P-67 e da P-70, que estavam inicialmente com o consórcio Integra (OSX e Mendes Júnior) –, não apresentou uma proposta, assim como a Teekay e a Bumi Armada. Já as propostas da SBM, da Bluewater e da BW foram desqualificadas por apresentarem condicionantes.
O relatório do pedido de waiver conta também com um parecer jurídico da PPSA, a estatal criada para gerir os recursos do pré-sal, que receberá a parte do óleo relativa ao governo, mas também segue a mesma linha de ataque da Petrobrás ao conteúdo local. No parecer, a PPSA afirma, como uma de suas conclusões:
“O cumprimento do compromisso de conteúdo local implica um custo inversamente proporcional à capacidade de fornecimento de bens e serviços a preços competitivos pela indústria”, antes de tentar relativizar: “Não é dado à PPSA pretender otimizar tal custo de forma a maximizar os resultados econômicos dos contratos de partilha de produção em detrimento do estrito cumprimento do compromisso de conteúdo local contratualmente estipulado”.
Ainda assim, a empresa assina embaixo do pedido do waiver, afirmando que “não há como a PPSA exigir o cumprimento do que foi contratado, eis que, decerto, não se pode vindicar o impossível”.
Esse “impossível” está baseado fortemente no documento da DNV-GL, que coloca a indústria nacional como incapaz de fornecer a maior parte dos bens e serviços. Para o casco, por exemplo, o relatório define 0% para tudo; para a construção das plantas, afirma que apenas 23,1% da construção e montagem poderia ser feita no Brasil, distribuindo percentuais de 10,3% a 30,8% para outros fornecimentos desta etapa; enquanto que para a instalação e integração de módulos – etapas já feitas com sucesso no País para alguns dos últimos FPSOs da Petrobrás –, estima que apenas 26,4% poderiam ser feitos localmente, tanto para engenharia básica e de detalhamento, quanto para gerenciamento, construção e montagem e comissionamento, aumentando um pouquinho o percentual apenas para os materiais, que poderiam atingir um índice de 31,6%. O Petronotícias separou abaixo os quadros com todos os conteúdos locais mínimos estipulados pelo contrato de Libra e os percentuais considerados “factíveis” pelo estudo da DNV-GL.
Veja uma parte no quadro 1 abaixo:
Na parte de equipamentos, o estudo distribui índices de 0% de conteúdo local factível para diversas categorias, como tanques, queimadores, turbinas a gás e sistemas de medição fiscal.
Veja a outra parte no quaro 2 abaixo:
No entanto, a própria ANP já recebeu manifestações da indústria contrariando essas alegações, como indica um documento extra anexado ao processo, fornecido pela Abemi junto com a Metroval à agência, onde são apresentados os índices de conteúdo local para sistemas de medição fiscal já fornecidos a diversas plataformas brasileiras, como P-55, P-62, P-66, P-67, P-68 e P-76, entre outras, em que o percentual ficou entre 64,5% e 83%.
Agora, com a consulta pública da ANP, a indústria terá a chance de mostrar que tem condição de atender além desses percentuais. O processo de consulta fica disponível por 30 dias a contar de sexta-feira (10), até o dia 13 de março, sendo que a audiência pública está marcada para o dia 30 de março e o resultado deste processo certamente servirá de jurisprudência para a atuação das petroleiras no pré-sal ao longo dos próximos anos, quando a exploração e produção deverá ser intensificada na região.
Preocupada com isso, a Abimaq, que reúne as fabricantes de máquinas e equipamentos, já chamou a atenção dos ministérios envolvidos no assunto, com o envio de uma carta publicada também pelo Petronotícias nos últimos dias, e vale lembrar um trecho do texto:
“Queremos sair do modelo ‘Mar do Norte’ para um modelo Opep? Queremos ser como Venezuela, Nigéria e Angola ou como Noruega e Reino Unido? Nossos desempregados aceitam exportarmos empregos para China, Coreia e Singapura?”, questiona o presidente da associação, José Velloso, no documento.
Clique aqui para acessar na íntegra o pedido de waiver protocolado pela Petrobrás junto à ANP.
Clique aqui para acessar a consulta pública da ANP.
Quatro dias após a publicação desta reportagem, no dia 13/02, a DNV-GL entrou em contato com o Petronotícias e pediu para esclarecer que ela não levantou os dados sobre a capacidade da cadeia de fornecedores brasileira, mas apenas “validou” a metodologia apresentada pela Petrobrás e o consórcio de Libra. Veja abaixo a nota na íntegra:
“Com relação às matérias recentemente publicadas sobre o estudo apresentado pelo Consórcio Libra como parte do pedido de waiver para o FPSO Piloto de Libra, a DNV GL vem esclarecer que o escopo contratado pelo Consórcio através de licitação foi “Serviço de validação da metodologia de cálculo de Conteúdo Local do FPSO do Piloto de Libra”. Com base neste escopo, a DNV GL validou a metodologia elaborada pelo Consórcio, que foi baseada em estudos de mercado já existentes e dados fornecidos pelo Consórcio referentes a plataformas em construção no Brasil e já entregues. A validação da metodologia pela DNV GL foi feita com base nas resoluções da ANP.
Ressaltamos que a DNV GL não conduziu nem validou nenhum estudo sobre a capacidade da indústria nacional. Portanto, a DNV GL não avaliou a capacidade da cadeia de fornecimento Brasileira com relação à construção ou conversão FPSOs, ou ainda ao fornecimento de bens, serviços e equipamentos.”
Esse Pedro Parente não entende de porcaria nenhuma! Vai acabar de afundar a Petrobras! Privatizem logo!
Acordo tácito…China dá grana e Petrobras dá óleo e encomendas. Não vai mudar com essa gestão.