INDÚSTRIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO AMPLIA FOCO EM NOVAS TECNOLOGIAS PARA SUPERAR CRISE
Por Luigi Mazza (luigi@petronoticias.com.br) –
Diante dos impactos da crise, a redução de custos está hoje presente em toda a cadeia global de petróleo. O cenário de dificuldades vem conduzindo a uma reestruturação do mercado, que busca se adaptar às novas tendências e sobreviver de forma sustentável. À medida que grandes empresas vêm adotando soluções de curto prazo, no entanto, a indústria brasileira defende mudanças sólidas e mantém foco no longo prazo para consolidar sua retomada, segundo o novo relatório anual da consultoria DNV GL, que consultou mais de 900 profissionais especializados no setor em todo o mundo. Os investidores brasileiros vêm aumentando seu interesse no desenvolvimento de novas tecnologias com focos nos próximos anos: 25% dos entrevistados na pesquisa pretendem ampliar investimentos em P&D, ao passo que em 2015 o total era de apenas 9%. De acordo com o gerente da divisão de óleo e gás para América do Sul da DNV GL, Alexandre Imperial, o relatório revela que as empresas brasileiras caminham para a adoção de mudanças efetivas e estão acima da média global na busca por novas práticas de eficiência. Entre elas está a padronização de operações e métodos de produção por grandes operadoras, medida defendida por 80% dos empresários brasileiros consultados. “Essa busca por inovação mostra que as empresas estão dispostas a investir agora para colher na frente”, afirma Imperial. “É um viés positivo, de repensar estruturas”.
Quais serviços a DNV GL presta hoje na indústria brasileira de óleo e gás?
Estamos presentes no Brasil há mais de 50 anos e hoje atuamos em todos os segmentos da indústria. Na parte de óleo e gás, trabalhamos no mercado de consultorias técnicas, estudos de segurança, confiabilidade e consultoria para compra e venda de ativos. Também temos uma atuação forte na certificação de sistemas de gestão.
Como a empresa avalia o atual cenário de vendas de ativos no mercado?
O que vemos é uma indústria em crise. O relatório que divulgamos nesta semana revela que o índice de confiança no Brasil caiu em relação ao ano anterior, e esse cenário estimula muito a compra e venda de ativos. Às vezes não se justifica manter determinado serviço dentro de uma empresa, então se contrata uma consultoria externa para fazer isso. Além disso, muitas empresas estão em situação financeira difícil, o que traz um aumento no nível de aquisições e fusões.
Como a DNV GL vem atuando nesse cenário?
Como a empresa tem um conhecimento técnico muito forte, nós redirecionamos isso para agentes financeiros, bancos e novos escritórios de advocacia que queiram entrar na indústria, como empresas asiáticas e europeias. Nós ajudamos fazendo uma avaliação mais profunda desses ativos técnicos, como plataformas e sondas de perfuração. Hoje há oportunidade para adquirir ativos em operação, mas é preciso garantir que eles têm vida útil remanescente e que atendem às demandas das empresas interessadas. Nós também trabalhamos com a terceirização de funções que antes eram realizadas dentro das empresas.
Como isso tem sido feito?
Por exemplo, uma equipe profissional que antes da crise tinha 200 pessoas, passa agora a ter 50. A capacidade diminui, e a empresa precisa, em alguns casos, recorrer a ajuda externa para fazer o que fazia antes. É a contratação de uma consultoria para fazer o que antes era feito em casa. Além disso, ajudamos na revisão de estratégias e na implantação de sistemas de gestão.
Que padrões têm sido notados no comportamento dessas empresas?
Comparando nosso novo relatório com os anos anteriores, conseguimos identificar alguns comportamentos. O que podemos perceber neste ano é que o Brasil está acima da média global no que diz respeito à adoção de medidas de longo prazo. Isso ficou muito nítido no relatório. Muitas empresas no mundo tendem a adotar medidas de curto prazo, que são corte de investimentos, demissão de pessoal e pressão sobre fornecedores para renegociar contratos. São medidas que solucionam, mas que podem comprometer a companhia no futuro. Hoje, no entanto, vemos um viés positivo no mercado brasileiro, com medidas de longo prazo que deixam as empresas mais bem preparadas para quando houver uma retomada no setor.
Quais são essas medidas de longo prazo?
Em primeiro lugar, padronização. No Brasil, 80% dos entrevistados esperam que as operadoras continuem investindo em padronização de procedimentos; no mundo, esse fator ficou em 61%. No ano anterior, essa perspectiva foi abordada por 59% dos entrevistados brasileiros, então há uma mudança. É uma mudança sustentável a longo prazo, e garante eficiência operacional.
Isso revela uma busca por maior confiança na indústria?
Sim. A crise é presente, é duradoura, e reconhecer isso é o primeiro passo para a indústria adotar medidas de longo prazo. Essa foi a primeira revelação promissora da pesquisa. Além disso, vemos o interessas das empresas brasileiras na inovação em P&D. Em 2015, 9% dos entrevistados pretendiam aumentar investimentos nessa área, e isso pulou para 25% este ano. Aumentou quase três vezes, e é um bom indicativo se compararmos com a média global de 15%. Essa busca por inovação mostra que as empresas estão dispostas a investir agora para colher na frente. Outra medida de longo prazo é o desenvolvimento de competências.
Essa visão de longo prazo está relacionada ao agravamento do cenário no Brasil?
Eu entendo que sim. A indústria de óleo e gás passa por uma crise diretamente relacionada ao baixo preço do barril – e algumas previsões apontam que essa faixa vai se manter por um bom tempo-, mas no Brasil temos três agravantes que tornam a crise mais acentuada. São elas a Operação Lava-Jato, intimamente relacionada com o setor de óleo e gás, a crise econômica e a questão política. Discussões importantes que poderiam ser fomentadas hoje acabam sendo levadas para segundo plano.
Como a pressão por renegociações vem afetando os fornecedores do setor?
Ela impacta porque vem cascateando. Começa no nível mais alto, que é a Petrobrás, e vai passando por diferentes fornecedores. Existem empresas com fôlego financeiro maior, que conseguem absorver essa pressão e conceder descontos para quem está no andar de cima, mas outras de pequeno e médio porte vêm sendo afetadas. São companhias que não têm como absorver um corte de custos significativo, e em casos extremos fecham as portas.
O relatório da DNV GL aponta para a repetição de erros na indústria. Como evitar que os erros da atual crise se repitam mais à frente?
A crise é um problema cíclico, mas temos que colocar como foco a forma de lidar com ela. Enquanto indústria, precisamos estar mais preparados para futuras crises, e nossa pesquisa aborda isso. No Brasil, apenas 47% dos entrevistados disseram acreditar que o mercado está repetindo erros do passado, e esse é outro aspecto encorajador no país. Aliando isso com os outros dados, percebemos que as empresas querem ficar mais eficientes, com ações mais sustentáveis. E uma vez que se atinge esse patamar, é difícil perdê-lo, mesmo que o barril volte a níveis altos. Então existe esse viés positivo, de repensar estruturas.
Qual é hoje a principal demanda da DNV GL em projetos de eficiência?
A padronização de processos. Temos vários projetos em andamento e hoje contamos com um joint industry project, que é um trabalho de pesquisa e desenvolvimento feito com vários clientes juntos. Grandes operadoras participam disso, como a BG, Shell, Chevron e Petrobrás, para abordar necessidades da indústria de forma colaborativa. Fizemos esse projeto com uma petroleira internacional, para avaliar o planejamento de perfuração no Ártico, o que traz inúmeros requisitos técnicos. Alguns eram desnecessários, então revisitamos esses pontos e, mantendo os níveis de segurança e confiabilidade, reduzimos em 50% os custos de operação. Foi um corte tão significativo que a empresa quer aplicar essa metodologia no desenvolvimento de campos inteiros.
Esse processo também serve para equipamentos subsea. Quando uma empresa faz projetos de arquitetura e sistema de produção submarina, há diversos pontos para avaliar. Com nossos especialistas em processamento e materiais, conseguimos reduzir a necessidade de especificações, documentações e até o tempo de operação.
As demandas da DNV GL foram impactadas com a crise do setor?
Sim, fomos afetados no Brasil e globalmente. Toda a cadeia está impactada, mas tivemos agilidade em nos preparar para a crise, tentando introduzir novos serviços e ampliando nossos serviços de padronização. O cenário impactou nossos negócios, mas estamos preparados para enfrentar isso com soluções que previmos e que se confirmaram em demandas. Todo ano, investimos 5% de nossa receita em P&D, e isso independente do preço do barril.
Quanto isso tem representado em valores?
Ainda não fechamos 2015, mas em 2014 nossa receita global foi de R$ 10,5 bilhões. O investimento em P&D foi então de aproximadamente R$ 500 milhões. A tendência é a mesma para 2016.
Como avalia uma possível retomada da indústria ainda este ano?
Acho muito difícil. Este ano vai ser tão difícil quanto 2015, e em 2017 devemos começar a ver alguma perspectiva de melhora. O importante é entendermos que é o país está vivendo um momento de turbulência, mas não se pode questionar o potencial a longo prazo. Serão dois ou três anos difíceis, mas acreditamos na recuperação e continuamos investindo na melhoria de eficiência.
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