ABEN DEFENDE REVISÃO DO MARCO REGULATÓRIO NUCLEAR BRASILEIRO
Por Bruno Viggiano (bruno@petronoticias.com.br) –
Risco de apagão, seca nos reservatórios das hidrelétricas, usinas térmicas trabalhando a todo vapor e aumento no valor da conta de luz do consumidor resumem os recentes problemas enfrentados pelo setor energético brasileiro. O cenário poderia ser outro se a participação da fonte nuclear fosse mais efetiva no país, defende o vice-presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), Marcelo Gomes da Silva. A construção de pelo menos quatro usinas nucleares, até 2030, consta no Plano Nacional de Energia (PNE), de 2007, no entanto, até agora elas não saíram do papel, apenas com Angra 3 sendo levada adiante como avanço do programa nuclear brasileiro. Marcelo acredita que o custo no Brasil para a implantação de novas usinas só será reduzido com a adoção de um modelo de escolha de terrenos que comportem até seis usinas nucleares, construindo de duas em duas. Com isso, o custo seria drasticamente reduzido, com compartilhamento de equipamentos nas obras, por exemplo. Segundo Marcelo, o crescimento da indústria nuclear no Brasil passa por duas etapas: apresentação da posição do setor privado para o Congresso Nacional e aprovação popular. Segundo o executivo, para que a população apoie a atividade nuclear, é preciso informar o potencial brasileiro na exploração de urânio, a confiabilidade da matriz e a importância do desenvolvimento de uma nova cadeia de negócios, além de um novo marco regulatório para o setor.
O número de quatro usinas nucleares no PNE até 2030 é suficiente para o Brasil?
Com certeza quatro usinas é apenas um ponto de partida. O que temos visto dos desempenhos das fontes de energia faz com que o espaço da energia nuclear no país venha a ser muito maior. O que imaginamos é um número bem mais ambicioso, mas são apenas quatro usinas que constam no PNE, então, até em atenção ao que está no projeto, trabalhamos com quatro usinas.
Qual o número ideal de usinas para um futuro próximo?
Os números podem crescer bastante. Se pensarmos que alguns estudos apontam a necessidade de 20, até 2040, é tudo uma questão de se viabilizar isso. Se o Ministério de Minas e Energia diz que para 2026 estará esgotado o potencial hidrelétrico explorável, como será possível fornecer a energia elétrica necessária para o país? Estamos em um momento de crescimento, com maior demanda por energia elétrica, a população melhorando de vida, querendo consumir mais, tendo uma qualidade de vida melhor, então é necessário investir em uma fonte de energia confiável, faça sol ou chuva, ventando ou não, com tempo seco ou não. Por isso, a fonte nuclear é muito importante para o futuro do Brasil.
Para uma participação do setor privado na geração nuclear é necessária a criação de um Projeto de Emenda à Constituição?
Acredito que sim. A questão da flexibilização do monopólio tem de ser vista. O marco regulatório nuclear como um todo tem de ser revisitado. É preciso reestruturar todo o setor nuclear brasileiro, modernizar a estrutura das instituições, e definir melhor a participação do governo, abrindo espaço para o agente privado entrar como investidor no setor nuclear. Isso porque o governo, hoje em dia, não tem mais recursos para investir num projeto de longo prazo.
Qual o melhor caminho político para um aumento da energia nuclear no país?
Acho que existem várias frentes. A primeira é um trabalho institucional junto ao Congresso para mostrar nossa posição. A segunda é conseguir a aprovação da opinião pública, mostrando a importância da geração nuclear, uma fonte de energia segura, com garantia de suprimentos, suprimento de qualidade, com combustível nacional. Poucas pessoas sabem que temos a sexta maior reserva de urânio do mundo, um total equivalente a um novo pré-sal de urânio. Temos que colocar essa riqueza a serviço da sociedade.
Como pode ser encarado pela sociedade internacional um aumento na atividade nuclear brasileira?
Existe muito interesse internacional em investir no Brasil. Existem grandes investidores no mundo que estão olhando com bastante atenção para a questão energética do país, principalmente a nuclear. As empresas brasileiras, como a Eletronuclear por exemplo, recebem visitas e consultas de grandes fornecedores nucleares de vários países do mundo, como Estados Unidos, China, com desejo muito grande em investir no Brasil.
O fomento da medicina nuclear pode ser o primeiro passo para uma atividade nuclear maior no país?
Claro, a geração nuclear é apenas a ponta de um iceberg de uma indústria nuclear muito grande. Toda a questão de radioisótopos, medicina nuclear, irradiação de alimentos e curativos, fazem parte de uma grande indústria nuclear. Por isso é preciso ver a questão nuclear como um todo. É preciso de um marco regulatório de longo prazo que contemple todos esses aspectos. Existem poucos reatores no mundo de produção de radiofármacos e, com o acesso cada vez maior da população brasileira a exames de imagem, é preciso baratear essa tecnologia. Na Argentina, por exemplo, já é feita a produção de radiofármacos.
Como reduzir o custo para a instalação de novas usinas nucleares no Brasil?
O principal problema no país é esse. Tem de ser feito um investimento muito grande nos primeiros cinco ou seis anos (fase de construção) e depois o custo é muito barato. Portanto, todo o esforço é feito para minimizar esse custo de construção. Não dá mais para fazer como foi feito com Angra 1, 2 e 3, uma usina a cada dez ou vinte anos de intervalo. O que tem sido feito no mundo é um modelo de terreno que comporte até seis usinas, onde são construídas de duas em duas. Dessa maneira, é mobilizada apenas uma vez a construtora no terreno, os equipamentos são compartilhados na construção das usinas e, com isso, o custo de construção cai bastante. Para isso, é preciso um programa de longo prazo, bem estruturado.
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