COMISSÃO DE LICITAÇÃO DA PETROBRÁS SOFRE NOVA ACUSAÇÃO DE FAVORECIMENTO A EMPRESAS EM OUTRO CASO QUE FOI PARAR NA JUSTIÇA
Há algo de muito estranho acontecendo no setor de licitação da Petrobrás. Os resultados mostram que pode estar havendo um direcionamento para empresas escolhidas ganharem as obras, lembrando um tempo, um período triste, onde as empresas eram obrigadas por diretores ligados a partidos políticos a combinarem irregularidades que se transformavam numa corrupção sem limites. Não parece ser o caso exatamente, mas pode ser um rascunho do período na estatal que o Brasil repudia e não quer esquecer. Este caso que o Petronotícias traz agora é o terceiro somente este ano. O primeiro foi com a empresa AES Union Brasil, numa licitação na Replan. O segundo, com a Alphatec, que foi afastada e multada quando faltavam 5% para concluir um heliponto, que há 5 anos e 5 meses apodrece no pátio do Porto do Forno, em Arraial do Cabo (RJ). Agora, a história envolve a licitação para a escolha das empresas que vão disputar obras, com um orçamento superior a 5 bilhões de reais, para fazer a manutenção de plataformas de petróleo da Petrobrás.
Neste momento temos muitas empresas nacionais impedidas, como é o caso da Prática Engenharia, que foi alijada do processo de pré-qualificação para manutenção de plataformas. É mais um exemplo de como a comissão de licitação da companhia vem agindo. E é mais uma empresa que entra na Justiça, com um mandado de segurança, para garantir a lisura num processo licitatório na Petrobrás. Como não é o primeiro, nem o segundo caso, mas o terceiro em menos de três meses, há que se aumentar o tamanho da pupa para se ver melhor o que está acontecendo neste departamento vital para uma companhia estatal, mas que se diz à serviço de seus acionistas. Será que só a comissão está certa e todas as empresas estão erradas? A Prática Engenharia foi afastada de forma seletiva, mesmo cumprindo todos os requisitos e exigências do edital que a habilitaria para concorrer às obras que, afinal, eram as mesmas que já fazia. Se alguém dentro da estatal, responsável pelo seu próprio compliance, não consegue ver, é porque a empresa que fez a certificação da Petrobrás para isso não trabalhou bem. E pelo jeito não tem crédito para certificar a ninguém. Não basta ser honesta, é preciso também parecer honesta, divulgando claramente o resultado das investigações (se houve) dos casos apontados até aqui. Nunca se sabe se há ou não proteção especial aos responsáveis. Por que esconder ? O lema da transparência exaltado pelo governo Bolsonaro, pelo jeito, ainda não bateu às portas da estatal. Pelo menos no quesito compliance, tão exigido de seus fornecedores, mas sempre camuflado e até escondido por quem exige.
Para lembrar, a Petrobrás, desde 2017, vem promovendo concorrências para a manutenção das plataformas através de processos abertos com base nas prerrogativas da Lei 13303/16 e, com este procedimento, permitindo uma ampla participação das empresas nacionais nesse segmento. Todos esses processos foram bem-sucedidos com a contratação de empresas que estão executando os contratos. Nestes processos, tínhamos a participação de quase 25 empresas com excelentes níveis de preços e produzindo uma ampla competitividade e oportunidade para todo o mercado de prestadores de serviços neste segmento. No entanto, por razões desconhecidas, a Petrobrás resolveu criar um critério de pré-qualificação e a partir desse momento somente as empresas selecionadas poderão participar desse mercado.
Por motivos também não conhecidos, as exigências adotadas para essa análise de capacitação prévia se faz ao prazer de poucos envolvidos que refutam, sem qualquer critério plausível, as empresas que estão candidatando-se. Diante desse quadro, a Petrobrás limitou a participação somente dessas empresa,s produzindo a habilitação de apenas 11 companhias. Mas, numa simples análise dessa lista, qualquer leigo pode observar que muitas das empresas que foram pré-habilitadas não vinham sequer participando das oportunidades nestes últimos cinco anos. Ou, o que aumenta o risco, já devolvendo contratos de grande porte na área onshore, em suas refinarias.
O estranho é que se chega à uma situação de se ter apenas cinco ou seis empresas com reais condições de participação, selecionadas a dedo. E soma-se a isso o fato que estas mesmas empresas foram as ganhadoras dos últimos contratos, o que levará a Petrobrás a conviver com as mesmas empresas e suas capacidades no limite da condição de assumir novos contratos. Portanto, já se pode vislumbrar um quadro em que teremos preços aviltados e negócios compartilhados. Pois diante desse cenário, temos um rascunho da repetição das mesmas cenas do filme de terror que retratou a recente tragédia sofrida pela companhia ao adotar esse modelo de contratação.
Aqui, cabem algumas perguntas: Por que a Petrobrás criou essa nova família de empresas? Por que a Petrobrás agora quer fazer uma pré-habilitação de um serviço exatamente igual com critérios obscuros de análise e aprovação? Por que a Petrobrás não analisa que na lista das empresas, ditas habilitadas (que são 11), somente cinco ou seis vinham apresentando propostas nos processos anteriores? Por que a Petrobrás, que vinha obtendo condições tão favoráveis de preços, caminha para uma situação de ter poucas propostas com empresas que já estão com um volume extremamente elevado de contratos?
A Prática Engenharia, que se sente prejudicada por uma ação da comissão de licitação da companhia pergunta: “Por que uma empresa que vinha participando de todos os processos de forma agressiva com preços extremamente competitivos e produzindo benefícios para que a Petrobrás pudesse ter seus contratos com menores custos, hoje é colocada sem poder participar mesmo diante de argumentos e comprovações técnicas, fotos e atestados?”
A chamada comissão de licitação afastou a empresa, mesmo diante da documentação legal estar em ordem. Com isso, seleciona-se e beneficia-se um clube de apenas cinco ou seis empresas, que a companhia considera especiais, quase um clube fechado, com bolas brancas e pretas para aprovação, que disputarão os bilhões da concorrência. A decisão da Petrobrás leva o contorno da mesma arrogância que a companhia exalava no tempo da Lava Jato. Os membros da comissão de licitação não tratam a maior parte das empresas como parceiras-fornecedoras, mas como subservientes e algumas até de segunda classe.
Enquanto externamente a companhia tenta um esforço para passar uma imagem de competitiva e com ações em prol do social, com políticas de doações, salvando animais, dando suportes, na prática interna, ela impõe um tratamento que subjuga seus fornecedores e parceiros. Cabe aqui destacar principalmente a indústria nacional. Triste, mas real. Só os eleitos, recebem as benesses. Mas, essa mesma indústria que desde o início da sua criação foi sua aliada e com ela superou todos os desafios tecnológicos para explorar e produzir o petróleo brasileiro, muitas vezes são submetidas a situações humilhantes e constrangedoras. Se duvidam, façam uma pesquisa no mercado para descobrir a real imagem da companhia junto aos seus fornecedores. Todos os projetos de novas plataformas estão sendo construídas pela Petrobrás no exterior. E não se pode garantir que vão ser respeitados o conteúdo nacional obrigatório de apenas 25%. Algumas vezes, para quem subcontrata, é mais vantajoso pagar a multa e não fazer nada no Brasil. Este caso agora mostra esta realidade.
A decisão de inabilitar a Prática Engenharia, vai de encontro às exigências do edital. Mesmo tendo cumprido tudo o que era previsto, a comissão diz não, não vai participar. E pronto e acabou-se. O recurso administrativo interposto pela empresa foi analisado sem qualquer cuidado e as justificativas para manter a negação são descabidas e a intencionalidade foi feita a qualquer custo. O correto seria chamar a empresa para explicar, se assim não foi por ela entendido o conteúdo da sua documentação.
Para lembrar, o comportamento desta comissão de licitação é o mesmo em dois outros casos recentes que o Petronotícias abordou. Em 2006, a Petrobrás autorizou a construção da FPSO P-53 em Cingapura, na empresa Keppel Shipyard. Lá foi feita a conversão do navio petroleiro português Setebell. Dois anos depois, a plataforma entrou em operação no campo de Marlim Leste, na Bacia de Campos, em 30 de novembro de 2008. Contudo, a Petrobrás percebeu um erro no projeto: o heliponto ficou muito baixo, trazendo muita tensão para todas as operações de pousos e decolagens, principalmente em condições de ventos muito fortes.
Desde o reconhecimento do alto risco para as aeronaves e seus tripulantes, foram contratados três navios rebocadores para que melhorassem a ancoragem da embarcação, evitando que o vento deslocasse o navio e provocasse um acidente, em função da baixa altura do heliponto. São usados os navios AHTS CBO Cabralia / Astro Paraty / AH Varazze. O aluguel de embarcações como essas custa em torno de 30 mil dólares por dia cada um. Paralelamente, a Petrobrás contratou a Alphatec para construir um novo heliponto. Quando faltavam apenas 5% da obra, a empresa foi afastada, a obra completamente abandonada no Porto do Forno, em Arraial do Cabo, e se manteve a opção por continuar alugando os rebocadores. E isso está sendo feito desde 2009. A obra está abandonada há cinco anos e cinco meses. Mais um caso entregue à Justiça.
Outro exemplo: o caso da AES Union-Replan também é emblemático. Trata-se de uma possível manipulação do resultado da licitação do projeto e construção da unidade de hidrotratamento (HDT) da Refinaria de Paulínia (Replan), com uma pressa incompreensível da comissão de licitação para pagar a mais cerca de 300 milhões de reais pela mesma obra. Parece absurdo? Para todos sim, menos para a comissão de licitação da Petrobrás e para o compliance da companhia. No dia 20 de dezembro, a Petrobrás, através de seu sistema online, onde os concorrentes colocam os preços, identificou que a empresa brasileira AES Union do Brasil apresentou o melhor preço para licitação do projeto e da obra do EPC HDT, com montagem e comissionamento. A implantação da nova HDT da Replan faz parte da estratégia da Petrobrás em aumentar sua capacidade de produção de diesel S-10, com baixo teor de enxofre.
Como os documentos entregues não estavam no “modelo”, ou seja, não seguiam o protocolo imposto pela Petrobrás, a estatal inabilitou a companhia AES Union do certame no dia seguinte. A comissão de licitação não só não aceitou as ponderações previstas no edital, como logo no dia seguinte à inabilitação da AES Union passou a negociar com a TOYO, que ficou em segundo lugar. Mas aí, um detalhe muito especial: a proposta da TOYO é apenas R$ 296 milhões maior do que a da AES – primeiro lugar. A comissão pareceu ter pressa para pagar mais caro. Outro caso na Justiça.
Em menos de quatro meses, o Petronotícias apontou aqui três casos de arrepiar os cabelos de qualquer um, apontando um comportamento duvidoso da comissão de licitação da Petrobrás. Isso aconteceria numa empresa privada? Possivelmente sim. Mas seus proprietários ficariam quietos confiando na lisura dos envolvidos? Provavelmente não. Lisura, clareza nas decisões, menos arrogância e o descasamento com a impunidade. É o que se espera de uma empresa de capital aberto, predominantemente estatal. O silêncio é comprometedor e parece consentidor.
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