INDÚSTRIA NUCLEAR ESTUDA MODELO DE LICENCIAMENTO INTERNACIONAL PARA USINAS

Por Daniel Fraiha (daniel@petronoticias.com.br) – 

Antônio Müller, presidente da Abdan.

Antônio Müller, presidente da Abdan.

Uma das maiores reclamações em quase todas as áreas hoje no Brasil, com destaque para o setor energético, é a demora e a burocracia envolvida no processo de licenciamento de empreendimentos pelo país. A sobreposição de órgãos ambientais e instâncias municipais, estaduais e federais cria frequentemente um imbróglio de aprovações e negativas que deixam muitos empresários desconcertados. Sabendo dessa questão, que não é problema exclusivo do Brasil, a indústria de energia nuclear está começando a discutir a possibilidade de criar um modelo de licenciamento internacional.

Os executivos do setor acreditam que seja possível uma padronização mundial para determinados projetos de usinas nucleares, de modo a agilizar a construção de novas unidades e garantir a segurança energética de países que veem tendo dificuldades em dar seguimento aos seus planejamentos.

O presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), Antonio Müller, que também faz parte da World Nuclear Association (WNU – Associação Nuclear Mundial), contou que a ideia surgiu no último simpósio internacional realizado pela WNU, em setembro.

Apareceu essa proposta, de tentar um modelo global de licenciamento, como acontece na área de aviação hoje. É uma boa ideia, válida, mas ainda tem um caminho a ser percorrido. É preciso ser bastante discutida para que esteja bem definida”, disse.

O executivo ressaltou que no Brasil essa é uma questão preocupante, porque há casos em que o projeto fica refém de diferentes entidades, que nem sempre concordam entre si nos termos e nas exigências.

Outro membro do setor, Luiz Carlos Siqueira, da Eletronuclear, fez uma apresentação durante evento realizado pela Abdan para estudantes relatando as dificuldades do licenciamento da usina de Angra 3.

Luiz Carlos Siqueira, da Eletronuclear.

Luiz Carlos Siqueira, da Eletronuclear.

Foram realizadas 17 reuniões prévias com as comunidades próximas da área onde a usina está sendo construída, em Angra dos Reis (RJ), além de nove audiências públicas. Ao final do processo, foram apresentadas 60 condicionantes para a emissão da licença prévia e mais 45 condicionantes para aprovação da licença de instalação, processo necessário para que a licença de construção fosse recebida.

A primeira licença saiu em 2008 e a última somente em 2010, sendo que o custo total das condicionantes impostas à estatal foi de R$ 484 milhões, entre projetos de Saúde (R$ 154,4 milhões), Meio Ambiente (R$ 106,4 milhões) e Defesa Civil (R$ 15,4 milhões), entre outros.

Siqueira contou ainda que, mesmo com a aprovação de todo esse montante, as próprias entidades que apresentaram as propostas têm dificuldades em levar adiante os projetos, que precisam estar enquadrados nas formas de incentivo previstas em lei.

Há muitas dificuldades legais e muitos desses grupos não sabem muito bem como desenvolver um projeto formal. Então damos apoio até nisso, ajudando eles a formatarem as propostas, mas, mesmo assim, até agora só conseguimos fechar 25 convênios, relativos a R$ 180 milhões. E vejam que só com isso os efeitos deles envolvem 150 mil pessoas em Angra, Paraty e Rio Claro”, disse.

APOIO A NOVAS USINAS

O vice-presidente da Abdan, Ronaldo Fabrício, que já presidiu a Eletronuclear, ressaltou a importância da agilidade nestes processos, mas reiterou também a necessidade de novas usinas nucleares serem construídas no Brasil, como forma de garantir a segurança energética do país.

O Brasil tem grandes desafios pela frente. O potencial hidráulico para geração de energia no país está quase todo na região Amazônica e ainda assim deverá se esgotar entre 2025 e 2030. Tem também a energia eólica, mas ela é suplementar, então é preciso haver energia de base, que são as hidrelétricas e as térmicas. Com isso, a nuclear aparece como uma opção natural, mas não parece estar sendo devidamente levada em conta”, afirmou.

Ronaldo Fabrício, vice-presidente da Abdan.

Ronaldo Fabrício, vice-presidente da Abdan.

O executivo lembrou ainda que antigamente as hidrelétricas eram construídas com grandes reservatórios, mas hoje isso não é mais permitido, reduzindo ainda mais o potencial hidrelétrico nacional. Ele deu exemplos também no exterior, como a China, que vinha inaugurando uma usina a carvão por semana, mas agora está modificando seus planos de térmicas para nuclear, para reduzir a poluição atmosférica.

Para efeito de comparação, o vice-presidente da Abdan apresentou um gráfico mostrando o índice de gases de efeito estufa emitidos por diferentes tipos de fontes energéticas. No quadro, que incluía toda a cadeia do processo, desde a fabricação dos componentes e a instalação dos equipamentos até a operação efetiva, a que mais poluía era a térmica a base de carvão, com 1.342 gramas de CO² por Kwh, enquanto a nuclear emitia apenas 27,8 gramas por Kwh. Segundo os dados, até a solar é mais poluente, emitindo 105 gramas de CO² por Kwh. Apenas a eólica ficava abaixo na conta final, com 21 gramas por Kwh.

O presidente da Abdan, Antonio Müller, reiterou que considera a fonte nuclear a melhor opção como energia de base, já que o potencial hidrelétrico estará esgotado em pouco tempo, e defendeu a retomada do programa de desenvolvimento da indústria nuclear nacional, com a abertura do segmento para o setor privado.

Quando o Brasil começou a construir a primeira usina nuclear, a Coreia também estava dando os mesmos passos. Hoje estamos fazendo a terceira, enquanto eles já têm 23 e estão exportando tecnologia”, contou.

Para Müller, a abertura do mercado nacional será essencial para o seu desenvolvimento, além da criação de uma agência reguladora nuclear, que separe as funções de promoção e regulação, atualmente concentradas nas mãos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).

Queremos que seja permitida a participação majoritária do setor privado, porque, se não tiverem o controle sobre os projetos, as empresas não vão investir. Além disso, é muito importante que a EPE [Empresa de Planejamento Energético] considere a energia nuclear como uma tecnologia necessária”, concluiu.

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Bernardino

Trabalhei nas duas Usinas Nucleares e sempre fui a favor de um programa nuclear no Brasil. O estrago que uma termelétrica a carvão faz ao aquecimento global, o estrago que uma hidrelétrica faz ao meio ambienta são irrecuperáveis. Porém falta esclarecimento sobre a tecnologia nuclear e explicações sobre os acidentes que envolveram as nucleares no mundo. Os mais graves não há nenhuma possibilidade de acontecer no Brasil, além de ter evoluído muito a tecnologia para cada acidente ocorrido logo vem um sistema de segurança. Só estudando bem que veremos os estragos para natureza e para o povo do Pará que… Read more »