ORTENG DEFENDE CRITÉRIO MAIS RIGOROSO EM CONTRATAÇÕES PARA PRESERVAÇÃO DO CONTEÚDO LOCAL

Por Daniel Fraiha (daniel@petronoticias.com.br) – 

João MartinsAs notícias de que alguns projetos brasileiros estão sendo levados para outros países vinham aumentando antes da enxurrada de denúncias envolvendo a Petrobrás, e agora a situação pode ficar ainda mais complicada, à luz do que será definido em relação ao futuro das empresas citadas nas investigações. Em um dos casos mais emblemáticos, referente à Iesa, o contrato teve diversos problemas, chegou-se a decidir que parte dos módulos seria feita na China, mas agora está tudo parado, com a rescisão do contrato. O resultado inicial são mil demissões e atrasos para a Petrobrás, o que alarma a indústria em geral. A Orteng, focada em sistemas elétricos e automação, é uma das que vem investindo em seus processos, em fortalecer as tecnológicas próprias, e demonstra preocupação com os rumos que o conteúdo local está tomando. O diretor comercial da empresa, João Martins, conta que nos últimos tempos o mercado tem apresentado menos oportunidades e uma das estratégias adotadas para lidar com isso foi a ampliação do escopo também para a área de serviços. Com isso, conquistaram alguns contratos importantes, como a manutenção de seis plataformas da Bacia de Campos, somado em R$ 350 milhões, e a recuperação de uma subestação da Reduc, de R$ 82 milhões. Ainda assim, ele tem percebido que o conteúdo local não está sendo observado como deveria em algumas situações, com muitas empresas comprando equipamentos fora do Brasil e levando atividades para outros países. “Eu vejo isso como uma situação de atenção, de alerta“, diz ele, que defende a adoção de “um critério mais rigoroso na hora da contratação, que não seja simplesmente o de contratar o de menor preço”.

Como está vendo o mercado esse ano?

Temos no mercado de óleo e gás um dos segmentos mais importantes para a nossa empresa. Tivemos o cuidado, nesses últimos dois anos, de formar uma carteira que pudesse nos dar uma segurança por um período mais longo e tivemos sucesso com isso, já que conseguimos alavancar alguns contratos de muita importância.

Pode citá-los?

Temos hoje em carteira quatro módulos para a P-66 e a P-69, sendo dois elétricos e dois de laboratório. Eles vão ser entregues até o início de 2015, entre janeiro e fevereiro, e estão sendo construídos em Angra, dentro de uma área segregada do Brasfels. É um contrato dominado, porque já fizemos outros módulos no passado, para a P-37, a P-43, e a P-48. Fomos a primeira empresa brasileira a construir módulos elétricos no Brasil, na década de 90. É um contrato importante, que está no pico de construção, e já conta com todos os equipamentos elétricos fornecidos e sendo montados.

Tem outros contratos de módulos?

Também ganhamos do EBR o módulo e-house, M-17, da P-74. Esse módulo tem uma característica diferente, porque o outro é dos Replicantes. O da P-74 é para a Cessão Onerosa, que é um casco convertido, então muitos dos equipamentos elétricos vão dentro do módulo. Ele é maior, em um contrato maior, com conteúdo local restrito ao sistema elétrico e ao sistema de automação. Estamos fornecendo todo o sistema de automação do topside para a P-74. Tivemos muita dificuldade em encontrar local e parceiro para construir este módulo no Brasil, então levamos para a Indonésia. Estamos fazendo em Batam.

E isso não vai afetar os índices mínimos de conteúdo local?

Não. Porque o sistema elétrico exige 60% de conteúdo local, assim como a automação, e esse percentual está sendo atingido. O resto que sobrou do módulo é chapa, aço e fechamento. Essas partes que estão sendo feitas lá. A parte tecnológica fazemos aqui.

Mas, voltando aos contratos…

Também tivemos sucesso em vender para o Estaleiro Enseada o sistema de automação e elétrico dos cascos das unidades P-74, P-75, P-76 e P-77. O da P-74 está no Rio, e os outros estão no estaleiro, na China.

Vocês começaram a fazer para todos?

Já estamos fornecendo. Só falta fornecer o da P-77. Deve acontecer em novembro de 2015. Também tem 60% de conteúdo local dos equipamentos elétricos e no sistema de automação.

Pode falar em valores desses contratos?

Os módulos giram na casa dos US$ 30 milhões cada um. No caso dos que incluem o sistema de automação, agregam um valor um pouco maior, mas é um número estratégico, então não podemos falar. Além disso, só para complementar, também abrimos nossa atividade para a área de serviços.

Pode citar contratos nessa área?

Conquistamos o contrato de manutenção de seis plataformas da Bacia de Campos. Esse contrato é um em que a gente montou um centro de produção de peças de tubulação e estrutura metálica, e está operando plenamente, alcançando 350 pessoas. É um contrato de R$ 350 milhões, por quatro anos, renovável por mais quatro. Foi um contrato muito importante, porque nos dá uma longevidade de negócios para o ano que vem, quando achamos que será ainda mais difícil para o mercado. Outro contrato importante é o da Reduc, naquela subestação que pegou fogo. Ela estava trabalhando em regime de sistema provisório. Estamos fazendo a recuperação definitiva da subestação.

Qual o valor do contrato?

De R$ 82 milhões, com duração de dois anos. Vai terminar no fim de 2015. Também estamos fazendo a manutenção dos cavalos de pau, em Natal, da parte elétrica dos sistemas de produção de cavalo de pau, tanto da Bacia do Alto do Rodrigues, quanto da bacia de Mossoró.

A área de serviços é um novo foco?

Esses contratos de serviços nos trazem um volume importante, considerável, porque têm longevidade, e nos dão uma segurança para ultrapassar 2014 e 2015. Além disso, concluímos esse ano o fornecimento de 29 subestações de distribuição dentro da Rnest. Foi a primeira vez que a Petrobrás juntou em um único contrato todas as subestações do processo. Então será a primeira refinaria da Petrobrás que terá um único fornecedor elétrico.

Vocês também farão a manutenção?

Isso ainda não está definido. Então são 29 subestações e a automação delas. Lá, a importância não é por um desafio tecnológico, mas pela escala. Pelo tamanho do projeto. Foi o maior projeto elétrico que a Petrobrás já comprou de uma única empresa: R$ 330 milhões em equipamentos elétricos. Termina com a partida da refinaria.

Também estamos em processo de conclusão do fornecimento de toda a baixa tensão para o Comperj. Lá foi diferente. Ao invés de colocar um só pacote elétrico, ela dividiu por nível de tensão. Neste caso, já assinamos um contrato de manutenção, com validade de quatro anos, que foi assinado em agosto. Ele gira em torno de R$ 10 milhões.

Quanto a área de óleo e gás representa para vocês?

Incorporando serviços, entre 65% e 70% dos nossos negócios neste momento. É significativo, porque fizemos esse “seguro” de negócio, já que todas as outras áreas em que atuamos – mineração, siderurgia, concessionárias de energia elétrica – tiveram uma parada muito grande nas suas atividades econômicas.

Tem se falado muito sobre o momento parado também em óleo e gás…

Sem dúvida. E nós estamos sentindo. Já tínhamos visualizado isso no ano passado. Se nós, como uma empresa de sistema elétrico e de automação, ficássemos pensando só no nosso nicho, não teríamos pedidos hoje para suportar o ano de 2015. Foi por isso que entramos na área de serviços. Hoje somos um time de mais de 250 engenheiros, então podemos atacar áreas novas, como essa, porque temos a tecnologia, mas não seria nosso alvo se o mercado de fornecimento de sistemas e equipamentos não tivesse dado essa trava.

Como avalia esse momento?

Nunca vivemos no Brasil uma conjuntura tão difícil, em que o mercado de uma forma geral está ruim e a Petrobrás está patinando. Isso nos aflige. No pior momento da crise, em 2008, se olharmos a história da Petrobrás no passado, ela sempre produziu um volume mínimo de encomendas para a indústria de bens de capital, que nos sustentava e permitia à indústria brasileira suportar os momentos difíceis. Mas hoje temos uma crise na indústria de forma geral, e, além disso, temos uma crise na Petrobrás. Então essa conjunção é muito danosa para a indústria nacional.

E como está vendo as questões envolvendo o conteúdo local?

Nós temos claramente defendido ele, por vários aspectos. Esse conteúdo nacional, que tem uma legislação própria, formas de ser avaliado, não está sendo observado. As empresas não estão cumprindo e estão comprando muitos equipamentos fora do país. Ou estão levando atividades que deveriam ser feitas no Brasil para fora.

O que você acha que vai acontecer, sabendo-se das multas previstas nesses casos?

Quando a Petrobrás coloca um pedido com um construtor, e ele não performa, com o contrato sendo postergado ou devolvido, ela fica com uma pressão de prazo que a deixa tendente a aceitar qualquer solução. É só pegar a situação que aconteceu com a Iesa em Charqueadas. Ela não estava performando, tinha problemas financeiros graves, e começou-se a buscar uma empresa para assumir o contrato, podendo inclusive parte dos trabalhos serem levados para fora do País. Isso é terrível. Um contrato que era para ser feito no Brasil, com conteúdo local, ser feito fora do Brasil. Só para citar esse que é conhecido.

Como vê isso?

Eu vejo isso como uma situação de atenção, de alerta. Por que isso está acontecendo? Por que achamos que isso pode acontecer e ninguém reclama? Por que a Petrobrás tem que aceitar essa situação?

Por quê?

Ela se comprometeu com metas que hoje precisa garantir.  Vai precisar conciliar um novo prazo que atenda às metas de produção a que está comprometida, mesmo que para isso tenha que aceitar soluções como àquelas comentadas acima. Mas ela tinha que ter avaliado antes, desde o momento em que ela contratou, tinha que avaliar se aquele construtor ia conseguir performar ou não. Talvez não devesse ter comprado pelo menor preço. O maior preço nós vamos pagar agora.

Qual você acha que é a solução?

É ter um critério mais rigoroso na hora da contratação, que não seja simplesmente o de contratar o de menor preço. Às vezes ele não é a melhor solução, e pode sair mais caro. Nós somos uma empresa nacional, 100% nacional. Todos os sócios são brasileiros. Fomos buscar nossas experiências lá fora, conquistamos tecnologia, somos hoje uma empresa que tem produtos que se igualam a qualquer um dos nossos concorrentes multinacionais, e, no entanto, estamos sofrendo uma concorrência que não é correta. Porque muitas dessas empresas vão lá para fora e compram os serviços e equipamentos lá mesmo, em detrimento do que foi pensado e planejado para gerar empregos no Brasil. Isso é muito ruim.

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